quarta-feira, dezembro 03, 2008

Dia 33

Hoje é o dia 33 de nenhuma postagem por aqui -
assim, relaxe,
capriche,
despache
e se espiche:

hoje eu quis postar tudo aquilo que despercebi -
quis fazer uma cançãozinha
que fluísse lírica por uma só linha,
mas vazaram essas duas estrofes irregulares -
portanto, sem mais, desovo a velha rima final
antes que o impulso de postar vá pelos ares.

sexta-feira, outubro 31, 2008

Outubro acabando

Não são só todas as festas de ontem
que você já perdeu e fim de conversa,
não é só a sua inteligência
virando indigência,
nem apenas o amor que você quer
e precisa sentir e não sente,
ou o advérbio dementemente
que ocorreu agora, por inadvertência -
não é só a sua falta de comando
de qualquer rima chegando em bando:
além disso tudo
é o mês de outubro
que sem escrúpulo está acabando.

sábado, outubro 25, 2008

Surto crítico, de novo...

Vencendo a preguiça, vou ensaiar rapidamente uma retomada do surto crítico anterior:

o blog de bocágil foi retirado (ou retirou-se) da blogosfera - por mais que eu também não concorde com censuras (vide o protesto feito pelo Thadeu), havia naquele blog, além de ofensas pessoais de péssimo gosto, um grande abuso:

o uso de poemas alheios, na falta de réplicas aos seus golpes baixos -

gostaria de assinalar aqui que este "bocágil" chegou aqui com seu primeiro ataque (um soneto em estilo "olha só, mamãe, eu sei fazer soneto") chamando os leitores dos meus poemas de "leitões", e logo após baixou um pouco o tom raivoso, provavelmente porque o elogiei na primeira resposta de bate-pronto que escrevi -

assim, podemos calcular que o que o vate "bocágil" precisava era apenas de elogios ao seu ego inseguro de poeta neófito -

portanto, deixo aqui para bocágil o famoso "elogio do vate", que já recebi, e que faz bem a todos os vates iniciantes:

bocágil, vá te f****!

sexta-feira, outubro 17, 2008

Agia na minha alma algum antídoto

Enquanto eu prosseguia quase cego
rolando rimas sempre verso acima,
agia na minha alma algum antídoto
ao metro martelado, decassílabo,
e, sim, uma canção mais livre se formava,
correndo quente,
mais quente que o magma,
numa gama assim mais difusa de cores,
com o ânimo espontâneo
que os amigos às vezes trazem -
e nesse encantamento de verdade
seguindo um ritmo simples e sincero
ficou cifrado aqui um registro daquela
que me inspirava e continua a me inspirar:

agia na minha alma alguém
roland amor a me levar além...

domingo, outubro 12, 2008

Surtado em fase crítica

Não se assustem: um título melhor pra esta postagem seria "breve surto da minha visão de crítico" -

o advento de um pseudônimo (bocágil) na blogosfera provocou situações que até têm interesse e certa graça, mas vejo que foi atravessada uma fronteira para o lamentável -

a(s) criatura(s), quem quer que sejam - enfim, quem manipula este blog do pseudônimo está promovendo ataques gratuitos a poetas do cenário cultural curitibano - e o que foi feito à Luci Colin ultrapassou de longe os limites aceitáveis, transpirando covardia e péssimos sentimentos...

É difícil mesmo atingir uma visão equilibrada sobre as artes produzidas em Curitiba e no Paraná, já que são mais frequentes as visões de extremos: e normalmente o senso que prevalece, pelo menos na superfície, é o de que tudo aqui é uma porcaria -

pra mim, de positivo a respeito desse "advento do bocágil" (que na confusão tem gente que chega a atribuir a mim e [ou] ao Thadeu) foi a reação do Rodrigo Madeira (poeta que conheci e com quem conversei brevemente já faz uns dois anos) -

ele postou um soneto que não devia passar despercebido (está lá no fim dos comentários da postagem do ovo de colombo) - e o que o Madeira quer dizer ali também já me passou pela cabeça:

por que um "poeta" (bocágil) volta-se contra seus próprios pares, em vez de usar sua boca satírica pra versar sobre problemas de verdade?

Agradeço ao Rodrigo também pelo comentário da postagem anterior -
nesta, um poema longo e ingênuo, arrematei com um apelo de trégua ao "poeta bocágil", para que passasse a escrever "sublimes canções líricas" -

a resposta a isso lá no pseudoblog (estou linkando de novo, mas com certo desagrado e nojo, aquele ambiente agora me provoca repugnância) acabou sendo o já mencionado ataque a uma excelente escritora curitibana - um golpe baixo, que não mereceria muito mais que desprezo.

Pra mim, é importante ainda destacar:

o ataque ao Thadeu, na verdade, foi respondido por outro(s) poeta(s) anônimo(s), enquanto o próprio continua "tirando ouro do nariz" lá no blog dele -

que na "segunda grande resposta", além de mostrar que não sabe soletrar o nome do Leminski, o "bocágil" considera careta uma geração de poetas que tem grande valor, na qual se destaca o Marcos Prado, gênio sim (quem duvida, que leia Ultralyrics, e também O Livro de poemas de Marcos Prado) -

que, apesar de me sentir meio culpado nessa história (o "cara" veio me atacar aqui e acabou criando o seu "polêmico" [blérgt...] blog graças à atenção e às respostas com que brindei seus versinhos sujismundos), pelo menos considero que há uma agitação sobre a poesia paranaense agora, e (continuo um pouco ingênuo sim) isso pode ter boas consequências, como é o caso da interferência do Rodrigo Madeira - se bem que não considero suficiente o arremate do seu soneto: ficou meio pessimista, e achei de gosto suspeito a comparação de poetas com chacretes...

