segunda-feira, dezembro 27, 2010

TREVOS DE MORTE, AMOR & LEI

Haverá vida após a morte?
Haverá morte após amar-te?
Haverá amor após a lei?

Sim, haverá, e enquanto houver
Eu a verei e ela os verá
E amor também. Ouvi-los-ei

E haver-vos-eis e me ouvirás
Ver-te mulher conforme a Dama
Que o ouviu e assim reouve-a o Rei.

*

terça-feira, dezembro 21, 2010

EXTRA, EXTRA! COYOTES INVADEM CWB

Matilha promete ocupar Brooklyn Coffee Shop:
"Santos lambrequins, é o eterno retorno dos poetas curitibanos!"

CURITIBA / URGENTE: Parem as máquinas de café! Nesta quarta-feira (22), às 18h, Mario Domingues e Ivan Justen Santana lançam no Brooklyn Coffee Shop (Trajano Reis, 389 - tel. 3618-0388) o número 21 da revista Coyote, à qual ambos os poetas contribuíram com a expressiva marca de 20 poemas (11 de Mario e 9 de Ivan). Cada exemplar será vendido a módicos 10 reais (eu disse: dez reais! Quem não chegar cedo vai ficar sem revista, e não digam que eu não avisei...).

Também será lançado (e relançado) o segundo livro de poemas de Mario Domingues: Musga (Primeiro de Maio-PR: Mirabilia/ ALL / FCC, 2010). Musga vai ser entregue mediante irrisórios 20 reais (estou avisando: vinte reais! Quem demorar vai ficar a ver versinhos no Natal...).

Seguem-se aqui imagens da Coyote 21 e de Mario e de Ivan (para os arquivos do departamento secreto de polícia antiartística) -- esses meliantes são perigosos e estão armados de metáforas até os dentes!



Mário Domingues, perpetrando poesia.


Ivan Justen Santana, ocultando-se em Floripa.

terça-feira, dezembro 14, 2010

PRA NÃO DIZEREM QUE NUNCA TENTEI MATAR MEUS PAIS

Tá bom, eu admito. Eu já tentei matar o Paulo Leminski. Só que ele já tinha morrido antes disso. Mas quando eu li Distraídos Venceremos, em fins de 1990, pro meu primeiro vestibular, se o Leminski ainda estivesse vivo e eu trombasse com ele na Quinze, possivelmente eu cometeria, no máximo do mínimo, umas duas ou três tentativas de homicídio.

A propósito, nunca foi e nem será preciso matar o Dalton Trevisan. Além de ele não ser exatamente um poeta, já é um morto-vivo, um nosferatu. Mas pra alegria dessa gente que adora ver sangue, confesso: se Dalton estivesse vivo de verdade, ontem eu talvez o matasse ou, no mínimo do máximo, tentasse executá-lo, ouvindo um som no talo.

Helena Kolody transcende tais questões, já que ninguéns aqui a não ser poetas e poetisas sabem que ela não morreu, nem nunca morrerá. Mas às gentes carniceiras que porventura saibam quem é Helena, por mais improvável que seja ou haja tal combinação de gente, licenciaria que me vissem dilacerando-a, verso por verso jazendo esquartejado num papel branquíssimo de tão transparente.

Já o Marcos Prado eu tive várias chances de matar. Acaba de acabar aqui minha última chance, já que mencionei novamente o nome dele.

E Thadeu Wojciechowski bem que poderia ser minha próxima vítima, porém nunca será, pois não matarei ninguém antes dele, que nunca será tampouco o último da lista. Além disso, apesar de ser um coxa-branca, Thadeu é meu amigo, e assassinato é o tipo do favor que não presta fazer nem ao pior nem ao melhor dos nossos amigos.

Voltemos a falar do Leminski, epítome de todos os que alguns adorariam que eu quisesse matar. Imagino, por exemplo, o que Leminski pensaria de Bocágil, pseudônimo da (ou das) criatura(s) que me mataram (ou quiseram me matar: dá quase na mesma, não é, gentarada?). Talvez o polaco me parabenizasse, nessa ocasião, por eu então ter me tornado um I-Juca-Pirama, ou seja: "aquele que é digno de ser morto".

Leminski certamente agradeceria também ao Rodrigo Madeira, pelo poema em que este confessa ter assassinado aquele: simbolicamente, não há honra maior que matar o maior poeta da geração anterior. Ou há?

Em verdade mentirosa (ou em mentira verdadeira), eu vos digo que há. E digo, outrossim, que eu me considero digno de tais honrarias ainda maiores. Porque se agora eu quero que não digam que nunca tentei matar meus pais, também gostaria que percebessem que não vou matá-los.

Sim: não matarei Emiliano Perneta. Nem Dario Vellozo. Nem Tasso da Silveira. Nem Jamil Snege. Nem Wilson Bueno. Nem os(as) que não li ou que esqueci (por meu desacerto).

Sim: tampouco matarei os vivos e as vivas. Alice Ruiz, durma tranquila. Estrela, idem. Fernando Koproski, Alexandre França, Amarildo Anzolin, Mario Domingues, Jaques Brand, Adriano Smaniotto, Batista de Pilar, Marcelo Sandmann, Luiz Felipe Leprevost, Marilia Kubota, William Teca, Luci Collin, Ricardo Pozzo, Bárbara Lia, Rodolfo Jaruga, Monica Berger, Edson Falcão, Paulo Bearzotti, os Ricardos (o Carvalho e o Corona), os Rodrigos (o já citado Madeira e o Garcia Lopes), enfim, todos vocês que sabem que são poetas, mesmo os mais novinhos e ingênuos (como não é bem o caso do Rafael Walter, e nem era o do Cláudio Bettega), mesmo as aparentemente mais "naïves", como as Lucianas (a Cañete e a do Rocio Mallon), todos e todas que ao não mencionar aqui machucarei (ou não): no que depender de mim, vocês podem descansar em paz, vivos e vivas!

Pois no fundo é muita estupidez precisar matar (ou tão somente anular) qualquer poeta, vivo ou morto, fraco, forte, vitaminado ou meia-boca. E no fundo mesmo, as coisas não são assim. Angústias da influência pertencem aos mais específica e autocondenadamente críticos. E até o Fernando Pessoa acabou se transformando num bando de idiotas da subjetividade, que preferiram não casar e não viver, pra poderem ensaiar e escrever obras imortais.

Contudo, como bem viu e melhor poetou Leminski, é mais tesão viver bem e "quase-feliz" do que querer tentar (ou até ser) Homero, Dante, Shakespeare, quer sendo uma pobre Dickinson abilolada em casa, uma Plath devastada pedindo água morna, ou um Baudelaire sifilítico tentando loucamente dar um beijo nos anjos rebelados.

Já Vladímir Maiakóvski poetou imorredouramente, e foi suicidado (sua última frase: "não atirem, camaradas!"). E, gigante dos gigantes, James Joyce padeceu vítima de glaucomas, hérnias perfuradas, desastres de família, duas guerras mundiais e um dia treze azarado.

