sábado, dezembro 21, 2013

VOLTAR AQUI (PARA AQUELA QUE ESTÁ LÁ)

a FFR

Depois de tanto ti-ti-ti.
Depois de muito blablablá.
Eu não me canso e fico aqui
só esperando você voltar.

O mundo arrota e faz xixi.
A lua nem diz sai pra lá.
E ainda assim eu sigo aqui
só esperando você voltar.

Existe um sol além de si.
Existe um chão no fim do mar.
Portanto ainda existo aqui
só esperando você voltar.

Se descobriu-se o colibri,
se o sabiá sobrou sem par,
sobrei também trilando aqui
só esperando você voltar.

Talvez seja algo eterno (um pi).
Talvez já feche (feito um bar).
Talvez alguém (tipo eu) aqui
só esperando você voltar.

E que moleza, hein, nisso aí,
versinhos de nunca acabar...
Mas é isso mesmo: eu, aqui,
só esperando você voltar.

ijs

quarta-feira, dezembro 18, 2013

CURRICULUM VITAE

Dorothy Parker

Se atirar da ponte é piada
e cortar os pulsos dói.
Drogas? Não garantem nada.
Ácido mancha e corrói.
Pistolas? Muito barulho.
Forcas? Podem se romper...
Gases provocam engulho.
Não dá na mesma viver?

versão brasileira:
Ivan Justen Santana

clique aqui para o texto original

domingo, dezembro 15, 2013

CARTA A MEU CARO MARCOS PRADO, EM MAIS UM SEU ANIVERSÁRIO

*
Pois é, meu caro Marcos Prado:
é mais um teu aniversário
e Curitiba segue a mesma,
talvez até um pouco diversa
se vai envelhecendo a turma
enquanto inauguram de novo
a nossa tradição nenhuma –

pois sim, meu caro Marcos Prado:
foi minha vez de recordar o
festejo na data querida
e ainda aqui rimar com vida
em mais outra menção honrosa
ao que é poesia a todo povo,
se hoje tanto se aposta em prosa –

pois não, meu caro Marcos Prado:
não vamos mais recriminar o
cabuloso estado de coisas
das gentes velhas e das moças
enquanto seguem consumindo
um sempre mais dum outro corvo
embranquecido e mais que lindo –

pois é, meu caro Marcos Prado:
até que vale ter passado
algumas noites e alguns dias
nas boas e más companhias
do nosso seleto pessoal –
e com água brindo este estorvo
duns poucos versos. Sem mais, tchau.
*

quarta-feira, dezembro 04, 2013

ENQUANTO TEU

a FFR
*
Todas as paranoias estão vendo
com olhinhos e linguinhas de naja
e o teu nojo nem chega a ser horrendo
enquanto teu amor viaja.

A língua portuguesa é culta e feia
feito as frases dum gajo à sua gaja
e o símbolo é fatal a quem não leia
enquanto teu amor viaja.

Se tudo valeu o que nem te contem
na selva selvagem desnuda maja
e o totem de hoje foi o mesmo de ontem
enquanto teu amor viaja,

eu sei: ninguém entende e que se lasque:
uma mossa ou amolgadura é uma jaja.
Importa que ela entenda e siga em paz que
enquanto teu, teu amor viaja.

E lage continua sendo laja
enquanto teu amor viaja.

*

sábado, novembro 30, 2013

ANTES DO FIM DE NOVEMBRO

*
O surto: de nascença.
A fase: fim no meio.
Os verbos: sem presença.
O saco: sempre cheio.
A sarça: fogo incógnito.
As secas: nada harmônicas.
O corso: todo insólito.
As cordas: tão sinfônicas.
Soneto: lixo antigo.
Sonata: luxo aos poucos.
Soneca: mais perigo.
Silêncio: tosse aos loucos.
Silício: nuvem perda.
Cenário: mesma merda.

*

quinta-feira, outubro 24, 2013

A MÁQUINA DO CU DO MUNDO

(ao Rodrigo Madeira, que inadvertidamente me deu a ideia de, e ao resto da renca toda [eu ia dizer da putarada toda, mas sou um beletrista de respeito e de família, então...)

E como eu não nem a pau humilhasse por
Nenhum lugar incomum mas aquele um mesmo
Lugar qualquer vagamente cu do

Mundo agora nunca mais tão vasto imundo
E sem essa de versar em decassílabos
Rimados que se já veio o Modernismo e

O Concretismo e o Daltonismo e a
Porra toda é sim essas merdas e luzes
Totais são só pra poder botar pra

Foder e usar essas tais todas palavras tabus
Que nem chocam mais ninguém talvez quem sabe
Os beletristas que nem eu ou

Alguns dos meus vários demônios de
Mania ou depressão e as porras todas, enfim,
A máquina do cu do mundo já está

Toda aberta arregaçada rapinada vamos
Lá dialogar com ela desse jeito e
Comentar que agora sim tudo desanda e anda e

Se encaminha: esse poema de merda genial é também
Pra dizer que por exemplo o livro do Pellegrini
Sobre o Leminski é quase mais do mesmo

Quem não soube (ninguém soube) sobre a
Grande bosta e sublimidade do ego amigo
Inimigo enfim de novo é parte e quase nem faz

Parte do problema todo que é fazer
Poesia e agora ligo isso com a merda que
Ocorreu com o livro Ultralyrics do Marcos