Deixo ainda um alô ao Cláudio Bettega, que fez sua saudação aqui também, e ao Alexandre França (que deve ter sido o autor do comentário mandando "Abrax") -

E, finalmente, depois deste surto crítico, registro que continuo devendo "sublimes canções líricas" à "misteriosa" G., a qual acabou também me aplicando uma satirazinha "animadora", e merece mesmo poemas que realmente valham a pena (e o teclado também...)...


Post Digitatum: "bocágil" postou agora um ataque ao Gustavot (de quem já ouvi falar, tendo visto no Wonka um trecho duma sua peça de teatro, que considerei um trabalho poético muito bem feito) -

até onde pude perceber, os autores do blog-bocágil, Bearzotti e Gustavot, executaram um desvio de atenção, perpetrando um auto-ataque - revisaram o poema que Gustavot postou em comentário assinado, e a sátira está mais engraçada e menos virulenta porque conhecem profundamente (e interiormente) o poeta que golpeiam agora...

Por sinal, Bearzotti achou de me telefonar alguns dias atrás, e em seu tom de voz melífluo declarou que não era "bocágil" - imagino que ele tenha algum temor de levar uma surra do Thadeu ("bocágil" foi ameaçado fisicamente pelo pseudônimo "boca do purgatório", o que resultou num soneto em tom de "ui, não me bata, por favor") ...

Enfim, descontados a gratuidade e o baixo nível de alguns ataques, até que essa história está rendendo algumas coisas interessantes...

segunda-feira, setembro 29, 2008

Depois duma viagem a Londrina...

Depois duma viagem a Londrina
(fui pro Londrix, festar literatura),
me animo a fazer uso da terzina –

talvez eu ilumine a mina escura
na qual chafurda um “vate” possuído
pela nhaca macaca da chatura.

Tal “vate” se acha o máximo: embebido
nos mucos e melecas do seu ego,
surgiu regurgitando por aqui. Do

pico da sua empáfia expressou: “pego
as fezes que tu fazes, Ivan Justen,
e faço delas peças do meu lego”.

Por mais que tais peçonhas não se ajustem
ao ovo de colombo (um simples tema:
não foi composto a fim de que se assustem),

o “vate” despertou ao som de: “gema”.
E então começa um desafio de verve:
eu, questionando as rimas, o problema

do gol de mão, o ritmo que não serve
no metro de arranjos mal ajambrados,
enquanto o sangue corre, queima, ferve;

e o “vate”, inflando, aprimora os brados,
afia as garras nos meus gumes, sobe
a aposta, cria um blogue. Desdobrados

os comentários, outras vozes sobre
as obras tentam provocar mais briga.
O “vate” atinge um tom que se quer “nobre”,

mostrando até que ponto ele se obriga
em sua “primeira grande resposta” –
pra mim, o desgraçado duma figa

tinha feito assim uma grande bosta.
Com três haicais soltei-lhe um peteleco,
e, em sacrifício, pus minha alma exposta –

fantasma irônico, rimando em eco:
achei sinistro o alerta de soberba,
talvez porque eu também sinta que peco...

A coisa ficou toda mais acerba,
perdi minha paciência com uns danos
a versos pro Batista: pô, que merda!

– são versos que já têm mais de dez anos...
Agora o “vate” investe em dois pseudônimos,
mira Thadeu e Béco: cai de enganos –

fascina-se por elogios anônimos?
Fácil, bem fácil: quer fazer “faxina
em Curitiba” o tonto com os encômios!

Porém, na fúria fútil e assassina
mancha a cidade em vez de celebrá-la,
sucumbe a um sádico prazer, e mina

as próprias fontes, paladino mala!
Vieste aqui celebrar meu enterro,
mas minha voz, mesmo em surto, não cala:

Bocágil, tu és o tolo, teu é o erro:
acuso os golpes – mas naquela terza rima
(à qual reconheceram: obra-prima)

a certa altura a tua voz ficou serena -
e a minha, agora, já largando a forma fixa,
pela emoção que sempre triunfa nas arenas,

propõe-te a trégua das sublimes canções líricas...

segunda-feira, setembro 15, 2008

Outro ovo de colombo

Sim, entenda quando zombo
compondo outro ovo de colombo:

não quebre a casca que o mascara,
lendo como se fosse um poema -

diga que a rima está na clara
e gema.

segunda-feira, setembro 01, 2008

Diálogo archaico após ler Silveira Neto

- Poeta de nossa grei:
dai uma rima às minhas lágrimas!
- Outrossim, dar-ta-ei,
uma vez que tu consagre-mas...

quarta-feira, agosto 27, 2008

Urgência

urgência de sentir
o que uma pessoa
propriamente
sente

urgência de agir
sem se jogar à toa
e ser um pouco mais
inteligente

consequentemente
ser pelo menos
um protótipo de gente

uma idéia ancestral de gente:

Ur-gente

sexta-feira, agosto 01, 2008

O poeta morto dentro do meu intrincado crânio...

O poeta morto dentro do meu intrincado crânio
sabe que a linguagem presta pra isso mesmo:
fingir de morto assim feito um cachorro,
ensaiar sinceridade que no fim é só disfarce,
querer falar de tudo e mal extrair
de si um versinho simples.

O poeta morto dentro do meu intrincado crânio
queria versos bons mas se saiu com estes
(podia ter desempenhado melhor, talvez uma quadrinha,
algo do tipo:
"Aqui dentro do meu intrincado crânio
tem um poeta morto que soluça
e age como se beneficiasse urânio
amortizando alguma crise russa.")

O poeta morto dentro do meu intrincado crânio
tenta manter seu blog atualizado
(mas só posterga, esquece, nem dá bola),
não tem passado muito bem disposto,
e solta um uivo quase fraco e mal composto
só porque hoje começou o mês de agosto.

quarta-feira, julho 16, 2008

Amor Plathônico

Aí vai a tradução dum soneto de juvenília da idololizada Sylvia Plath, em homenagem às mulheres - parece que ela conhecia o próprio gênero...