Enfim, por tudo isso, eu posso até morrer, mas não matarei, e nem sequer matar-me-ei. Por mais que esperem que eu supere a geração anterior por meio da força bruta e (ou) da desconstrução e (ou) da desleitura e (ou) do ciúme atemporal tornado complexo de castração, e apesar de admitir que já tentei esses caminhos e fracassei, a partir de aqui e agora tudo que declaro e declararei resumir-se-á simplesmente (conforme tenho agido, para horror dos "incompreendedores" a supor a vida menos importante que a poesia), retomando: resumir-se-á numa palavrinha genial de tão desarmadora:

sim.
*


Sim, sou eu, aos 4 ou 5...

sábado, dezembro 11, 2010

DOIS LANÇAMENTOS DE HOJE

Ocorre hoje à noite o (já anunciado aqui) lançamento do livro A pau a pedra a fogo a pique: dez estudos sobre a obra de Paulo Leminski, livro organizado por Marcelo Sandmann, e que contém, entre outros textos escabrosos, aquele que eu e Caetano Galindo escrevemos sobre as relações perigosas entre Paulo Leminski e James Joyce.

Será no Espaço Cênico (Rua Paulo Graeser Sobrinho, 305), a partir das 19 horas.

A propósito, vejam (e leiam) essa nota breve aqui na Gazeta do Povo.

O outro lançamento, aqui neste humilde tugúrio-blog, é o de um poema inédito: voilà!

*
GATO PRETO, GATO PARDO E GATO BRANCO

Gato preto, gato pardo e gato branco
dispunham-se à vontade, os três se encarando.
Não me perguntem como ou quando. Afianço-lhes
que tais felinos formavam um tipo de triângulo.

– Mas é claro que esse cara gosta de gatos! –
disseram os olhos ingênuos de gato branco.
– Tá. Só que fede mais que sete cães molhados,
e fala feito um tolo, e anda igual a um manco –

disseram as pupilas rutilantes de gato preto.
Então entendi que eles se referiam a mim.
Porém gato pardo já detectava em beco estreito
o charme duma gata cujo cio não tinha fim.
*

segunda-feira, dezembro 06, 2010

REDUZINDO HEIDEGGER A PÓ

Eu sou um ser que vive de si mesmo.
No meio do sagrado tinha um pecador.
Virtude é a arte de quem ama a dor.
O porco mais triste vira torresmo.
O som que soa em mim é desafinador.
Eu não conto tempo como mingau.
Não leu que nem Thadeu, tomou um pau.
William, quase-ídolo, desvela o adorador.
Ser por ser, a mulher é que é essencial.
Sou capaz de matar qualquer um de vocês.
Somos bem melhores em quatro do que em três.
Burrice se enterra com pá de cal.
__Não há poesia pra filosofia vã.
__Aqui jazem Bruno, William, Thadeu e Ivan.

Antonio Thadeu Wojciechowski
Bruno Sanroman
Ivan Justen Santana
William Crosué de Oliveira Teca


Martin Heidegger em 1960. Fonte: http://www.martin-heidegger.net/

quarta-feira, dezembro 01, 2010

MOTIVO DE OTIMISMO EM DEZEMBRO DE DOIS MIL E DEZ

Diante das catástrofes e guerras
Que nunca param de recomeçar,
Da sujeirada em cidades e em serras,
Vulcões lavando a terra, o céu e o mar,
Existe ao menos uma razão quântica
(Que talvez não convença na semântica)
Pra sermos pessimistas ao revés:
À parte os traumas deste mundo em crise
Que não tem analista que analise,
A década de zero acaba em dez.
*

terça-feira, novembro 30, 2010

CANÇÃO DE REDENÇÃO

– Uns pirata, é, os véio roubou eu,
Vendeu eu pros navio mercante
Logo depois que eles tirou eu
Do poço que num tem fundo
Mas minha mão foi feita forte
Pela mão do Todopoderoso
Nessa geração a gente avança
Triunfantemente

Vocês não ajudariam a cantar
Estas canções de liberdade?
Pois só o que jamais me falta
São canções de redenção

Emancipem-se da escravidão mental
Só nós mesmos libertaremos nossas mentes
Não tenham medo da energia atômica
Pois nenhum deles pode parar o tempo
Prosseguirão matando nossos profetas
Enquanto ficamos de lado, assistindo?
Alguns dizem: é só parte da coisa,
Temos que cumprir o Livro

Mas você não ajudaria a cantar
Esta canção de liberdade?
Pois só o que jamais me falta
É esta canção de redenção



Bob Marley (Redemption Song)
Versão brasileira: Ivan Justen Santana,
atendendo um pedido do grande Soruda San


sexta-feira, novembro 26, 2010

Um comunicado e quatro links fora de série...

Neste fim de semana,
no Domingo (28/11), às 16h,
pretendo comparecer à Pedreira Paulo Leminski,
e levarei meu arco&flecha
(ou seja: meu violãozinho)
desencordoado.

Para maiores informações, visitem estes links:

http://mordidaoficial.wordpress.com/2010/11/24/movimento-dos-sem-palco/

http://mordidaoficial.wordpress.com/2010/11/23/ode-ao-silencio/
(este é o melhor!)

http://www.gazetadopovo.com.br/blog/sobretudo/?id=1070677

***

Aproveito pra propagandear mais uma maravilha,
a Revista Errática -- clicai e não vos arrependereis!

segunda-feira, novembro 22, 2010

Aguardem mais um lançamento...



Enquanto isso, curtam mais uma brilhante foto de Ricardo Pozzo, e não se esqueçam de visitar o blog PÓ&TEIAS.

Reitoria da UFPR, em Curitiba.

terça-feira, novembro 16, 2010

Para as caravanas ladrarem...


Eu e um grande camarada, o poeta e tradutor curitibano Mario Domingues, agregamo-nos à matilha da revista Coyote, editada pelos chapas de Londrina: Rodrigo Garcia Lopes, Ademir Assunção e Marcos Losnak.
Para pedir a revista aos distribuidores, clique aqui.
Para mais informações sobre o número 21 da Coyote, clique aqui.
Para ler todas as postagens deste blog que mencionam Londrina, clique aqui
(ou aprenda a usar o campo de busca do Blogger, bem aí no canto superior esquerdo...).

sábado, novembro 13, 2010

PRIMEIRO AUGÚRIO DE INOCÊNCIA COM ÚLTIMA RECEITA DE EXPERIÊNCIA

(sobre texto original de William Blake)

MODO DE PREPARO:

Pego de jeito uma quadrinha inglesa.
Dispo-lhe as formas, ritmo e substrato.
Remodelando a língua da freguesa,
Mostro pra essa beleza como a trato.



INGREDIENTES:

To see a world in a grain of sand
And a heaven in a wild flower,
Hold infinity in the palm of your hand
And eternity in an hour.


VOILÀ:

Notar um mundo na areia de um grão
E um paraíso numa flor do mato:
Ter o infinito na palma da mão
E a eternidade num minuto exato.