Prado que devia estar sendo vendido e distribuído
E aquele bosta e bom escritor bom romancista e
Até razoável poeta daquele Fábio Campana

Não devia ter refugado as condições porque
Não é favor nenhum publicar um poeta de verdade
Foda (muito foda) como foi e é será o Marcos

Prado e pois é que as novas gerações estão
Chegando e se informando e se desinformando
Com as porras todas desses pesadelos pesadédalos

Dos quais tentamos e não conseguimos
Acordar (nem a cor dar) pois sim então eu
Ia dizendo bem no meio da máquina do cu do

Mundo meu eu no espelho e as porras todas
Quais eram mesmo? Ah sim o lance da
Poesia na Bienal de Curitiba -- os lançamentos

Dessa semana que passou (sim estou datando a
Porra do poema e sim eu fui naquele novo shopping
Onde os versos de poetas paranaenses estão lá

Até que venha alguma loja e ocupe o lugar
Onde estão enfeitando e ninguém lê nem sabe
Só acha culto e bonito a poesia local é sim: LOCAL --

Porque enfim a porra toda do
Sistema quer disciplinar a existência da arte e
Não adianta e adianta sim estamos no ponto

Em que as coisas são e não são tranquila
Mente enfim se fosse mesmo pra representar a
Poesia em Curitiba não podiam ter faltado

O Thadeu e o Lepre e o Adriano Smaniotto o
Qual devia estar lá com o poema "A Velha da
Rodoviária" possivelmente o mais emblemático

Dessa nova velha safra desde sempre de
Poetas e poemas se fodendo pra tentar mudar o
Cu do mundo ou mesmo pouco se fodendo

Sim estou queimando mesmo o decoro e a porra
Toda porque é e não é ou não assim
Mesmo a poesia se metendo a Black

Bloc ou só fazendo chuvisco e plic & ploc
Porque a arte tem e foda-se não tem essa missão --
Quem tem no fim muito essa e mais missões

São esses poucos e poucas que controlam a porra
Toda e criam cargos comissionados e puta merda
Não adianta responsabilizar o cara que está lá

Porque meramente cumpre seu papel no jogo mais
Pesado da merda toda mas faz o que consegue
Essas barganhas todas nessas merdas e prosseguem

Mantendo o sistema funcionando que se não
Fosse de outro jeito eu nem não poderia estar
Aqui tentando escrachar e eu mesmo me

Escrachando diante da bosta toda conforme
Ela está posta na mesa de todos mesmo
Quem nem tem mesa diante da qual comer.

E foi só tudo isso que a máquina do cu do mundo me
Disse eu sendo também ela e parte dela e
Envergonhando minha família procurando ser

E não sendo a voz das artes que essa
Renca e eu tentamos ir fazendo e questionando
E postando em blogues e anunciando nessa rede que

De social tem pouco ou quase nada mas
É quase tudo que podemos nessa não fazer
E mesmo assim arriscando a nem sequer

Ser ou não ser ouvido ou levado a sério
E servir na gente o capuz de
Beletrista enquanto o horizonte de

Expectativas é restrito mesmo a
Porra da boceta da caralha da
Máquina do cu do mundo me disse

Isso mesmo melhor seria eu nem não
Me meter a besta de escrever sem freio
E contextualizar mal e porcamente dessa

Forma datando poema com referências
Imediatas mas ficar só assim fazendo
Embaixadinhas com rimas e métricas e

A porra toda da poesia (des)compro(omissada)
Mas já passou da hora e do limite de atenção
De quem está lendo que nem vê aonde quero

Chegar ao mencionar por exemplo o poema da Marília
Kubota no livro da Bienal (Fantasma Civil) que
Nesse ela conclui falando do cu do

Vácuo e esse cu desse vácuo desse
Nosso cu diário de mundo de máquinas
Somos nozes cegos que fazemos também

Merdas sem nem prestar atenção e
O fôlego vai acabando e
Nem pude tramar mesmo o que

Eu queria e esperava pra honrar a
Camisa da poesia que no fundo
Mal se espreme e mal se exprime

Pra sacudir e esculachar ainda que
Com o calão e os palavrões essa porra
Toda que nos transforma e conforma e transtorna

Em todos membros dessa máquina
Desse cu
Desse mundo

Enfim: foda-se e agora está é será com vocês


ijs

____

quinta-feira, outubro 10, 2013

SESQUIPEDANTESCAMENTE REVERSANDO

*
Sem meio nem caminho ou sequer pedra
Dalguma tradição (mesmo mais nova),
Na selva hipercinzenta que não medra

Num tempo atemporal de velha cova,
Me achei num limbo – placa: Paraná.
Um ente então piscou na treva torva

Feito se ali não fosse aqui nem lá –
Fosse ente diferente de seu ego,
Futuro a ser, passado que será.