Sonnet : To Eva
Soneto : Para Eva

All right, let's say you could take a skull and break it
The way you'd crack a clock; you'd crush the bone
Between steel palms of inclination, take it,
Observing the wreck of metal and rare stone.
Tá: digamos que desse pra quebrar um crânio
Como se racha um relógio; triturando o osso
Entre palmas de aço inclinadas, pegando-o,
Veríamos metais e jóias em destroço.
This was a woman : her loves and stratagems
Betrayed in mute geometry of broken
Cogs and disks, inane mechanic whims,
And idle coils of jargon yet unspoken.
Isso era uma mulher: paixões e estratagemas
Traídos em muda geometria de discos
E engrenagens, fúteis mecânicas venetas,
Molas de palavrórios ainda não ditos.
Not man nor demigod could put together
The scraps of rusted reverie, the wheels
Of notched tin platitudes concerning weather,
Perfume, politics, and fixed ideals.
Nem homem nem um semideus remontariam
As sobras de sonho oxidado, os maquinismos
De platitudes entalhadas sobre clima,
Perfume, política, sobre ideais fixos.
__The idiot bird leaps up and drunken leans
__To chirp the hour in lunatic thirteens.
__O pássaro idiota pula e bêbado ergue-se
__Pra trinar o horário em lunáticos trezes.

Sylvia Plath
Ivan Justen Santana

quinta-feira, julho 10, 2008

Um erudito?

Bem, aproveitando o gancho do comentário do meu mui prezado amigo William sobre eu ser "sempre preciso na erudição", vou escrever uns dois dedos de prosa aqui (fazia um tempinho que eu não fazia isso) - só pra partilhar dois dos milhares de momentos em que meu mundo caiu:

um foi quando descobri que "em meados do século X" significava "na metade do século X" - não me perguntem por que, mas eu costumava entender que "meados" significava "no início"...

E quando aprendi que o nome do Fellini era "Federico", e não "Frederico"?
Foi um baque abissal. Tive que descobrir também que o Garcia Lorca é outro "Federico", o que é realmente estarrecedor...

São lições de humildade, que também fazem a gente pensar: além da letra "r" nesses nomes, o que mais a gente sempre acreditou que existia e no fim era apenas ilusão?

sexta-feira, julho 04, 2008

Parco poema pinçado praticamente pronto d´O Tempo Redescoberto, de Proust

__o tempo
torna espaçados
__os encontros
e vagas
__as relações

as reminiscências
__raras
fazem imprecisas
__as noções

__há romances
que nos brindam
__com uns versos
que pensamos
__quase bons

pois assim lidas
__em voz alta
às vezes
__as palavras
se descolam
__dos seus sons

terça-feira, junho 24, 2008

Três trastes sinistros

Na falta de palavras, uma imagem de um humorista, um poeta e um jovem inútil, todos extremamente sinistros, ali pelos idos do milênio passado...

segunda-feira, junho 16, 2008

Impromptu pra mais um Bloomsday

Pra achar essas rimas fui ao fun-
do da sintaxe que, Tróia, destrói-se:
mais um dia de Stephen, Molly e Bloom,
palestrando sobre o Ulysses, de Joyce...

sexta-feira, junho 13, 2008

Improviso súbito pra hoje

Qual bom pagão que mal se preze
Me vejo numa dessas vezes:
Me faltam deuses a quem reze
Pra atravessar as sextas 13...

sexta-feira, junho 06, 2008

Vilancete em velho estilo

Vim rimar feito quem não tem escolha –
Porém tentando expressar algo vivo,
Mesmo naquele velho estilo bolha.

Palavras já se espalham pela folha –
Fugi do computador pra este arquivo:
Vim rimar feito quem não tem escolha.

Não tenho mais em mim quem me recolha
Do rosto que no espelho espia esquivo
Também naquele velho estilo bolha.

O leitor que ainda sou sequer me olha –
Sem crítica o que escrevo sai sem crivo:
Vim rimar feito quem não tem escolha.

Quem dera, como ao saque duma rolha,
Eu libertasse um vinho criativo
Sem me valer dessa forma zarolha,

E jorrasse de versos todo um livro,
Nutrindo os corações. Mas já não sirvo:
Vim rimar feito quem não tem escolha,
Sempre naquele velho estilo bolha.

terça-feira, junho 03, 2008

Contornando

Acho ótimo quando blogueiros e blogueiras camaradas vêm aqui responder comentários meus por aí: a coisa fica bem confusa, combina com meu atual estado de quebradeira.

No entanto, não gostei que a Nara apagou a postagem do seu pô Ema flaubertiano -

também não entendi o porquê da menção do Giuliano ao Piva, sendo que eu fiquei desolado só pelo emoticon de cara triste (que interpretei como insatisfação quanto à postagem anterior).

Outrossim, eu acho interessante o trabalho do Fausto Fawcett (bem como as loiras que costumam estar ao redor...) -

Fui ver a peça do França no Hotel Del Rey: gostei do desempenho das duas atrizes, que não são mãe e filha por acaso. O texto também é bem engraçado.

Estou com dois poemas quase prontos no subconsciente, mas ainda não escrevi nada, porque não quero forçar a mão (mas deve ser preguiça mesmo, enfim).

Ah, e antes que me esqueça de novo, estou devendo muitas saudações e muitos obrigados ao Renato Quege, que anda replicando alguns versinhos e traduções de minha modesta fatura, além de ter incorporado ao repertório de sua atual banda uma composição que fizemos ali pelos idos de 1912... Fucem por aqui .