*

sábado, novembro 06, 2010

ARQUITETURA DA DESCONSFRUIÇÃO

*
Era fumaça em gelo seco
Onda de magma – rocha em lava
Quanto mais oculta no beco
Mais revelava

Duma pelugem colorida
Ou fofa nuvem branca e preta
A retina não consolida
Nem interpreta

Proibido fruto – vinha da ira
Quer fosse só a mira da vinha
Ir e vir viram vira-vira
E assim convinha

Se as suas luzes vissem dar
Hostes aureoladas em horda
São abstrações que o paladar
Morda e remorda

Enfim festim vamos manter na
Fusa – confusa sala russa
E a face à mostra que ela alterna
Nua debruça
*


*imagem incidental: escultura de
Max Bill, "Unidade Tripartida", 1949

segunda-feira, novembro 01, 2010

Aquela esquina não quebrava em linha reta

*
Aquela esquina não quebrava em linha reta.
Sonhei-me ontem à noite escrevendo isso assim
E não, talvez não fosse um isso escrito assim
Num ritmo alexandrinamente anacorético,
Diurético, dispéptico, sinapsilírico,
Simétrico e obstétrico ou somente tétrico,
Sem absorventes íntimos que antipetendam
Seus fluxos sanguíneos de línguas, mínguas, ínguas,
Salivações intensas, perdigotos não-
-Intencionais e os outros mais quetais finais.
Não era nada disso. Tinha nem sumiço.
Nenhuma vez. Esquecida assim que incompleta.
Termina onde começa e se repete nisso.
Aquela esquina não quebrava em linha reta.

*

sexta-feira, outubro 15, 2010

DIÁLOGO SOBRE A RAZÃO E A EMOÇÃO

[poema inédito de Ivan Justen Santana
e Rodolfo Brandão de Proença Jaruga --
em 27/03/2010, este poema foi apresentado ao público
no Paço da Liberdade / SESC Paraná,
durante o Café, Leite Quente e Poesia,
evento organizado sob a curadoria de Élisson de Souza e Silva]

___________________
vazio agudo
ando meio
cheio de tudo
p.leminski
___________________________
O intelecto é o espelho do vazio
O coração herdou a coisa efêmera
Bruno Tolentino
__________________________

OS POETAS RECORDAM ESSES VERSOS DE PAULO LEMINSKI E BRUNO TOLENTINO, E CONVERSAM

RODOLFO
Se é assim, se os olhos da razão
só vêem falsos vultos na penumbra
ou sombras num espelho impetuoso
que nos revela a cada instante o nada,
o mar vazio em que se agita em vão
o nosso peito ardente, a nossa dor
mais ancestral de ser e já não ser,
se é assim, eu me pergunto então,
que metro mede o mundo, mede o homem?
Os gritos comovidos com a vida
ou a despótica razão regrada?

IVAN
Nem gritos comovidos nem razão
– seja despótica, seja regrada –
são metros pra medir homem ou mundo,
ao menos não só os gritos e as razões.
Os nossos metros são nossas palavras,
infinitas às nossas vidas breves,
mas breves ao vazio do infinito.
Se o homem viu o mundo e disse: é azul!,
nosso azimute é microvibração,
nossas razões, regras e metros são
pequenos demais. E assim se quebram.

RODOLFO
Talvez sejam palavras nosso metro.
Ou não. Talvez não são senão o chão,
o solo, o fundamento da existência,
o denso sedimento do passado,
o resto do que outrora fora rosto.
Tal como uma araucária se levanta
e estende os braços nus à luz do sol,
mas com raízes garras entre o barro,
talvez assim o ser humano seja;
talvez agarre o seu vazio ao verbo
e busque pelos bosques do instantâneo
a luz, a plenitude do sentido.
Talvez não seja busca, seja fuga.
Porém, há sempre esse caminho ambíguo
de rio que flui sem margens pelo abismo,
sem norte certo que não seja ser.
Ou não?

IVAN
_______Ou sim – enfim: não ser ou ser –
mesmo invertendo, interrompendo o rio
que você vê fluindo pelo abismo,
é impossível escapar desse “ou não”.
Mas seus talvezes já viram certezas:
vamos tentar ser mais certeiros, sim?
Pois sim, o ser humano é uma araucária,
e as palavras são, também, chão e resto:
não custa reafirmarmos fundamentos.
Mas que mais? Além disso, só o silêncio?
O choro da Energia abandonada,
a dor da Força desaproveitada,
o rudimentarismo do Desejo
expostos por esta angústia de Augusto
dos Anjos?

RODOLFO
_________Sim, silêncio entre soluços.
É disso que se faz o labirinto
em que rasteja o ser que sente e pensa.
Silêncio entre soluços, nada mais.

IVAN
Nada mais, não! Tem mais tudo no nada,
tem outras travessias (tricks and treats!),
nos trinques tem truques, tratos e extratos,
tem nonadas, tem até dodecuplicadas!,
que as trucadas não acabam nem quando
terminam. Se Leminski na razão
viu paradoxo triplo – vaziomeiocheio –
e Bruno, Tolentino e tautológico,
viu o vazio espelhando o intelecto,
eu digo que há lá mais atrás do espelho,
através deste cheiovaziomeio
há mais sim que neste texto de e-mail...
Driblemos os depressivos gambitos!
Sacrifiquemos com sempreverboímpeto
até mais ver, mais além, muito mais
mais pra lá que quaisqueres infinitos!...

RODOLFO
Pois sim, há sempre um nada além de tudo.
A cada instante o ser que eu sou desfaz-se
e a cada instância inovo a minha face,
enfrento um velho espelho de absurdos.
E nada ou pouco vale o grito surdo
de um peito emocionado ou a sintaxe
de uma razão aflita, mas capaz.
Além de mim, eu sei, o mundo é mudo.
A razão é um poder que a língua exerce
sobre mim, é uma força que me cria.
A emoção é um poder que se irradia
desde mim, são as falhas do alicerce.
Porém, nem a razão nem a emoção
é o que permite, e exige, a criação.

IVAN
Mas não, não é uma falha do alicerce
a força emocional que move o mundo
e as estrelas. Ela, amor – ou qual quer que se
chame este raio a romper o rotundo
vácuo do saber voltado a si: vértice
se achando círculo – nos mostra que um do
outro dependemos. Por mais que quebrem-se
(e aqui se quebram também forma e fundo)
sintaxes, razões, eixos axiomáticos,
tais tentativas subsumem-se a um sim.
Àquele sim fundamental dos práticos,
a esse sim que nos cala e nos diz sim.
Sem sim, metas e teses, em metástase,
sobram simplesmente sem rima sim.

RODOLFO
Talvez o sim dos sábios, esse sim,
princípio feminino do ocidente,
que escapa aos moles lábios mulheris,
decerto lábios dóceis, porém hábeis,
o sim que traz em si o sêmen da razão
e por que não da emoção também,
o duplo e dúbio e amoroso sim
talvez sucumba mudo e genuflexo
ante o sentido, origem do divino,
e dos humanos o mais alvo fim.

IVAN
Protesto viva e veementemente!
Não venha travestir sim de dublê
e os duplos fiquem lá com Dostoiévski!
Um sim nunca sucumbe genuflexo:
sim sem mudez transcende qualquer sexo!
Pois sim não fica à frente do sentido:
sim é sempre assim o próprio sentido!