Não era algum fantasma em desapego,
Tampouco um louco trasgo envolto em visgo.
Tratava-se do velho Bento Cego,

Cantor de redondilhas, nunca misgo
Nas rimas de improvisos mais certeiros
Que aqueles que de vez em quando eu fisgo

Até nos reservados dos banheiros.
Os olhos do poeta eram faróis
Iluminando sons, gostos e cheiros,

E ele me perguntou: “Por mim te dóis?
Machuca-te eu estar no esquecimento?”
E eu quis dizer-lhe que entre os meus heróis

Seu vulto era mais firme que cimento.
Porém não houve tempo. Repentino
O repentista se desfez num vento

O qual soprava feio, forte, fino,
Da direção da realidade humana.
Mas eu me recusava ao frio destino

De retornar a um mundo que só engana,
E assim no limbo ali dobrei a aposta
Na inexistência pura, boa, insana:

E aí me apareceu, qual mesa posta,
Outra figura, branca, meiga, longa,
Que em vida se chamou Júlia da Costa.

“Como eu não me afoguei na Babitonga,
Me alegro em ver você escrevendo assim...”
Foi feito algum feitiço de milonga

Saber que aquela voz vinha pra mim,
E todo o Romantismo dessa Júlia
Talvez já me bastasse como um fim.

No entanto o vento, novamente pulha,
Soprou levando a triste e malfadada,
E me foi necessária força hercúlea

Pra não voltar à Terra devastada.
Eu suspeitava mais, desde o princípio,
Que a sugestão de tudo, ou mais que nada,

Ao limbo, mais que estado ou município,
Tornava em dimensão jamais prevista,
Em verbo além gerúndio e particípio,

Na graça duma nuvem simbolista.
E a nuvem eram poucos e eram muitos,
A ouvido, língua, pele, nariz, vista –

Caleidoscópicos curtos circuitos
Tangidos dum saudável brilho insano
De músicas, imagens, tons fortuitos –

Vinham Dario, Silveira e Emiliano,
E Nestor Victor, Rocha Pombo, Adolfo
Werneck e outros junto a este Capistrano,

Rompendo ritmos e envolvendo em golfos
De rufos, de tambores, de fanfarras,
Rindo e chorando ao lado do balofo

Emílio com inda afiadas garras –
Eu percebia que era sonho e que era
Também fruto das minhas próprias marras

De cultivar com asas e com cera
Um pensamento que não há quem pense –
E os vultos proclamavam-me: “Pudera!

Existe a poesia paranaense!
Mesmo escandida em metros pés quebrados,
Mesmo se à crítica ela não convence!”

E festejamos livres kolodys leminskis por marcos e prados...


IJS

* * *

terça-feira, outubro 01, 2013

Carta aberta a Rogério Pereira e Luiz Rebinski Junior

"O Paraná se emancipou politicamente em 1853, mas o primeiro sinal de vitalidade intelectual no Estado aconteceria apenas décadas depois, devido à atuação de Newton Sampaio. Ele nasceu no dia 10 de setembro de 1913, em Tomazina, e morreu no dia 12 de julho de 1938, na Lapa. [...] nesse brevíssimo período de vida ele conseguiu, sem exagero, chacoalhar, e mesmo, inventar -- intelectualmente -- a província. [...] foi o primeiro a combater o provincianismo e a evitar o elogio ao escritor apenas pelo fato de ele ser uma personalidade da aldeia."

Assim começa o editorial do jornal Cândido, da Biblioteca Pública do Paraná (edição 26, setembro de 2013).

Como poeta, leio esse editorial, e as diversas matérias sobre Newton Sampaio nessa edição do Cândido, como interessantes considerações sobre isso que às vezes imaginamos que existe, às vezes deliramos que tem um estatuto de realidade e de fato consumado, mas muitas outras vezes ficamos com a impressão de não ser coisa lá muito sólida: sim, essas coisas, a cultura, a arte, e especialmente a literatura paranaense.

Mas, como pesquisador e crítico, o que leio nessa edição do Cândido é um belo tiro no próprio pé.

Raciocinem comigo: se devido à atuação de Newton Sampaio houve o "primeiro sinal de vitalidade intelectual do Paraná", o que foi então a criação da própria Biblioteca Pública do Paraná, em 1857? E a inauguração do Museu Paranaense, em 1876? Sinais de mortalidade intelectual?

Deixando de reserva os jornais que passaram a ser publicados aqui após a emancipação, o que foram então as dezenas de revistas que saíram em Curitiba, durante a agitação promovida pelos simbolistas, nas décadas de 1890, 1900, 1910? (Quem quiser conferir um pouco o que foi isso, que consulte a biografia de Cruz e Souza escrita por Paulo Leminski, a qual está lá no recentemente relançado Vida.)

Mais além, no passado, o que foi a atuação do poeta Bento Cego, nascido em Antonina, por volta do ano de 1820, e que percorreu o interior do Paraná e do sul do Brasil, vencendo desafios de viola e se tornando lenda antes do fim do século XIX?

O que é a obra de Julia da Costa, nascida em Paranaguá em 1844, e que recebe atenção crítica até hoje, tendo sido re-editada em 2001, e motivando um romance de um autor contemporâneo radicado e atuante aqui, o Roberto Gomes?

Enfim, o que foram a atuação e as obras de Rocha Pombo, Emiliano Perneta, Dario Vellozo, Silveira Neto, Nestor de Castro, Adolpho Werneck, Nestor Victor, Tasso da Silveira? (São as figuras principais de um período que, a confiar nas declarações do editorial do Cândido, os autores simplesmente ficavam se elogiando só por terem nascido ou viverem aqui, e nenhum de seus trabalhos seria sinal de vitalidade intelectual...)