E pra Nara eu vou colar uma explicação, aproveitando pra puxar sua orelha: a expressão é "pior a emenda que o soneto":

"A expressão "pior a emenda que o soneto" surgiu por causa do poeta português Manuel Maria Barbosa du Bocage. Ele era tão respeitado que, um belo dia, uma pessoa interessada em ser escritor procurou-o com um soneto. Pediu ao poeta que o lesse com carinho e anotasse os erros. Bocage concordou. No dia seguinte, encontraram-se para conversar. Para surpresa do poeta aprendiz, Bocage não havia anotado nada. Tinha achado o texto tão ruim que nem valia a pena corrigir, porque a emenda seria pior do que o soneto. Se o conselho fez com que o escritor desistisse da carreira, a história não registra. Mas a frase se tornou uma espécie de ditado popular. Se alguma coisa que fazemos não sai exatamente como deveria, nem sempre dar um jeitinho resolve. A emenda pode sair pior do que o soneto."

quinta-feira, maio 29, 2008

Incontornável

Passando mais uma semana sem postagem (está difícil colar os caquinhos), sou forçado a me valer dum poema do Leminski, que fazia tempo que eu não mencionava. Eu di uma busca (sim, eu "di uma busca", porque "quilo", tolerem...), eu di uma busca e não achei esse poema zanzando pela rede...

Leiam e repitam 37 vezes, como um mantra...


vento
que é vento
fica

parede
parede
passa

meu ritmo
bate no vento
e se
___des
_____pe
_______da
________ça


p.leminski

quarta-feira, maio 21, 2008

Os pedaços de verso que ainda me caem da cabeça

Tal qual todo horror e medo ela não demonstrasse -
Feito se o prazer e a dor ela descompusesse -
Tipo assim um rito e mito que ela só vestisse -
Como por um bem do qual só ela fosse a posse -

Essa face fez-se doce e disse: "fique susse..."

***

Tal qual um tolo que não mais se controlasse -
Feito em versinhos que ninguém mais entendesse -
Tipo assim mesmo sem poder que redimisse -
Como no tom errado que o surto lhe trouxe -

Você não tinha aqui no fim a rima em "-usse".

terça-feira, maio 13, 2008

Para aquela a quem nunca escrevi

Àquela que rolou sobre meu parco limite de poeta,
Que nunca revelou qualquer vontade sua, secreta,
De ser musa daquele que mal sobrou por aqui –

A quem meus pedaços são obras completas,
A ela, que ainda vê gume nessas cegas setas,
Vai o lapso do melhor verso que jamais escrevi.

sexta-feira, maio 02, 2008

De volta a uma obsessão

Semana retrasada foi lançada a revista Cadernos de Literatura em Tradução 8, contendo entre outros textos uma tradução que fiz do conto All the Dead Dears, da Sylvia Plath. No período em que mexia nesse conto, descobri que ela também escreveu, em 1956, um poema com o mesmo título.

Numa noite dessas perpetrei a tradução do poema, que segue aqui abaixo, dedicada à Marina Della Valle. Eu sei que não adianta advertir, mas é um texto muito sinistro: se você é uma pessoa impressionável, evite ler...


All the Dead Dears
Todos os Mortos Queridos

In the Archæological Museum in Cambridge is a stone coffin of the fourth century A.D. containing the skeletons of a woman, a mouse and a shrew. The ankle-bone of the woman has been slightly gnawed.
No Museu Arqueológico em Cambridge há um caixão de pedra do século IV dC, contendo os esqueletos de uma mulher, um camundongo e um mussaranho. O osso do tornozelo da mulher foi levemente roído.

Rigged poker-stiff on her back
With a granite grin
This antique museum-cased lady
Lies, companioned by the gimcrack
Relics of a mouse and a shrew
That battened for a day on her ankle-bone.
Ornamentado atiçador nas suas costas
Com um esgar granítico
Esta arcaica dama museu-encaixotada
Jaz, em companhia dos restos
Sem valor de um rato e um mussaranho
Que por um dia se refestelaram com sua tíbia.
These three, unmasked now, bear
Dry witness
To the gross eating game
We'd wink at if we didn't hear
Stars grinding, crumb by crumb,
Our own grist down to its bony face.
Estes três, já desmascarados, prestam
Seco testemunho
Do grosseiro jogo de comer
Que nem veríamos se não ouvíssemos
Estrelas triturando, migalha por migalha,
Nosso próprio grão até sua face óssea.
How they grip us through thin and thick,
These barnacle dead!
This lady here's no kin
Of mine, yet kin she is: she'll suck
Blood and whistle my marrow clean
To prove it. As I think now of her hand,
Com que esforço eles se agarram a nós,
Estes mortos encalacrados!
Esta dama aqui não é parenta
Minha, mas parenta ela é: vai sugar
Sangue e limpar minha medula até os fiapos
Pra prová-lo. Quando penso agora na mão dela,
From the mercury-backed glass
Mother, grandmother, greatgrandmother
Reach hag hands to haul me in,
And an image looms under the fishpond surface
Where the daft father went down
With orange duck-feet winnowing his hair ---
Da ampulheta banhada de mercúrio
Mãe, avó, tataravó
Estendem mãos megeras pra me arrastar,
E uma imagem surge sob a superfície do lago
Onde o pai apatetado afundou
Com pés-de-pato laranjas joeirando seu cabelo –
All the long gone darlings: They
Get back, though, soon,
Soon: be it by wakes, weddings,
Childbirths or a family barbecue:
Any touch, taste, tang's
Fit for those outlaws to ride home on,
Todas as queridas há muito idas: Elas
Voltam, entretanto, logo,
Logo: seja por velórios, casamentos,
Partos ou um churrasco de família:
Qualquer toque, gosto, olfato
Servem ao retorno destas proscritas ao lar,
And to sanctuary: usurping the armchair
Between tick
And tack of the clock, until we go,
Each skulled-and-crossboned Gulliver
Riddled with ghosts, to lie
Deadlocked with them, taking roots as cradles rock.
E ao santuário: usurpando a poltrona
Entre o tique
E o taque do relógio, até partirmos,
Cada Gulliver de crânio e ossos cruzados
Crivado de fantasmas, jazer com elas
Amortecidos, nos enraizando enquanto berços rangem.