RODOLFO
Neste momento da conversa, Ivan,
eu me pergunto qual imagem
nos revelar iria a antinomia
que nós mal começamos a tanger.
Que imagem nos seria a bela síntese
desses conceitos, frouxos pelo tempo?

O pensamento criativo, eu creio,
não é senão o esforço sem sentido
que uma razão emocionada faz
para alcançar as lindes do sentido.
E o sim, que é síntese do verbo,
é só o princípio dessa caminhada
em precipício, nunca é o fim.
Perseguir o sentido é dar sentido
à vida. E o pensamento quando vivo,
tenso, emocionado e racional,
ele tende, ao render-se, a se fazer,
a transformar-se em simples poesia.
E a palavra vai a par do pensamento,
e o destino de uma língua é um poema.

Razão e emoção são condições
do denso pensamento ocidental.
E a imagem que me vem aos olhos
é a de um rochedo negro e impassível
ungido por um mar impetuoso.
As altas ondas de um azul marinho
explodem brancas contra a pedra escura,
carícias de cristal em pele rude,
e as aves, riscos negros espirais,
voam alvoroçadas em alarde,
e o céu parece recurvar-se à cena,
acinzentado, atento ao drama, grave.

E este poeta então entende tudo,
entende que a pesar do enfrentamento,
de todas as contradições ingênuas,
da aflição, das feridas e das dores,
que a pesar do passado em cicatrizes
e de todas as incompreensões,
é tudo um baile a desvelar aos olhos
a beleza de instâncias da existência,
fragmentos do real que se reúnem
sob o auspício arbitrário do sentido.

IVAN
Rodolfo: já respondo a questão-síntese,
mas, antes, tolere aqui que eu me queixe
ao Élisson, o maior responsável
por escolher o tema deste diálogo.
Tentarei ser, conforme o nome: Justen.
Cito Élisson, no e-mail de convite,
diz: “Dentro das temáticas propostas,
e após ler alguns escritos seus,
gostaria de convidar vocês
[sim!] para que declamem poesias
na temática razão x emoção.”
Confesso: quando li isso, pensei:
“Falar em razões e emoções é coisa
daquela cançãozinha do NX
Zero”... Zero foi quanto eu mereci
por pensar assim, tão chão, tão mesquinho.
E o Élisson, destaque-se, escolheu
com base em leituras que fez de nós.
Então, com o tema temos nossa vez
e conforme você versou, Rodolfo,
eis que “mal começamos a tanger
a antinomia”. Que imagem seria
“a bela síntese desses conceitos”?
Entre razões e emoções, qual saída?
É, sim, fazer valer a pena ser
poeta, e escutar de volta a chave
na fechadura da porta. Moramos
na Rua Real Grandeza, sim, cito
agora MACALÉ, Jards. Abram, vejam:
jatos de sangue! Abram, voltem, vejam:
espetáculos de beleza!...

Não penso em dar um corte, nem embromo:
sei com Jards que vale a pena ser poeta,
e isso sei também com você, Rodolfo,
com Waly Salomão, com Tolentino,
com quantos, quantas, poetas aqui!
Você, Rodolfo, e todos nós sabemos:
“apesar das contradições ingênuas,”
você versou tão bem que eu cito mais:
“fragmentos do real que se reúnem”
“e este poeta então entende tudo”
“e o destino de uma língua é um poema”!
O destino de uma língua é um poema:
– isso foi sim muito bem dito mesmo,
pois início, meio e fim são poesia
e assim todas questões são respondidas!

***

sexta-feira, outubro 08, 2010

CLÁUDIO BETTEGA (1971-2010)

A notícia do falecimento veio ontem, mas de um jeito que eu nem compreendi direito.

Só agora confirmei e comecei a tentar assimilar essa saída de cena do Cláudio...

Deixo um tributo, a exemplo do que já fizeram Rafael Walter, Ricardo Pozzo, Barbara Kirchner e Luiz Felipe Leprevost.

Sinal de que para nós, amigos e colegas de arte e de vida, pelo menos poeticamente o Cláudio Bettega vai continuar vivo.



Movimento:
parte do
meu eu,
em distopia,
avança pelo
tempo,
numa sinfonia
de ar e euforia,
perdido
enfrentamento
que me faz
amar e sentir o
vento a todo
momento.

Cláudio Bettega
*

quinta-feira, outubro 07, 2010

PRIMEIRA CARTILHA DE CURITIBANICE APLICADA

1

Fale como se escreve.
Escreva como se pensa.
Pense como se falasse.

Silencie a um silvo breve.


2

Sorria como se fecham os olhos.
Feche os olhos como se tapam os ouvidos.
Tape os ouvidos como se sorri.

Sim: você nunca esteve nem aqui.
Não: não se troca o E final pelo I.


3

Eu nem te ligo. Eu é um lugar que não existe.
Tu também. Este teu tu inexiste até que triste.
Ele ou ela pouco importa. Casamento atrás da porta.

Nós somos sós enquanto não somos um S. O. S.
Vós não soais na voz. O mundo vos esquece.
Eles miram. Elas passam. Todos saem de moda.

Intervalo comercial: o mundo gira e a lusitana roda.

*

segunda-feira, outubro 04, 2010

CLÁSSICOS PARANAENSES

Uma apresentação da literatura do Paraná, com leituras e comentários.

Orientador: Ivan Justen Santana
(Mestre em Letras pela USP)

Início: 07/10/2010

Período: Quintas-feiras à tarde, das 15h às 17h,
no Centro Paranaense Feminino de Cultura
(Visconde do Rio Branco, 1717, tel. 3232-8123).

Curso aberto a todos os interessados, gratuito
(certificado aos participantes com 80% de presença).

Carga horária: 20h
(em 10 sessões semanais de duas horas).

***

O curso Clássicos Paranaenses objetiva divulgar a literatura paranaense (desde suas origens e formação até a produção contemporânea) e assim ampliar a consciência do público leitor sobre a literatura feita no Paraná.

Compõe-se especialmente de leituras de textos selecionados, acompanhadas de comentários sobre autores e obras.

Apesar de primordialmente destinado às integrantes do Centro Paranaense Feminino de Cultura, o curso estende-se também à comunidade em geral (jovens e adultos), sendo gratuito e franqueando a todos os interessados as instalações do Centro Feminino.

O orientador, Ivan Justen Santana (Licenciado pela UFPR, Mestre pela USP), pesquisa as letras paranaenses desde 1991.

Sinopse da ementa:

(No. da sessão – Tema – Principais autores)
1 – Origens da Literatura Paranaense – Bento Cego
2 – Romantismo no Paraná – Fernando Amaro; Júlia da Costa
3 – Origens do Simbolismo – Dario Vellozo; Silveira Neto; Nestor Victor
4 – Evolução do Simbolismo – Emiliano Perneta; Andrade Muricy
5 – Pré-Modernismo x Modernismo – Emílio de Menezes; Euclides Bandeira; Sharffenberg de Quadros
6 – O Modernismo paranaense – Tasso da Silveira; Ada Macaggi; Newton Sampaio
7 – O caso Dalton Trevisan – Dalton Trevisan
8 – A síntese da poesia paranaense – Helena Kolody
9 – Pós-Modernismo – Jamil Snege; Paulo Leminski; Alice Ruiz
10 – Contemporaneidade – Cristóvão Tezza; Marcos Prado; autores atuais

quarta-feira, setembro 29, 2010

Um poema resgatado dum passado remoto...