Mas não paremos só na literatura: o que foram a vida e obra do compositor Brasílio Itiberê? (Recentemente a Gazeta do Povo publicou matéria a respeito dele, e do esquecimento em que se encontra -- clicar aqui para ler.) Sinal de provincianismo, atuação decorativa, nenhuma vitalidade intelectual?

Pelo jeito, são esses agora os "outsiders" (os de-fora), enquanto que o "esquecido" Newton Sampaio, que ganhou prêmio da ABL na década de 1930, foi celebrado na revista Joaquim na década de 1940, re-editado pela Fundação Cultural de Curitiba na década de 1970, recebeu atenção acadêmica, e foi "redescoberto" e publicado diversas vezes nos últimos tempos, esse seria o injustiçado cavaleiro solitário da origem da literatura paranaense?

O professor Paulo Venturelli, da UFPR, e membro da Academia Paranaense de Letras, publicou numa edição anterior do Cândido um texto sobre autores paranaenses e também desconsiderou, sem solenidade nenhuma, tudo (ou seria nada?) que ocorreu na província/Estado antes do advento da revista Joaquim, na segunda metade da década de 1940.

Ora, o que parece é que estamos assim nutrindo uma vergonha do passado original do Paraná. Graças a um artigo de Dalton Trevisan (que além de sair na sua revista, foi republicado na Gazeta do Povo, em 1951), aceitamos gratuitamente que Emiliano Perneta foi um poeta medíocre, e assim ficou todo mundo dispensado de ler e conhecer o que foi feito antes da explosão modernista (com vinte anos de atraso) da revista Joaquim...

Não obstante, quando o jornalista Almir Feijó (numa entrevista de 1978 para a revista Quem) perguntou ao Paulo Leminski o porquê de ele ter atacado o Dalton Trevisan, no final dos anos de 1960, a resposta foi a seguinte:

"[...] quando o Dalton surgiu no cenário curitibano, ele se afirmou atacando Emiliano Perneta. A primeira coisa que Dalton fez, quando surgiu no cenário literário curitibano, foi atacar a marca líder, como se diz em propaganda, que era Emiliano Perneta, num artigo chamado: “Emiliano, um poeta perneta”. E, assim como Dalton começou atacando Emiliano Perneta, eu acredito que, sem saber na época dessas coisas, comecei de certa forma atacando Dalton Trevisan. Agora, Dalton estava errado. Emiliano é um grande poeta."

Para encaminhar a conclusão, dirijo-me aos caros Rogério Pereira e Luiz Rebinski Junior: é certo então que, graças a um artigo satírico sobre a criação da Academia de Letras do Paraná, publicado no Rio de Janeiro, quando Newton Sampaio já tinha abdicado da vida cultural paranaense, a ele seja atribuído esse papel de "primeiro sinal de vitalidade intelectual" do Paraná? Mas se o Emílio de Meneses, que se criou neste mesmo ambiente de provincianos, trinta anos antes de Newton Sampaio nascer, não pintava e bordava com tanta ou mais graça sobre figuras muito mais graúdas e importantes nacionalmente, com suas temidas sátiras?

Entendo que a publicação de um jornal se alimenta das sensações que é capaz de criar no leitor, e eu não teria escrito essa carta se não achasse saudável discutir, fazer afirmações radicais, provocar reações... Mas o efeito de se destacar, com esse tipo de postura polêmica, apenas uma das figuras fundamentais da nossa (será mesmo? enfim...) literatura paranaense, em detrimento de outros que também tiveram seu valor, pode ser bastante negativo para os leitores atuais, quiçá futuros pesquisadores, quando ainda estão por revelar ilustres desconhecidos como José Cadilhe, só para citar um dos verdadeiros "outsiders", que esperam por redescobertas como essa que vocês promoveram.

Ivan Justen Santana, mestre em Letras pela USP (com dissertação sobre Paulo Leminski), doutorando em estudos literários pela UFPR (com pesquisa sobre Emiliano Perneta).

segunda-feira, setembro 30, 2013

O CEGO WILLIE McTELL

Blind Willie McTell -- Bob Dylan
versão brasileira: Ivan Justen Santana

Seen the arrow on the doorpost
Saying, “This land is condemned
All the way from New Orleans
To Jerusalem”
I traveled through East Texas
Where many martyrs fell
And I know no one can sing the blues
Like Blind Willie McTell
A placa-seta no batente da porta
Dizia: "Condenada a terra além
Da estrada desde Nova Órleans
Até Jerusalém"
Viajei pelo Leste do Texas
Onde muito mártir já foi réu
E sei que ninguém mais canta o blues
Feito o cego Willie McTell

Well, I heard that hoot owl singing
As they were taking down the tents
The stars above the barren trees
Were his only audience
Them charcoal gypsy maidens
Can strut their feathers well
But nobody can sing the blues
Like Blind Willie McTell
É, ouvi aquela coruja cantando
Enquanto eles derrubavam as tendas
As estrelas sobre as árvores secas
Eram a única audiência dela
Aquelas moças ciganas carvoeiras
Desfilam com as penas ao céu
Mas ninguém mais canta o blues
Feito o cego Willie McTell