Sylvia Plath
Versão brasileira: Ivan Justen Santana

quarta-feira, abril 23, 2008

A quem interessar possa a numerologia...

Hoje é aniversário de William Shakespeare.

Aniversário de nascimento e morte.

Curioso, não?

Mais curioso ainda é a idade que ele completa, a qual (pelo menos pra mim) exerce um fascínio meio idiota, uma estupidez que talvez entenda quem já ficou de madrugada assistindo ao relógio digital transmitido pelas emissoras de TV junto com as faixas coloridas...

O momento em que os dígitos ficam todos iguais vira um acontecimento a ser comemorado, no mínimo com um esgar de sorriso e um pouco de baba escorrendo no canto da boca...

Pra não largar mão da minha tradição de poetastro, cometi a seguinte quadra de celebração:


Falar da idade do bardo é meio abstrato,
Mas por acaso alguém viu, neste mundo ingrato,
Que o velho Will, cuja obra eu também idolatro,
Faz hoje quatrocentos e quarenta e quatro?


De brinde extra, publico a seguir o que talvez sejam os únicos versos de Shakespeare ainda não traduzidos trocentas milhões de vezes em português – curiosamente, são os versos do seu epitáfio – será que foi ele mesmo o autor? – em qualquer caso, diz a lenda que estão inscritos na sua lápide – e deviam ter servido pra eu não me meter a besta de mexer com a figurinha mais carimbada da literatura universal...


Good friend, for Jesus´ sake forbear
To dig the dust enclosed here;
Blessed be the man that spares these stones
And cursed be he that moves my bones!

Bom amigo, pelo amor de Jesus não tente
Escavar a poeira que aqui jaz presente;
Bendito aquele que poupar estes destroços,
E maldito seja quem mexer nos meus ossos!

domingo, abril 20, 2008

Mais uma colagem...

Você traiu seus próprios sentimentos,
Brincou de vida feito nem ligasse,
Se fez de bobo e disse em versos lentos

Não conhecer nem mais a própria face.
Você prossegue com seu ego enorme
Como se a indulgência comprovasse

Que mesmo quando a consciência dorme
Uma terzina usada ainda a redime.
Você acredita que nesse uniforme

Sua poesia esconde qualquer crime,
Podendo mesmo se fazer verdade
E revelar a imagem mais sublime.

Porém a própria artificialidade
Que com desplante você leva adiante,
Não importando o quanto e a quem agrade,

Só se revela mesmo redundante.
Você devia era criar vergonha,
Em vez de se arvorar aos pés de Dante,

Substituindo essa ilusão bisonha
Por humildade em doses cavalares.
E se de fato você ainda sonha

Em superar contudos e apesares,
Vai ter que detonar seu egoísmo,
Purgando esses infernos pelos ares,

Vai ter que reencontrar o seu lirismo,
Ter mais pureza, não fazer mais cenas,
Atravessar abismo após abismo,

E, pelo jeito, as chances são pequenas.

segunda-feira, abril 14, 2008

Menipeando a sonetagem...

Soneto é um tipo de vírus que a gente contrai e não é fácil largar mão - quando você se flagra, já começou a calcular as rimas e a escandir o verso em decassílabos.
Nos idos do milênio passado, quando comecei a descobrir a poesia, abominava a técnica parnasiana, e, apesar de nunca ter deixado de idolatrar as sonetagens simbolistas, se me dissessem que dali a uns vinte anos eu estaria perpetrando algo remotamente semelhante a um soneto, seria pior que a última das ilusões perdidas.
Este intróito em prosa não redime nada, mas serve pra me autojustificar, porque vou postar aqui mais um soneto, e ver se na seqüência me livro da infecção - quem sabe um poema visual seja o antídoto, mas ficou difícil desencalacrar um esqueleto tão pronto, que só precisa do recheio carnoso das palavras pra ficar um monstrinho tão cheio de graça...
Senão vejamos...

1, 2, 3, 4, ... , 31

Parte de mim sente um ódio brutal
Sempre que lê as coisas que escrevi:
– Como você pôde, pobre animal,
Matar o lirismo que estava ali? –
Outro pedaço não chega ao extremo,
Perdoa refrão aqui, versinho lá:
– Com essa rima opulenta até tremo,
Mas o teor abstruso, pô: não dá! –
As partes promíscuas que agora admitem
Mais um soneto feito item por item
Nutrem a crença com força de fé –
Que um dia eu redima tantos maus modos
E ao bater trinta-e-um-meu-salva-todos
Mostre a pureza do amor como ela é.

terça-feira, abril 08, 2008

FEITO ESQUECENDO...

Feito esquecendo as pulsões mais brutais
Encantasse fácil as almas puras
E administrando delícias nos sais
Das palavras travadas de amarguras
Pudesse mesmo arrelvar com carícias
As passadas pesadas de rotinas
Sem que o medo patético partisse as
Rimas com saturações assassinas,
Eu levaria os versinhos na veia
Feito o flautista aos ratos da aldeia
E aos obrigados diria: de nada!
Mas tem sempre um porém em toda via
E a minha inspiração ficou vazia
Lamentando a saliva derramada.

sexta-feira, abril 04, 2008

PÓS-DESCONSTRUÇÃO ARCAICA

Sentindo um cheiro pestilento, lento,
Levanto do meu leito estreito, eito,
No tique a que vivo sujeito, jeito
De santo que um dia arrebento, bento –
Notando o quanto me delata, lata,
Aquela sensação tamanha, manha,
A imagem da grande barganha, ganha,
É o nó que na garganta engata, gata –
E o surto a me levar consigo, sigo,
Em ânsia por amor e abrigo, brigo,
Tocando um som que, mesmo surdo, urdo –
Pois graças ao meu velho e cego ego
Entorto verso e rima e blogo, logo,
O nada que me dá, contudo, tudo.

terça-feira, março 25, 2008

TRÊS PARCERIAS RESGATADAS

A primeira é com o Thadeu, feita na maior parte por ele, mas tem os meus pitacos por ali;

a segunda é com o Plínio Gonzaga, no bar A Gata Comeu no dia 8 de dezembro de 2006 (início da semana de homenagens ao finado poeta Marcos Prado) – os dois versos finais são praticamente roubados dum poema que fiz com o Francisco Cardoso;

portanto, a terceira é pra tentar compensar o Francisco, mas essa parceria com ele foi só até o verso 9: o resto eu completei sozinho, e espero que ele me perdoe por todas essas gafes...