Pratico uma ginástica de rimas
em cadências de infinitos semantemas,
reviro temas e remas, lemas e termos,
palmilho os extremos mais extremos,
percorro as passagens mais arcaicas,
os escolhos e os abrolhos ermos,
vasculho dos sinais aos climas,
dos debaixos aos em cimas,
degusto as maneiras várias, todas,
ajusto os jeitos tredos e ledos,
rejeito preitos e alaridos,
sujeito-me aos lodos, lidos, ludos,
apenas para fins e modos
de que graças a estes meus brinquedos
tu te exprimas e me imprimas
e eu te esprema e tu tremas e gemas.

sexta-feira, setembro 17, 2010

no meio

nomeio uma pedra: perda
nomeio aquele prado: pardo
nomeio o poder: podre

nomeio nossas palavras: larvas
nomeio-te a endoderme: der-me
nomeio a ingratidão, esta pantera:
pistilo

assim, do caminho – nipônico dô –
tiro o time (ti e me em que me meti),
doo (de doer) e destilo este nosso (osso)
estilo

*

quarta-feira, setembro 15, 2010

EU, O SEU QUERIDO POETA VIRTUAL...

Sim: eu,
o seu querido
(e desprezado)
poeta (Ivan) virtual,
não sou mesmo (lesmo)
(lês-mo?) um poeta de papel:
meu coração
(também não)
também não é de papel:
meu livro (se me livro)
também (idiotamente)
quando for publicado (se for)
não será feito de papel
e eu e meu livro
seremos feito o dia de hoje
feito este céu:
de onde o sol fugiu
e um vento (frio e cinzento) veio
e o dia terminou e começou
e começou (e terminou)
no meio

segunda-feira, setembro 06, 2010

Atendendo a um "pedylan" da ótima escritora, musicista e compositora Alexandra Lemos Zagonel,

eis, com vocês:
Soprando Ao Vento(Blowin' in the wind)

Quantas estradas alguém tem que trilhar
Até ser chamado de alguém?
E mais quantos mares a pomba vai cruzar
Até deitar e dormir bem?
E mais quantas vezes as bombas vão voar
Até ser banidas pra sempre?
Respostas, meus caros, soprando ao vento vão
Respostas soprando ao vento vão

Quantos anos mais as montanhas vão durar
Até deslizarem ao mar?
E mais quantos anos essa gente vai durar
Até poder se libertar?
E mais quantas vezes o homem fingirá
Que não pode ouvir nem olhar?
Respostas, meus caros, soprando ao vento vão
Respostas soprando ao vento vão

Quantas vezes mais o homem tem que olhar
Até conseguir ver o céu?
E mais quantas orelhas o homem tem que ter
Até que escute um grito seu?
E mais quantas mortes até o homem saber
Que gente demais já morreu?
Respostas, meus caros, soprando ao vento vão
Respostas soprando ao vento vão



Robert Allen Zimmerman / Bob Dylan
versão brasileira: Ivan Justen Santana

quarta-feira, setembro 01, 2010

UM CONTO DE SETE

(Sobre os sete na questão:
“Muitos sabem que são sete,
porém poucos reconhecem
ou recordam-se – quais são...?”)

Gula é gula, que a tudo engole e que a tudo engula:
“Eu também gosto quando me chamam de Glutonaria,
uma palavra maior, mais cheia de recheio e poesia...
Assim como Gula, começa com um som
que vem lá do fundo da garganta,
conforme Gulodice”, disse a Gula.

A Avareza chega e resmunga:
“Eu, pra mim, prefiro Ganância,
ou melhor, Gana.
Gasta menos letras.”

Pois é, hoje a Ganância estava espoleta:
mal ouviu a voz da gula, subiu-lhe à boca
uma ânsia análoga a nada,
e teve ganas de estrangulá-la,
ou melhor: só esganá-la...

Enquanto isso,
em proclamação universal,
a Soberba declara:
“Atenderei, se me chamarem de
Ostentação, Jactância e Ufania.
Porém Orgulho não!
Orgulho soa bom demais pro meu gosto,
parece virtude...
Outrossim,
nesse ínterim,
Vaidade também não me vai muito bem,
soa feito uma palavra pobre,
meio assim "geralzona", sabem?
Coisa de quem não compreende
todo meu luxo, requinte e sofisticação...”

Por sinal, nota-se que a Soberba
adora luxo e Luxúria,
mas esta só pensa naquilo:
“Naquilo, oras! E tem outra coisa pra pensar?”,
pergunta-se a Luxúria,
com um súbito brilho malicioso no olhar,
já imaginando
se não está perdendo alguma coisa...

Quanto à Preguiça, não está nem aqui.
Mandou dizer que dela não digam nada.

Isso deixou alguém furiosa, mas
já que tem raiva até de que a chamem de Ira
– “Só tem três letras, porra!” –
melhor é sair de perto...

Vejamos o que a Inveja anda fazendo.

Ah, olha só: a Inveja estava aqui
com a gente o tempo todo,
tão dissimulada e tão discreta que ela é,
quase ninguém percebe, né?

Ficou escondidinha,
morrendo de vontade de espiar
o que os outros andavam fazendo da vida...

Nisso, veem-se três sombras que saem de fininho.
Por fim, revela-se que eram sombras
de Mentira, Falsidade e Hipocrisia.

Elas tentavam não chamar atenção demais,
receando que alguém tivesse a ideia
de pegá-las pra pecados capitais...

terça-feira, agosto 24, 2010

FELIZ DIA DO TIO LEMA PRA VOCÊ TAMBÉM

(ou POR QUE NUNCA FIZERAM UM ACRÓSTICO AO LEMINSKI?)

por pior ou melhor
mais ou menos que
quente
eu requente
rerrequente
ou rerrerrequente

levou sessenta e seis anos
até que
talveliz
ficasse pronta
essa sopa rala
instantaneamente

quinta-feira, agosto 12, 2010

Finalmente uma loucura absolutely begins:

Eis pois volvendo ao velho estilo inglês
Revelo à vera um verso sempre jovem:
Rimas as quais já enjoaram joões vocês
São estas quetais e outra vez comovem.
Se vespas vivem mais, menos um mês,
Fica um ou no ou, e ou mais as chuvas chovem.
Enxovalhantementissimanão:
A gosto do freguês francês e todas vão.

For um quisto de Keats, paira em pira de Byron,
Achei Shelley e soube que Blake na urna de Burns
Se fez de Ossian entre os todos e tantos Ossians:
Porém do pomar dos românticos só sobraram romãs.

sexta-feira, agosto 06, 2010

Ontem à noite. Sem sorvete.

Sonhei um sonho sonhado por um sonhador onírico:

cenário: bar-vagão-restaurante,
de nome-fantasia Parangolé,
sito à rua Clotário Portugal
(otário no Torto é Gal?),
onde sempre tinha um louco da família
acorrentado no porão
(ou seria no sótão? Mistério...) – ...