See them big plantations burning
Hear the cracking of the whips
Smell that sweet magnolia blooming
See the ghosts of slavery ships
I can hear them tribes a-moaning
Hear that undertaker’s bell
Nobody can sing the blues
Like Blind Willie McTell
Veja as grandes plantações queimando
Ouça os estalos dos chicotes
Sinta a doce magnólia desabrochando
Veja os navios negreiros e seus lotes
Posso ouvir as tribos e seus gemidos
E o sino do coveiro toca ao léu
Ninguém mais consegue cantar o blues
Feito o cego Willie McTell

There’s a woman by the river
With some fine young handsome man
He’s dressed up like a squire
Bootlegged whiskey in his hand
There’s a chain gang on the highway
I can hear them rebels yell
And I know no one can sing the blues
Like Blind Willie McTell
Tem uma mulher à beira do rio
Junto com algum belo rapaz
Vestido como um escudeiro
Carregando seus uísques ilegais
Tem uma gangue de correntes na estrada
Ouço seus gritos rebeldes ao céu
E sei que ninguém mais canta o blues
Feito o cego Willie McTell

Well, God is in His heaven
And we all want what’s His
But power and greed and corruptible seed
Seem to be all that there is
I’m gazing out the window
Of the St. James Hotel
And I know no one can sing the blues
Like Blind Willie McTell
É, Deus está em Seu paraíso
E todos queremos o que é Dele
Mas poder, ganância, semente corruptível
São só o que existe, ao que parece
Estou olhando pra fora da janela
Daqui deste indiferente hotel
E sei que ninguém mais canta o blues
Feito o cego Willie McTell

domingo, setembro 29, 2013

ASSISTINDO AO RIO PASSAR

[Watching The River Flow -- Bob Dylan
versão brasileira: Ivan Justen Santana]

Qual é o problema comigo
Não tenho muito o que dizer
A aurora já se esgueira pela janela
E eu ainda aqui nesse café
De um lado pro outro sob a lua
Lá fora os caminhões vão devagar
Sento aqui nesse banco de areia
E assisto ao rio passar

Quem dera voltasse à cidade
Em vez desse velho banco de areia
O sol batendo sobre as chaminés
E por perto a amada, bem aquela
Se eu tivesse asas e voasse
Eu saberia por onde planar
Mas agora sento aqui satisfeito
E assisto ao rio passar

As pessoas discordam sobre tudo, é
Faz você parar e refletir
Por que ontem vi alguém na rua
Que não parava com o mimimi?
Ah, esse velho rio segue correndo
Não importa quem nele nem qual vento a soprar
E enquanto isso bem aqui me sento
E assisto ao rio passar

Pessoas brigando aonde quer que se olhe
Faz você parar e querer ler um livro
Por que ontem vi alguém na rua
Que só ficava se sacudindo
Mas esse velho rio segue correndo
Não importa quem nele nem qual vento a soprar
E enquanto isso bem aqui me sento
E assisto ao rio passar

...

O poema mais importante do Cláudio Bettega

...
agora não sei por que me bateu de postar isso---é que não estava em blogue nenhum (mas tem uma postagem com vídeo aqui)

altero o ego
do meu outro
eu
de acordo

com o sonho
que nesta noite
me bateu
modulo
o abismo
que nos separa
e faço dele
minha parte
minha
somos um
não há outro
e em mesmo
sendo um
não somos
pouco

Cláudio Bettega (1971-2010)
...

quinta-feira, setembro 26, 2013

INFOSCÍVEL

*
Ao Paulo de Toledo


desistir é mais fácil
e mesmo assim difícil
se até o que fosse fóssil
detona como míssil

*

segunda-feira, setembro 16, 2013

SOL DOS INSONES!

[SUN OF THE SLEEPLESS! George Gordon, Lord Byron]

Sol dos insones! melancólico astro!
Teu raio de lágrima ao longe é um rastro,
Mostrando à treva, a qual não esconjuras,
Quão semelhante és às lembranças puras!
Brilha assim o passado, luz de outrora,
Que não aquece a quem atinge agora;
Brasa que a Angústia vela, findo o dia,
Distinta e distante — clara — mas fria!


versão brasileira: Ivan Justen Santana

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terça-feira, setembro 10, 2013

NOSSA VILA (PUXA VIDA, CURITIBA)

*
nossa vila tem as taras de costume
e outros podres gestos menos ou mais nobres
dos poderes que a controlam com seus cobres
das mamatas que inda causam muito ciúme

nesta festa tem também a classe artística
com autistas quase gênios quase monstros
produzindo em jorros obras feitas mênstruos
feitas frases mísseis de fatal balística

mas bombando estão as forças repressoras
civilização-barbárie: são conceitos
tão semelhos que nem sei bem se eu aceito-os
como aceito que haja raivas ruivas loiras

e eu faria até canções semiambiatômicas
tipo aquela Desolation Row do Dylan
só filando esse filé que tantos filam
junto às nossas priscas juventudes sônicas

mas o simples se tornou aqui complexo
se estes versos não te soam bem: meus pêsames
pois o idioma que não fiz nessa hora pesa-me:
sexo é nexo --- nexo é plexo --- plexo é sexo

da linguagem tu leitor que assim mereças
largo então estreitas pistas pelos pés
recalcando as babas prontas dos manés
e imortalizando-os mesmo que às avessas

se puderem compreender coisas como essas

IJS

....................

sexta-feira, agosto 30, 2013

PARA A ANIVERSARIANTE FAENA FIGUEIREDO ROSSILHO

*
Hoje é o teu aniversário,
porém eu estou pobrinho,
então uso lá do William
(e da bárbara tradutora)
um soneto de presente
do teu Ivanzinho ardente...


