sábado, maio 14, 2011

TELEPATIA

Literatura é telepatia com todo um passado.
As obras são variantes de todas as obras anteriores.
Não é o indivíduo quem faz literatura, é a Humanidade.
A etimologia é o modelo de uma verdadeira ciência da literatura.
E o plágio, o mais importante dos recursos literários.

Os bem vizinhos de Naziazeno assistem ao ‘pega’ com o leiteiro.

Encontraria a Maga? Tudo no mundo começou com um sim. Encontraria a Maga? Milkau cavalgava molemente o cansado cavalo que alugara para ir do Queimado à cidade do Porto do Cachoeiro, no Espírito Santo. Encontraria a Maga? Não sinto o meu corpo. Encontraria a Maga? Uma noite dessas, vindo da cidade para o Engenho Novo, encontrei no trem da Central um rapaz aqui do bairro, que eu conheço de vista e de chapéu. Encontraria a Maga? – Nonada. Encontraria a Maga? – Aquela criatura – dizia-me sóror Teresa com o olhar nublado de uma piedosa desconsolação – aquela criatura me parece bem extraordinária. Encontraria a Maga? Antes de iniciar este livro, imaginei construí-lo pela divisão do trabalho. Encontraria a Maga? O porteiro do edifício Deauville ouviu o ruído dos passos furtivos descendo as escadas. Encontraria a Maga? Resolvi comprar papel e tinta, tenho muito que escrever. Encontraria a Maga? Eu sobrevoava com meu helicóptero os caminhões despejando areia no limite do imenso mar de gelatina verde. Encontraria a Maga? ergo sum, aliás, Ego sum Renatus Cartesius, cá perdido, aqui presente, neste labirinto de enganos deleitáveis, – vejo o mar, vejo a baía e vejo as naus. Encontraria a Maga? No fundo do mato virgem nasceu Macunaíma, herói de nossa gente. Encontraria a Maga? Como de hábito, Policarpo Quaresma, mais conhecido por Major Quaresma, bateu em casa às quatro e quinze da tarde. Encontraria a Maga? Algum tempo hesitei se devia abrir estas memórias pelo princípio ou pelo fim, isto é, se poria em primeiro lugar o meu nascimento ou a minha morte.

– Espere até eu acabar este cigarro. – Não tive filhos, não transmiti a nenhuma criatura o legado da nossa miséria. – Espere até eu acabar este cigarro. Esperemos mais, pensou ela; e seguiu serenamente ao encontro de Ricardo Coração dos Outros. – Espere até eu acabar este cigarro. Tem mais não. – Espere até eu acabar este cigarro. Bêbado, quem me comprenderá? – Espere até eu acabar este cigarro. E a cidade se aproximava veloz e eu via os vidros dos edifícios. – Espere até eu acabar este cigarro. ... – Espere até eu acabar este cigarro. Ventos de sul a leste, moderados. – Espere até eu acabar este cigarro. E eu vou ficar aqui, às escuras, até não sei que hora, até que, morto de fadiga, encoste a cabeça à mesa e descanse uns minutos. – Espere até eu acabar este cigarro. Pelo meu espírito passaram tantos incidentes e tantas reminiscências da minha vida, ligados àquelas duas criaturas, que hoje repousam ali no sagrado silêncio da velha necrópole. – Espere até eu acabar este cigarro. Travessia. – Espere até eu acabar este cigarro. Vamos à História dos Subúrbios. – Espere até eu acabar este cigarro. Não sei como vamos todos caber no exíguo quarto da pensão. – Espere até eu acabar este cigarro. Eu te suplico, a ti e à tua ainda inumerável geração, abandonemos os nossos ódios destruidores, reconciliemo-nos antes de chegar ao instante da Morte... – Espere até eu acabar este cigarro. Sim. – Espere até eu acabar este cigarro.

E ele dorme.
*

2 comentários:

Anônimo disse...

porrrrra! adorei!

r.m.

Anônimo disse...

é a esculhambação sofisticada do estilo. mto bom. chega de originalidade, estou farta do terrorismo comedido.

n.