O bar-vagão-restaurante vibra
como um gigantesco forno de micro-ondas
ligado.

Dois personagens dialogam:
cura-prosador e poeta-barbeiro:
– Mas comé que aqueles concretistas tiveram a pachorra
de querer dar por encerrado o ciclo histórico do verso?
– Manha...
– O quê?
– Manha: “tiveram a manha”.
É assim que se diz, atualmente. Reformule.
– Tá: mas comé que aqueles concretistas tiveram a manha
de querer dar por encerrado o ciclo histórico do verso? –
indaga o poeta-barbeiro.
– É que não sabiam necas de nádegas de etimologia –
replica o cura-prosador:
– Soubessem que verso tem esse nome
porque sempre volta, e volta sempre,
não passavam um vexame desses.
– Necas de nádegas, certeza!
No instante em que o poeta-barbeiro diz “nádegas”,
uma freguesa de largas ancas e polpudas nádegas
adentra o recinto e senta-se numa banqueta,
diante do balcão.
O cura-prosador começa a socar uma bronha
(alá Leopold Bloom na praia às seis da tarde)
e o poeta-barbeiro, atocontínuo,
emenda outro assunto,
pra tentar disfarçar o tesão
que também o acomete:
– Caralhus! Você viu o novo livro da Assionara?
Com sorvete! Puerra: a Nara é poda pra baralho,
sindudalguma!
O cura-prosador sacode a cabeça
(também por consequência
de seus outros sacolejos, “secretos”)
e obtempera:
– Pois é. Ela é. Sinduda!
Mas, então, por que, por que você,
você não foi, não foi no lançamento,
do Amanhã. Com sorvete! Por quê?
– Caralhus! É que eu tava doente,
de cama, com febre,
e também tava com aquela fome,
fome de Knut Hamsun...
– Pelo menos, pelo menos,
não era de Charles Manson!

Os dois se cagam de rir da piada sem graça,
enquanto a freguesa, imóvel, polpudancálida
aguarda a chegada da barwoman,
a qual se recusa a comparecer ao sonho,
pois não tinha cachê,
tampouco suspiros.

Nem sequer sorvete.

terça-feira, julho 27, 2010

Mais um da Naomi...

Eu podia comentar muito a respeito,
mas só o farei após comentários de vocês.
Gritem...
Mas antes leiam:

LETTERS MY PREZ IS NOT SENDING
Naomi Shihab Nye

(aqui tem ela declamando este)

CARTAS QUE MEU “PRESI” NÃO VAI ENVIAR

Caro Rafik, Sinto muito pela partida de futebol
à qual você não vai mais, pois agora você
não tem mais...

Cara Fawziya, Sabe, eu também tenho uma mamãe
então posso imaginar o que você...

Cara Shadiya, Pense em seu pai
versus a democracia, aposto que você escolheria...

Não, não, Sami, não é verdade
isso que você disse no ato público,
que nosso país odeia vocês,
nós realmente apoiamos seu movimento
pela liberdade,
e é por isso que você não tem mais
casa, nem família, nem vilarejo...

Caro Hassan, Se ao menos você pudesse ver
a situação sob um ângulo mais abrangente...

Cara Maria, Surpreende-me que você tenha
o que aqui chamaríamos de um nome cristão
já que você mesma...

Cara Ribhia, Sinto muito por aquele ataque cardíaco,
eu sei que deve ter sido difícil para você viver
a vida inteira sob uma ocupação,
estamos mandando somente mais algumas bombas agora
para fortalecer seus opressores,
mas algum dia esperamos que a paz reine na região,
sinto muito que você não vai estar aí para ver...

Caro Suheir, Sem dúvida vozes foram feitas para se erguerem,
você não percebe que estamos falando
pelos seus próprios interesses...

Caro Sharif, A violência é uma coisa errada
a não ser quando somos nós que a usamos,
por que é que isso não faz sentido...

Cara Nadia, Eu não sabia da
sua gaveta especial, eu também gosto
de guardar umas coisinhas que significam muito pra mim…

Caro Ramzi, Você realmente precisa parar de chorar agora
e seguir adiante com os seus afazeres...

Caro Daddo, Eu sei que 5 filhos pequenos
deve doer muito perder de um golpe só
mas não podemos suspender nossos esforços...

Cara Fatima, É claro que eu tenho sentimentos
pelo seu povo, meu colega de quarto
era do Líbano...

Caro Mahmoud, gostaria de ter tempo para
responder sua carta, mas você deve compreender,
a pilha de correspondência aqui está impossível
e cada vez aumenta mais...


Naomi Shihab Nye
versão brasileira: Ivan Justen Santana

quinta-feira, julho 22, 2010

Abrindo a mão a um amigo

Hoje meu prezado camarada Felipe Arruda me mandou o seguinte poema, que traduzi e posto (com ó de admiração...).
Para mais informações sobre a autora, clique aqui.


Fechando o Punho
(Making a Fist, by Naomi Shihab Nye)

Pela primeira vez, na estrada norte de Tampico,
eu senti a vida deslizando para fora de mim,
um tambor no deserto, cada vez mais difícil de ouvir.
Eu tinha sete, deitada no carro, assistindo às palmeiras
trançarem um padrão enjoativo pelo vidro.
Meu estômago, um melão rachado dentro da minha pele.

“Como a gente sabe se já está morrendo?”
supliquei para minha mãe.
Viajávamos havia dias.
Com estranha confiança, ela respondeu:
“Quando a gente não consegue mais fechar o punho.”

Anos depois, eu sorrio ao pensar naquela viagem,
nas fronteiras que temos de cruzar separadamente,
estampadas com nossas aflições irrespondíveis.
Eu, que não morri, que ainda vivo,
ainda deitada no banco de trás das minhas perguntas,
cerrando e abrindo uma pequena mão.


Versão brasileira: Ivan Justen Santana

quinta-feira, julho 15, 2010

O Lorde Byron até que é bonitinho, mas ela...

é muito, mas muito mais.

Assim, dedico os versos seguintes a ela:

Gianna Maria Nadolny Roland

(e também ao nosso Byronzinho
que agora anda perambulando
na barriga dela...)


ELA ANDA EM CHARME

Ela anda em charme, como a noite negra
__De climas cálidos e céus sem par:
Todo o melhor que a luz à sombra agrega
__Encontra-se no seu perfil e olhar,
Mesclado àquela rutilância meiga
__Que o firmamento oculta ao dia alvar.

Uma penumbra a mais, um raio a menos,
__E então talvez tal graça se evolasse,
Que em cada trança, em balanços amenos,
__Flutua ou pousa sobre a sua face,
Onde os pensares doces e serenos
__Se expressam com simplicidade e classe.

E na maçã, no rosto radiante,
__Tão macio, tão calmo, mas eloquente:
Sorriso vencedor – rubor pulsante –
__Que diz de dias idos gentilmente,
Da mente em paz com tudo circundante,
__Do coração de amor sempre inocente!