SONETO 116 DE WILLIAM SHAKESPEARE, VERTIDO POR BARBARA HELIODORA


De almas sinceras a união sincera
Nada há que impeça: amor não é amor
Se quando encontra obstáculos se altera
Ou se vacila ao mínimo temor.
Amor é um marco eterno, dominante,
Que encara a tempestade com bravura;
É astro que norteia a vela errante
Cujo valor se ignora, lá na altura.
Amor não teme o tempo, muito embora
Seu alfanje não poupe a mocidade;
Amor não se transforma de hora em hora,
Antes se afirma, para a eternidade.
__Se isto é falso, e que é falso alguém provou,
__Eu não sou poeta, e ninguém nunca amou.


* * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * *

terça-feira, agosto 27, 2013

segunda-feira, agosto 26, 2013

BALDES DE CHUVA (DE BOB DYLAN, EM VERSÃO BRASILEIRA DE IVAN JUSTEN SANTANA)

BUCKETS OF RAIN
(Bob Dylan, Blood On The Tracks, 1974)
vb: ijs

Buckets of rain
Buckets of tears
Got all them buckets comin’ out of my ears
Buckets of moonbeams in my hand
You got all the love, honey baby
I can stand
Baldes de chuva
Baldes de lágrimas
Tantos baldes saindo pela minha cara
E nas minhas mãos, baldes de luares
Você tem todo o amor, doçura
Que eu posso aturar

I been meek
And hard like an oak
I seen pretty people disappear like smoke
Friends will arrive, friends will disappear
If you want me, honey baby
I’ll be here
Eu fui fraco
E duro qual carvalho
Já vi belas pessoas sumir qual fumaça
Amigos virão, amigos vão sumir
Se você me quiser, doçura
Eu estarei aqui

Like your smile
And your fingertips
Like the way that you move your lips
I like the cool way you look at me
Everything about you is bringing me
Misery
Feito seu sorriso
E as pontas dos dedos
Feito o jeito que você movimenta os quadris
Eu gosto do jeito que você olha pra mim
Tudo em você já me deixa triste
Assim

Little red wagon
Little red bike
I ain’t no monkey but I know what I like
I like the way you love me strong and slow
I’m takin’ you with me, honey baby
When I go
Vagãozinho rubro
Bicicleta rubra
Não sou nenhum macaco mas sei da doçura
Eu gosto do jeito que você me ama forte e lenta
Vou te levar comigo, doçura
Quando for a hora certa

Life is sad
Life is a bust
All ya can do is do what you must
You do what you must do and ya do it well
I’ll do it for you, honey baby
Can’t you tell?
A vida é triste
A vida é um rolo
Cheia de deveres e não tem consolo
Faça o que precisa e faça isso muito bem
Posso fazer por você, doçura
Já não deu pra perceber?

_________________________________

quinta-feira, agosto 22, 2013

SIM, LEMINSKI:

*
sim leminski

o graffiti
é o limite

não tem poeta
que não imite

não tem selva
que não acre
dite

na página concreta
da cidade perversa

quem não tem mal
que evite

quem não tem pau
que apite

quem não tem sal
que edite

ijs

______________

sábado, julho 27, 2013

HORIZONTAL NA VERTICAL

Fermento
zen
sem
bemol
solta
a
valer
asa
e
vela
num
parto:

momento
em
que
o
sol
volta
a
bater
na
janela
do
quarto.

ijs

sábado, julho 20, 2013

PARA FAENA FIGUEIREDO ROSSILHO

Você reclama dos meus silêncios
Enquanto tiro o pranto pro canto;
Não pense nesses preços: pense-os
Feito feitiço pedindo encanto
Enquanto o planeta se revolta
Acelerando – só acelerando,
Só planejando uma grande volta
Quando ninguém mais está esperando.

IJS

quarta-feira, julho 10, 2013

A HARD RAIN'S A-GONNA FALL



UMA DURA CHUVA QUE VAI CAIR
Bob Dylan

Ah, onde você esteve, meu filho de olhar azul?

Ah, onde você esteve, minha pequena aqui do sul?
Eu tropecei nas neblinas de doze montanhas
Eu andei – rastejei – seis estradas estranhas
Pisei pelo meio de sete florestas tristes
Estive em frente a uma dúzia de oceanos mortos
Estive por dez mil milhas na boca das covas
E é uma dura, e é uma dura, é uma dura, é uma dura
E é uma dura chuva que vai cair

Ah, o que você viu, meu filho de olhar azul?

Ah, o que você viu, minha pequena aqui do sul?
Vi um recém-nascido com os lobos selvagens
Vi uma estrada de diamantes sem carros que passem
Vi uma árvore negra com sangue pingando
Vi uma sala com homens, seus martelos sangravam
Vi uma escada branca coberta de água
Vi dez mil oradores, línguas todas quebradas
Vi armas e espadas afiadas nas mãos de crianças
E é uma dura, e é uma dura, é uma dura, é uma dura
E é uma dura chuva que vai cair

E o que você ouviu, meu filho de olhar azul?