UMA GARRAFA SEM GÊNIO

A tristeza foi tudo o que sobrou
Pra mim, dentro da garrafa vazia,
Pois muito longe da festa eu estou,
Empobrecendo a rima da poesia.

Há pouco tantos por aqui havia
Brindando aos deuses o sonho do gol
Num estádio lotado de alegria,
E agora nem eu aplaudo o meu show.

Só um hiato cabe em lapso como esse,
O eclipse é total, e a lua, nova,
Mas à luz do verso me salvo nesse

Interlúdio imortal. Perdi o interesse:
Nada como um som indo atrás da prova
De que existe vida além dessa cova!

***

A CAVERNA DO BURACO NEGRO

prados, colinas e ravinas,
penhascos, depressões, vales,
cidades, maremotos, ruínas,
montes, montes e montes –
todos os lugares de relevo
não mexem um pêlo da minha sina,
todas as montanhas de nervos
e os intensos rios de lava
não valem um cabelo que resvala –
eu não celebro aniversários de morte,
a vida é que deve a essa descida –
dobrei todas as esquinas,
me perdi em todas as propostas
e agora até as frentes frias
me deram as costas.

***

ETERNA FEMININA

A mulher, a que afresca o teto do meu crânio
E algarismou meu alfabeto extemporâneo,
A sempiterna e carinhosa companhia
Cujo espinho de cor-de-rosa me amacia
E me amalgama o barro em lava incandescente –
Se me chama, me amarro, sem trava aparente;
Se me incita, e excita a cítara mais avara,
Ela compartilha o todo que amealhara –
Feliz combinação de forma e de intenção:
Um triz de distração na norma rigorosa,
Um quê de seriedade em meio à desrazão,
Um O de boca, um U de bunda, um A de rosa,
__Um E de bela, um I de indecisivamente,
__Que ilude, molha, frisa e ameniza a mente.

terça-feira, março 18, 2008

OUTRO PÁSSARO

Levantei de madrugada com o crânio mais que nada
Rebatendo a velha ladainha que um bebum criou;
Sim, aquela, quem não lembra, a velha marcação da lenda
Duma certa ave agourenta, a qual repete um mesmo som —
A ave vem e pousa lenta, repetindo um mesmo som —
__Invenção do velho Poe.

Eu sabia que era fria refazer noutra poesia
Tal estrofe, já vazia, feito andar na contra-mão;
Entretanto fui caindo, como um sol, me achando lindo,
Imitando outros no fim do indecoroso e bom refrão —
Fui caindo, um sol caindo, repetindo o bom refrão —
__Pra alegrar meu coração.

Só que mais triste eu ficava, minha situação mais brava
E a caneta, mais que escrava, já pedia um fim também;
Pois a métrica tão justa e a cadência tão augusta
E insalubre a quem se assusta custam bem mais que um porém;
Custam mais que um entretanto, que um contudo e que um porém;
__Mas eu não passava sem.

Vi depois, sem sacanagem, que faltava um personagem,
Que os bordões, quando eles agem, não se lançam no vazio;
— Chega de metalinguagem, mude a rima agora em cima,
Tente incrementar o clima e diga onde é que já se viu:
Teus versinhos, sem persona, sempre errando, isso é civil?
__Nisso ouvi, distinto, um: — Psiu!

Ah, viu só? — Eu já sabia: nesta madrugada fria
(Que clichês!) demoraria, mas viriam emoções!
— Emoções são coisa de Emo... — Ou será, por outra, o demo?
— Sei que devo mas não temo remover os travessões
(Na cabeça as tantas vozes me causavam confusões)
__— Tire então os travessões!

Reorganizando a mente, notei repetidamente
Que devia tão somente retraçar os passos meus:
Simplifico os descaminhos, deixo ao léu desvios mesquinhos,
Fico aqui no meu cantinho (mais clichês), mercê de Deus...
Fico bem aqui sozinho, não vai só quem vai com Deus...
__— Não é Deus, mas são teus eus...

Dessa vez eu te descubro, refleti, ficando rubro,
Sem saber se já era outubro, ou talvez nem fosse abril -
Pois o caos era tamanho, dava assim em mim um banho,
E eu perdia o jogo ganho pra saber se alguém ouviu -
Pra saber se mais alguma criatura além ouviu
__O distinto e claro: — Psiu!

Novamente o psiu ressoa, vejo então que a hora é boa
Pra flagrar qual é a pessoa causadora da aflição;
Sem tardança ou qualquer falha se projeta-me esta gralha
Cuja voz atroz se espalha declarando enfim quais são —
Quais são as mais necessárias providências da razão —
__Grita a gralha: — Larga mão!