She walks in beautyLord Byron
Versão brasileira: Ivan Justen Santana

sábado, julho 10, 2010

EM AQUE, EQUE, IQUE, OQUE, UQUE

Releitura dum soneto de Antônio José da Silva (Rio de Janeiro, 8 de maio de 1705 - Lisboa, 19 de outubro de 1739), conhecido como o Judeu, poeta e dramaturgo de sucesso, condenado pelo Santo Ofício e queimado vivo.


jogou o amor comigo um toque roque
mas no meu taco não é mais cacique
cem vezes lhe tangi com tal repique
que os ouvidos tapou ao som do toque

na batalha ao amor restou-lhe o choque
em trunfo de fineza pus-lhe aplique
e a vênus renegada que se explique
brindando-me com dama de reboque

projetem-se das opções todo um leque
senão me acham aqui burro e basbaque
furando outro estepe do calhambeque

descubra-se então dama sem dar traque
ou novamente encetarei no muque
esta mercedes que só guia fuque

quinta-feira, julho 08, 2010

A HISTÓRIA DUMA GATA

Me alimentaram
Me acariciaram
Me aliciaram
__(A Gata)


Aquela gata tinha patas de susto,
um lombo lento, um porte augusto,
toda espécie de sabedoria empírica
e umas unhas de puta lascada –
nunca coçava o nariz
e era tão (ou mais) polida
quanto a persona lírica
daquela moça grilada
dos versos da Alice Ruiz.

sábado, julho 03, 2010

Em homenagem ao Dunga (o técnico e o personagem)

*
CORINGA: VOCÊ

Em pé sobre as águas forjando pães em miolos
Enquanto os olhos do ídolo brilham ferro em brasa
Navios distantes vogam em nevoeiros profundos
Você nasceu com serpentes nos punhos
Enquanto furacões sopravam
A liberdade ali na esquina espera você
Mas com a verdade tão longe, que bem pode fazer?

Coringa você dança ao som do rouxinol
A ave voa alto à luz da lua e do sol
Ô, ô, ô, ô-ô, coringa você

Tão veloz o sol se põe no céu
Você se ergue e diz adeus a ninguém
Os tolos se lançam onde anjos temem trilhar
Ambos os seus futuros cheios de horror
Não se expõe alguém
Descascando mais uma camada de pele
Um passo adiante do perseguidor dentro dele

Coringa você dança ao som do rouxinol
A ave voa alto à luz da lua e do sol
Ô, ô, ô, ô-ô, coringa você

Você é um homem de alturas, você anda nas nuvens
Manipula multidões, enrola sonhos e afãs
Você ruma a Sodoma e Gomorra
Mas pra que toda essa pachorra?
Lá ninguém desposaria as suas irmãs
Amigo do mártir e da dona do prostíbulo
Você inspeciona a fornalha, vê o rico já sem título

Coringa você dança ao som do rouxinol
A ave voa alto à luz da lua e do sol
Ô, ô, ô, ô-ô, coringa você

Pois é, o Livro do Levítico e o Deuteronômio
As leis da selva e do oceano são seu único guia
Na fumaça do luscofusco num garanhão leitebranco
Feições tais as suas só Michelangelo esculpiria
Descansando nos campos, longe do espaço tumultuoso
Semidormindo às estrelas, um cãozinho lambe-lhe o rosto

Coringa você dança ao som do rouxinol
A ave voa alto à luz da lua e do sol
Ô, ô, ô, ô-ô, coringa você

Pois é, o atirador atocaia os doentes e os mancos
O pregador, competindo, guarda os mesmos planos
Cassetetes e jatos d’água, gás lacrimogêneo e algemas
Coquetéis molotov e pedras sob todos os panos
Juízes hipócritas morrem nas teias que tecem
É uma questão de tempo até que as trevas se expressem

Coringa você dança ao som do rouxinol
A ave voa alto à luz da lua e do sol
Ô, ô, ô, ô-ô, coringa você

É um mundo cheio de sombras, os céus são cinzentos
Uma mulher pariu um príncipe e o vestiu de púrpura
Ele botará os padres no bolso, as lâminas nas forjas
Separará os órfãos de todas essas corjas
E os colocará aos pés de uma prostituta
Coringa você, você sabe o que quer mais
Coringa você, não mostra quaisquer sinais

Coringa você dança ao som do rouxinol
A ave voa alto à luz da lua e do sol
Ô, ô, ô, ô-ô, coringa você


Jokerman, Bob Dylan
Versão brasileira:
Ivan Justen Santana

terça-feira, junho 29, 2010

Fora da estação (e pela metade), com vocês, um

*
RENGA DE OUTONO

garoa invisível –

finas lâminas que lavam
nossas velhas almas

som de chuva não se vê:
nem se a lua usava luvas

frágeis mãos morenas
penetram a terra negra
buscam a raiz

cavem, cavem, dedos ágeis:
suas unhas fazem medo

na testa gotículas
há pressa na rua escura
meias e uma saia

brandamente as gotas brancas
se transformam: fios de faca

corte – com três lâminas
enfeitou-se um corpo inerte –
sabe mas não sabe

poema de amor na carne
em sutil caligrafia

desenhos que brilham
numa pele que diz: sim
e os corpos se tocam

e como músicos cegos
respiram num só compasso

melodicamente
a pauta foi calculada
e os corpos se tocam

as pedras azuis do ábaco
deslizam para a direita

a crescente luz
os formatos do luar
e o calor sinfônico

joelhos e violoncelos
cicatriz num longo braço

verberam verbenas
na pauta já calculada:
e o som azul chove

o céu imenso em pedaços
nas gotinhas da janela

um gineceu abre-se
um androceu se antecipa:
anteras panteras

as razões de um negro galho
na emoção da flor do ipê


Ivan Justen Santana
Rodolfo Jaruga

quinta-feira, junho 24, 2010

A HISTÓRIA DE SEMPRE, NUNCA, NÃO, SIM, NEM E NADA SEM TUDO OU MAS

*
Nunca desejava assassinar sempre.

Não sabia serem irmãos de sangue.

Sim disse: nada havia que os cindisse.

Nem avisou: hoje é o dia de nunca.

Sempre mandou pra nunca um bumerangue.

Nunca pensou em usar o brinquedo.

Mas sempre decidiu odiá-lo em segredo.

*

quarta-feira, junho 23, 2010

Depois de ler Jaboc, romance de Otto Leopoldo Winck, até a página 21...