E o que você ouviu, minha pequena aqui do sul?
Ouvi o som de um trovão que rugia um alerta
Ouvi o rugido de uma onda que afogaria o mundo todo
Ouvi cem bateristas, suas mãos estavam em chamas
Ouvi dez mil sussurrando e ninguém escutando
Ouvi um morto de fome e escutei muitos rindo
Ouvi a canção de um poeta que morreu na sarjeta
Ouvi o som de um palhaço que gritou no beco
E é uma dura, e é uma dura, é uma dura, é uma dura
E é uma dura chuva que vai cair

E quem você cruzou, meu filho de olhar azul?

Quem você cruzou, minha pequena aqui do sul?
Cruzei uma criancinha com seu pônei morto
Cruzei um branco levando um cão preto a passeio
Cruzei uma mulher jovem, seu corpo queimava
Cruzei uma menininha, ela me deu um arco-íris
Cruzei um homem que estava ferido de amor
Cruzei outro homem que estava ferido de ódio
E é uma dura, e é uma dura, é uma dura, é uma dura
E é uma dura chuva que vai cair

Ah, o que fazer agora, meu filho de olhar azul?

Ah, o que fazer agora, minha pequena aqui do sul?
Eu vou voltar antes que esta chuva dura desabe
Eu vou a pé às profundezas da floresta negra
Onde as pessoas são muitas, suas mãos tão vazias
Onde as pastilhas de veneno já inundam suas águas
Onde a casa no vale atola na prisão imunda
Onde o rosto do agente é sempre bem escondido
Onde a fome é mais feia e as almas se esquecem
Onde preto é a cor e nenhum é o número
E eu vou dizer e pensar e falar respirando
E refletir das montanhas pra toda alma enxergar
E vou andar pelo mar até que as pernas afundem
Mas saberei minha canção antes de começá-la
E é uma dura, e é uma dura, é uma dura, é uma dura
E é uma dura chuva que vai cair

versão brasileira:

Ivan Justen Santana





terça-feira, junho 18, 2013

QUEM LIDERARIA OS ANTILÍDERES?

nenhum sociólogo
nenhuma cientista política
nem qualquer comentarista pontual
demonstram entender
que porra está acontecendo
exatamente porque não sabem
o que é um movimento anárquico --
a política deles está em conceitos
de esquerda ou direita
e só entendem de fracasso
ou de sucesso
-- pouca gente nota
que nosso mote positivista
carrega os opostos:
caos e regresso--

quinta-feira, junho 06, 2013

Depois do depois de

Depois de garimpar [já tinha feito isso na "vida real"] na rede isso aqui [traduções feitas por Leminski publicadas na revista Remate de Males, da Unicamp], resolvo transcrever um dos poemas, porque deslizaram na transcrição e não respeitaram um "enjambement" [quando um verso continua no outro] -- é uma tradução de um soneto enigmático do italiano Antonio Malatesti (1610-1672), da centúria de sonetos La Sfinge, publicada originalmente em Florença, em 1643. Teorias sobre o significado do poema serão muito bem-vindas nos comentários...


eu vi em terra um homem fazer dona
depois de uma tela ter por terra
e de mostrar, por homem, a terra
sob terra tela e sobre terra dona

não era mais que sombra enfim a dona
mais que sombra e que tela enfim a terra
quem vive de sombra e tela na terra
é quem fazia em tela sombra à dona

tal força com sombras tinha este homem
que transformava dona, terra e tela
no loiro metal que contenta ao homem

quero ver se é possível que uma tela
intrincada, destrinchar saiba um homem
que diga quem a dona, a terra, a tela


Malatesti vertido por Leminski
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segunda-feira, junho 03, 2013

A FASE & AS FRASES

de ijs a ffr:

A fase é difícil, como sempre foi e foram de outro modo as outras fases, e as frases demoram ou às vezes nem saem para ver o clima que está fazendo. A poesia engata nos interstícios, dissolve-se nos interlúdios, ou fica com aquela cara do que podia ter sido, porque a fase é difícil, e as frases ainda não se recuperaram das dores de garganta, mas até que às vezes um verso volta a insistir em ser feito. De seu lado, a prosa até que funciona, mas as frases se enrolam ou não se desenrolam, o que se diz e o que deveria ter sido dito às vezes até coincide, mas a fase é... Pois é: talvez nem assim tão difícil, mas é estimulante também só para ver se o ânimo mais singelo volta e completa o que ficou por ser explicado, ou estabelecido, ou só existe sem muitas questões a respeito. E os versos querem ser escritos, mas... Mas vão ter que sair assim mesmo:


Nem o problema da física mais complexa,
nem outra dificuldade insuperável já transposta,
nada resolve uma proposta ainda não proposta,
nenhuma ação ou liberdade ou coisa mais desconvexa:

tudo isso só seria uma mera enrolação
se não fosse mais que importante pra ti e pra mim, assim:
a diferença entre os nãos que só querem ser não
e a palavra simples que nos dizemos um ao outro: sim.

...

sexta-feira, maio 24, 2013

TARA MELA

*
TARA MELA
INSIRA CURA
TINTA CLAQUE
ATAQUE DURA

OGRO MALA
EM MERDA LIRA
TANTO BOTE
A TOQUE FIRA

FRÁGUA GULA
ENCERA FALA
TONTA CIFRA
ATÉ QUE NÃO

ijs

quarta-feira, maio 08, 2013

NÃO BANKSY O LEMINSKI

*
NÃO BANKSY O LEMINSKI

FATURE O FUTURO ASSIM QUE

O TERROR OSSO RISO E AFLORA

E AGORA QUEM NÃO EMBOLORA?