Hoje nem sei se é tão certa dessa gralha a descoberta:
Largar sempre a mente aberta, largar tudo que é ruim —
Sei que enfim vou aplicando o bem que a gralha disse quando
Flutuou na esfera vã do meu poema tão chinfrim —
Flutuou e o próprio Poe, com tal pasticho tão chinfrim,
__Se torceu na tumba e fim.

segunda-feira, março 10, 2008

TENTANDO COLAR NOVAMENTE OS CAQUINHOS DO ESPELHO DO BANHEIRO

Você voltou pra casa (tá legal: quitinete no centrão nervoso)
Quase correndo porque sabia que um mínimo desvio -
Até um sorriso da vizinha do terceiro andar
Ou a saudação de rotina da porteira ingênua -
Podia estragar a iminência do poema longo -
Você sofreu consciente esse ataque da vida diária,
Ainda é noitinha e o clima ainda é propício,
E você sabe que vai usar o recurso da terceira pessoa
Como se fosse a primeira,
Velho truque de perspectiva já invectivado anteriormente,
Sacado do gibi do Punho-de-Ferro,
Tendo ainda em vista que o texto a ser escrito é quase prosa,
Que o verso longo e sem medida é sinal de explosão e cansaço,
Que depois ao ser postado vai bagunçar tudo por causa da formatação e do comprimento da coluna,
Sabendo sim que nenhum suporte é grande o suficiente pra abrigar a inspiração poética,
Lembrando também de novo e de novo aquele seu poema escrito no rolo de papel higiênico que seria o único a aturar qualquer tamanho de verso quando usado em formato "paisagem",
Percebendo sim que isso está mais pra prosa e que escrever em prosa,
Você já disse uma vez ao Sandrini,
Dá-lhe a sensação de estar traindo a Musa,
Mas até que está musical,
E até vai meio que rimando,
Então toca o pau,
Ivan,
Sim,
Ivan, você sabe que vai usar dessa vez todos os nomes,
Vai aproveitar o embalo destampatório-emocional,
Vai entregar o jogo todo sem disfarce ficcional,
Vai falar da postagem do Pinduca
(que intimidade é essa? Nem você sabe, mas vá lá)
que você leu e lembrou daquela noite de 1999,
homenagem aos dez anos de falecimento do Leminski,
quando você quase recém-ingresso no mestrado na magnífica USP,
recém-ingresso no escalafobético CRUSP e toda a beleza da coisa
(teatro de graça todo fim de semana na ECA,
cinema de graça todo dia no CINUSP,
biblioteca mágica e silenciosa,
sensação de morar no Parque Barigüi em plena Sampa desvairada, etc)
você mal segurou o mal-estar que o Pinduca lhe causou,
com toda aquela ironia em cima dos uspianos,
e anteontem você leu a postagem em que o mesmo Pinduca
faz alguma (enfim, alguma) concessão à academia,
termo sim execrável aos drop-outs e quejandos,
e aos poetas mais ao estilo do Leminski
que era enfim o teu "objeto de estudo"
(e olha a mudança pronominal - teu, seu, você, tu, enfim, foda-se)
enfim,
você nem soube como comentar isso lá na espelunca sem que parecesse
que você é mesmo esse acadêmico,
esse mestre que surtou pra concluir a porra toda,
e você luta pra voltar àquela sensação antiga e boa de escrever poesia,
você luta pra colar novamente os caquinhos do espelho do banheiro,
peleja pra voltar a ser o grande poeta de bosta que você achava que era -
você chegou na quitinete e ligou o computador,
insuportável a pressa de começar a despejar o surto-impulso em verso,
você não agüentou o tempo de inicialização,
pegou um caderno pra não perder o embalo,
não escreveu nada porque nunca aparece uma caneta nessa hora,
é uma das neuroses que você herdou da sua mãe,
e aí achou lá uma página mal-caligrafada pela Joelma:
"Ivan, fomos a praça caminhar
liguei o PC p/ ouvir música
e deu a tela azul"
muito poético, sim, praticamente
um haicai selvagem em estado de animação suspensa,
do tempo que tua filha ainda morava com vocês,
do tempo em que as coisas não estavam condenadas,
tá, você sabe que ainda não estão,
vai rastejando ainda agora,
conseguiu estopar com a canabis diária e o álcool ocasional,
mas vê que anda sempre por um fio pra recair de novo,
está aí acordando cedo,
fazendo exercício,
cozinhando o blog em banho hiper Maria,
traduzindo o Johnny Panic and the Bible of Dreams
& Other prose writings da idolatrada Sylvia,
a suicida favorita de todos e todas,
e isso te remete à Ana Cristina César,
sim,
você acaba de voltar da BPP,
onde perlustrou o Inéditos & Dispersos
e se assombrou com o primeiro poema infantil ilustrado
no qual a protagonista se joga das alturas,
putz, você sabe que não vai se jogar também,
você sabe que está ainda achando tudo horrível e por certo também fabuloso,
você prevê que ainda assim não vai ser sincero o suficiente,
não vai falar (ops, já está falando) que quase se mijou de rir
na lan-house lendo os poemas em parceria
do Thadeu e do Edson,
e que leu o poema mais recente do Thadeu,
sentindo aquele ciúme leproso de
"Porra, quando é que eu vou jorrar versos assim?",
e...
vai, continua!
E a tua vida afetiva que você bagunçou o quanto pôde,
Não vai citar alguma coisa?
Você sabe que não, que elas vão se arrepiar,
Que uma não quer, que outra babaria, que aqueloutra nem me fale,
Mas que no momento você decidiu ficar "um tempo sozinho"
Provavelmente pelo velho egoísmo e crueldade naturais,
Pra poder ir dormir quase chorando feito o covarde fraco que tu és,
E agora a empolgação vai diminuindo,
Você já atacou o teclado a la Bukowski (bata nela, bata na máquina
Feito um boxeador), você sabe que vai quem sabe até editar os inícios de linha
Porque a porra do editor de texto está maiusculizando sozinho de novo,
Você sabe que daqui a pouco vai salvar esse troço no disquete
Sim, você ainda usa o venerado disquinho quadrado,
Vai revisar, vai falsificar aqui e ali,
Mas vai correr até a cyber loja próxima pra postar tudo isso,
Depois voltar pra casa (vide o início),
Ler a Clarice que te anda obsedando,
E o primeiro livro da tetralogia do Rio Apa
Pra complementar leituras do teu hipotético doutorado,
A respeito da Literatura Paranaense, "A Angústia da Existência",
Que você sabe que existe mas que também não existe
Se for considerar o panorama brasileiro,
O qual já é ultra-periférico mundialmente,
O teu estado do Paraná, então,
Periferia da periferia da periferia da periferia,
E ainda assim os livros estão todos lá,
Caindo aos pedaços mas estão lá,
E o texto do Jamil Snege sobre isso, então,
Aquele capítulo do Como eu se fiz por si mesmo,
Não é genial? Não é aquilo mesmo?
Enfim, que nojo de usar esse enfim que você flagra
Quando não é você mesmo que está usando,
Voltando:
Você vai postar esse troço e amanhã já vai acordar pensando
Se alguém comentou, se o Pinduca tomou conhecimento:
Porra, você quer o quê?
Quer voltar sim a ser considerado gênio
Do jeito que você sabe que não é,
Quer repercussão, quer ser amado e odiado
(você já é, isso não é tão difícil assim)
enfim,
de novo,
você tentou voltar com tudo (e contudo...)
não disse nem metade do que queria,
ou talvez um pouco mais do que queria ou podia,
ou seria capaz,
e agora, rapaz,
agora é hora de encerrar a sessão de descarrego
e ir até o mercado buscar os teus limões do bem,
antes passar no cyber-treco e postar essas,
essas...
você sabe que tem que mandar alguma artilharia pesada aqui,
no final: esse é o final -
você disfarça,
olha pra janela,
nenhum Esteves vai te dar Adeus,
a paisagem urbana é aquela mesma, sim, aquela
e existe apenas o cansaço da noite de um dia fácil/difícil,
existe a possibilidade do sorriso,
a auto-complacência,
o momento em hífen que aguarda a próxima palavra,
e, eventualmente, alguma rima boa por ali à toa
que ainda te abençoa
e te escalavra.

segunda-feira, fevereiro 25, 2008

experimentalismo poético?

PAPAJOYCEATWORK
PAPAJOYCETRAMPANDO

(Noite. Joyce começa a escrever)
(Night. Joyce begins to write)
Madmanam eye! Light gone out!
Olho malucadãome! Luz se foi!
(Cai no papel)
(Falls over the sheet)
Mustmakesomething! Reverythming!
Temquefazeralgo! Ritudsonhindo!
(Morde os lábios e gargalha)
(Bites his lips and laughs out loud)
A poorirish is a writer mehrlichtsearching,
Um pobrirlandês é um escritor soluzmentbuscando,
Yesternighteternidades!
Ontemanoiteternities!
(Troveja. Relâmpagos iluminam o quarto. Joyce prossegue)
(It thunders. Lightnings brighten up the room. Joyce goes on)
Thomasmorrows? Horriver!
Amanhantonios? Horriopilante!
Nice and sweet – the speech of England, damnyou! Dont?
Bela e doce – a fala da Inglaterra, dane-se! Não?
Must destroy it, just like a destroyer would do it yourself!
Tenho que destruí-la, bem como um destróier faria você mesmo!
Como um verme. Yes, I no.
Like a vermin. Sim, eu say.
Done to Ireland! What have they done? It will do.
Feito pra Irlanda! O que eles fizeram? Servirá.
Beforeblacksblanco, we are even, this very evening! Think is so.
Antespretéwhite, estamos quites, nesta noite esquisita! Pensar é tão.
My vengeance will be as big as say a country as big as say Brazil.
Minha vingança será grande qual digamos um país grande qual digamos o Brasil.
Someday my prince will come. Our prince: Seabastião!
Dum mingo meu príncipe virá. Nosso príncipe: Semarstião!
Arrise, Lewisrockandcarrol!
Erga-se, Monteirockandlobato!
Waterrestrela, am I a dayer?
Agüearthstar, sereia eu um dia rio?
Just a wakewriter.
Só um escrivelório.

p.leminski – 1977
ivan j.s. – 2004

quinta-feira, janeiro 31, 2008

THE TOWER OF FAMINE (A Torre da Fome)

Amid the desolation of a city,
Which was the cradle, and is now the grave
Of an extinguished people, --- so that Pity

Entre a desolação de uma cidade,
Que foi berço, e agora é sepultura
De um povo extinto, - e assim a Piedade
Weeps o'er the shipwrecks of oblivion's wave,
There stands the Tower of Famine. It is built
Upon some prison-homes, whose dwellers rave

Chora os naufrágios nessa onda obscura,
Lá está a Torre da Fome. Construída
Sobre prisões, nas quais se habita em fúria
For bread and gold and blood: Pain linked to Guilt,
Agitates the light flame of their hours,
Until its vital oil is spent or spilt.

Por pão, e ouro, e sangue: a Dor, unida
À Culpa, agita a luz dos moradores,
Até a chama vital ser consumida.
There stands the pile, a tower amid the towers
And sacred domes, each marble-ribbed roof,
The brazen-gated temples, and the bowers

Lá está a pilha, uma torre entre as torres
E os domos sacros; todo teto ornado,
Os templos brônzeos, e abrigos de flores
Of solitary wealth, --- the tempest-proof
Pavilions of the dark Italian air, ---
Are by its presence dimmed --- they stand aloof,

Ao luxo solitário, - o reforçado
Pavilhão do soturno ar da Itália, -
São diminuídos - ficam de lado,
And are withdrawn --- so that the world is bare;
As if a spectre, wrapped in shapeless terror,
Amid a company of ladies fair

E se retiram - e o vazio se espalha;
Qual se um espectro envolto em puro medo
Entre várias damas trajando gala
Should glide and glow, till it became a mirror
Of all their beauty, --- and their hair and hue,
The life of their sweet eyes with all its error,
Deslizasse e reluzisse, e em espelho
De todos esses charmes se tornasse,
E a vida desses olhos, com seu erro,
Should be absorbed till they to marble grew.
Fosse absorvida até crescer no mármore.

P.B.Shelley
Ivan Justen Santana