QUEM É QUE TE MATA NO PEITO?

SINCERO SEM SER O AMOR DOMO SUSPEITO?

QUEM PIXO? QUAL DESPACHO? QUANDO?

CAMINHOS PELOS CABELOS: VOANDO

SOU MAIS O PIXO DO QUE O LIXO DO CONSUMO

SUMA DO FISCO E FIQUE COM O SUMO


ijs

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quarta-feira, abril 17, 2013

CADA MANÉ (COM SUA FÉ)


palpite
o grafite
é o limite

p.leminski

cada mané
com sua fé

cada maria
com sua mania

cada josé
com seu pelé

cada joanete
com sua elisabete

cada centavo
com seu escravo

cada arbusto
com seu augusto

cada pateta
com seu poeta

cada poeta vagau
com sua treta sacal

cada gata
com sua pata

cada cara pálida
com sua tara esquálida

cada corno manso
com sua dor no ganso

cada cinema
com seu poema

cada fraldinha
com sua maminha

cada fervo
com seu frevo

cada consulta
com sua jurisconsulta

cada pato
com seu sapato

cada extrato
com seu abstrato

cada pacto
com seu compacto

cada cabeça besta
com sua sentença funesta

cada crítico
com seu diacrítico

cada crítico raquítico
com seu tríptico sifilítico

cada paga pau
com seu não apaga nem a pau

cada cova rasa
com sua escova da nasa

cada arte de rua
com sua parte de sua

cada porte de arma
com seu capote de alma

cada sol
com seu lençol

cada gógol
com seu google

cada bacilo
com seu vacilo

cada pinote
com seu vinhote

cada velha seita
com sua cela estreita

cada cela estreita
com sua tela suspeita

cada celacanto provoca maremoto
com seu acalanto sem controle remoto


IJS (com parceria de FFR)

...

terça-feira, abril 09, 2013

Mais Byron, logo antes do arremate do Canto I do Childe Harold's Pilgrimage


PARA INEZ

                   1.
Não, não sorrias a meu cenho,
    Que eu já sorrir posso mais não:
E os Céus evitem que tu venhas
    Chorar alegremente em vão.

                   2.
Perguntas qual secreta dor
    Suporto sobre a Juventude?
E queres, vã, saber sabor
    De ardor que tu curar não podes?

                   3.
Não é o amor, tampouco é o ódio,
    Ou parcas honras de Ambição,
Que deixam podre este meu pódio,
    E me dispersam na amplidão:

                   4.
É o tal cansaço que desponta
    De todos que já ouvi e já vi:
A Beleza me desaponta;
    Teus olhos são sem charme a mim.

                   5.
É o tal eterno tédio fundo
    Que o Judeu Errante aturava;
Que nada vê a não ser a tumba,
    Mas vive agitação escrava.

                   6.
Que Exílio de si mesmo existe?
    A Zonas mais e mais remotas,
E inda assim me persegue o chiste –
    Na Mente o Demo toma notas.

                   7.
Mas outros parecem gozar,
    Saboreando o que larguei;
Ah, possam inda assim sonhar
    Sem acordar como acordei!

                   8.
Por tantos climas vai meu fado,
    Com tantas maldições e dores,
Que meu alívio é este ditado:
    “Venha o que vier, já estive em piores.”

                   9.
Mas quais piores? Nem perguntes –
    Por piedade aqui te abstenhas:
Sorria – as peças jamais juntes
    Do peito humano: Inferno e brenhas.


versão brasileira: Ivan Justen Santana

quinta-feira, abril 04, 2013

O MACHISTE & A EFEMINISTA

I

Era um sonho num consultório dentário,
Dantesco, extravagau, alucinário:

Numa poltrona não namoradeira,
A Efeminista aguardava, à beira

De um ataque de nervos, a sua vez;
O Machiste, também dali velho freguês,

Folheava uma revista fiu-fiu-menina,
Em busca de consolo a sua triste sina.

Entreolhavam-se, de instante a instante,
Amor de fábula, muito inconstante,

Enquanto lá dentro, sentada na cadeira
Quase elétrica do dentista, uma confreira

Submetia-se a um tratamento de canal:
Esperemos que a história não acabe mal.

II

Ninguém suspeitava que o dentista
Era uma orangotanga sofrendo da vista.


ijs

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CHOCOLATES SÃO PRESENTES

*
Chocolates são presentes
mais amargos quando são
envolvidos inocente-
mente em temas sem questão.

Mas a Páscoa já passou---
sexta-feira foi Paixão:
ou nos tomam por mim ou
não sei mais pronome não.

ijs

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terça-feira, março 26, 2013

NOSSOS SÍMBOLOS & EU

*

Nossa terra tem pinheiro: araucária;
Nossa araucária tem gralha: azul;
Miseravelmente interplanetária:
Sorriso se orientando para o Sul.

Nosso poeta – araucária – é polaco;
Nosso contista – gralha –, vampiro;
Não seja eu gralha mas só um Ivan-piro:
Em vão poeta sem curro nem paco.

ijs

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