*

TUDO É MESMO SIMULACRO


tudo é mesmo simulacro

num labirinto de espelhos

onde narciso confunde-se

com narciso imagem e eco


eco em si nesse osso sacro

sem quaisquer sinais vermelhos

nem clímax final algum de se

esperar por repeteco

*
*

segunda-feira, junho 21, 2010

01. Elabore um título ao seguinte poema e assim torne-se nosso(a) parceiro(a) --

- acréscimo em 23/06:
Resposta da questã 01: Thadeu postou este no blog dele, e acrescentou um título matador, o qual está agora acrescentado aqui: qualquer dúvida, leiam os comentários desta postagem...
*

O CÉU QUE ME TRAGA

eu fumo porque sei que vou virar fumaça
jamais enfrentarei filas no INPS
sete palmos abaixo e a terra me esquece
o poeta é a estrela cadente que passa

nesta terra de reis sou cego em meio à messe
de todo esse tabaco o qual vicia a massa
e me faz abusar do corpo que ultrapassa
a terra o mar o céu no eterno sobe e desce

e como tudo no universo se desfaz
faço de mim a brasa e também combustível
deixo de ser concreto pra ser invisível

em fogo em fúria som silêncio guerra e paz
como num verso que nenhum poeta fez
a estas constelações convergindo outra vez


Antônio Thadeu Wojciechowski
Ivan Justen Santana

quarta-feira, junho 16, 2010

Em celebração ao Bloomsday:

*
SUPEREGO EM REDONDILHA

Meu prezado e caro Ivan:
tua inspiração é vã;

larga mão de ser pedante,
pois ninguém abrigou Dante;

e não sejas cabotino:
ninguém lê Tomás de Aquino;

vê se não desce o sarrafo:
é: ninguém decifra Safo;

nenhum épico é um idílio:
ninguém quer rever Vergílio;

isto não saiu em vídeo:
ninguém assistiu Ovídio;

sim, é amargo o shake: inspira:

ninguém interpreta Shakespeare;

duplamente o caso é vil:
ninguém viu quem foi o Will;

sem Camões nem bem te espantes:
ninguém ri mais com Cervantes;

larga todos estes poetas:
ninguém curte tais estetas;

na poesia há quem se arrisque:
mas ninguém relê Leminski;

bem trovato não é vero:
quem (ninguém!) recorda Homero?

Pata de asno só dá coice:
afinal ninguém leu Joyce;

assim, enfim, tu também:
Ivan, teu nome é Ninguém.

terça-feira, junho 15, 2010

Revelando as fênix

Hoje é dia de jogo do Brasil na copa do mundo, mas tem outra coisa muito mais importante (pelo menos pra mim:)

é aniversário do meu pai -- feliz aniversário, Sr. Rui!

Ontem palestrei sobre Joyce e o Ulysses, no Centro Feminino (vide aqui), e amanhã haverá mais Bloomsday aqui em Curitiba (maiores informações, vide aqui o blog do meu prezado amigo Felipe).

Assim, prospectivamente eu postei o poema de Rilke sobre Odisseu e as sereias, e agora largo aqui a versão que eu e meu camarada William Crosué Teca fizemos para a folclórica balada anglo-irlandesa Finnegan´s Wake, a qual inspirou Joyce a escrever um catatauzinho aí que vocês devem saber qual é...

VELANDO TIM
(Finnegan´s Wake, em versão brasileira dos Dublês de Dublin)

Tim Finnegan vivia na Rua do Passeio,
um gentil irlandês muito esquisitão;
tinha uma língua cheia de asseio
e pra subir na vida ele usava um formão.
Tinha um jeitinho de quem bebia,
o uísque deixava Tim tantã,
e a fim de firmar o pulso a cada dia
bebia um traguinho toda manhã.

(refrão:)
Truque na morte, dance comigo,
varra o soalho, chacoalhe pra mim;
é ou não é assim como eu digo
uma grande bagunça velando Tim!?

Certa manhã Tim já tava torrado,
a cabeça pesada o fez bambear;
caiu da escada e quebrou seu crânio
e o levaram pra casa a fim de o velar.
Enrolaram Tim num lençol limpinho
e o deitaram na cama de revés,
à sua cabeça um barril de vinho
e um galão de uísque a seus pés.

(refrão:)

Os amigos vieram para velá-lo
e a viúva Finnegan dava um caldo,
primeiro ela trouxe chá com bolinhos,
depois uísque, tabaco e cachimbos.
Biddy O´Brien pôs-se a chorar:
"Um cadáver tão limpo jamais se viu!
Tim, camarada, por que nos deixar?"
"Ah, fecha essa matraca!" disse Paddy McGill!

(refrão:)

Aí Maggie O´Connor ganhou controle,
"Biddy," disse ela, "por certo você erra!"
Mas Biddy pregou-lhe o cinto na goela
e deixou-a no chão, esticada e grogue.
Então no velório o pau quebrou,
e foi homem a homem, mulher a mulher,
a lei da pancada ali se instalou,
salvem morto e feridos quem puder!

(refrão:)

Aí Mickey Malone sentiu o drama
quando um copo de uísque voou assim:
tirou-lhe uma fina e caindo na cama
o copo derrama-se sobre Tim!
Tim revive! Ele ressuscita!
Timothy vindo de volta, eu vi,
diz: "Vamos beber toda essa birita!
Almas do diacho, acham que eu morri?"

(refrão:)

terça-feira, junho 08, 2010

A ILHA DAS SEREIAS

*
Quando, atendendo a seus anfitriões,
após o dia inteiro de trabalho, narrava
suas viagens marítimas e tribulações
em voz calma, nem sequer suspeitava
como apavorá-los, e quais intempestivas
palavras usar para que, como ele viu
naquele tranquilo arquipélago anil,
também os ofuscasse o brilho áureo das ilhas
cuja mera visão traz novamente
o perigo, e não mais em repuxos
de fúria em tumulto, como sempre;
mas sem um som toma os marujos
que sabem: algumas vezes se ouve
uma canção daquelas ilhas douradas –
e eles se lançam aos remos como se
estivessem cercados
pelo silêncio que no espaço imenso
existe, e nos seus ouvidos insiste,
como se ao reverso fosse o denso
canto a que nenhum mortal resiste.


Rainer Maria Rilke
Versão brasileira:
Ivan Justen Santana

domingo, junho 06, 2010

PRA TODAS AS PESSOAS QUE CONHEÇO E QUE GOSTAM SIM DE POESIA...

(qualquer dúvida sobre o título e a quem este poema é dedicado, reportar-se à lista de blogues aqui ao lado para maiores referências imediatas...)

*
Sim, eu também já fui daqueles chatos de galocha
pra quem nenhum verso, nenhuma frase prestava.

E agora, por não querer ser mais um crica broxa,
talvez eu sofra, ao inverso, de complacência brava.

Enfim: minha visão crítica (seja rígida, seja frouxa)
não melhora nem piora as artes da palavra,

e estes dísticos aqui, com essas rimas de trouxa,
contam pouco ou nada à poesia que hoje se grava.

Mas quero e vou celebrar assim, nas coxas,
as tantas maravilhas lidas por mim, sem trava.

Por mais que pegue e largue métrica (era nenhuma),
rimas (névoas-nadas de vaidades, truques e firulas)

– e ainda que achem que só aumento o cordão
dos puxa-sacos – destaco que a poesia está à solta:

sim, assim como as bruxas, a violência e o horror,
tem cada vez mais poetas, cada vez mais arte ao redor,

cada vez mais merda e lixo, sim, mas cada vez mais
são mais motivações e mais razões e mais canções

pra criar mais
alegria: multiplicar o prazer
e assassinar a dor.

quarta-feira, junho 02, 2010

JOVEM PRA SEMPRE

(Forever Young, Bob Dylan)

Que Deus te benza e guarde sempre,
Que os teus desejos se realizem,
Que faças sempre o bem aos outros
E deixe-os fazer bem a ti.
E que uma escada até as estrelas
Construas para percorrê-la,
Que tu prossigas jovem sempre,
Jovem pra sempre, jovem pra sempre,
Que tu prossigas jovem sempre.

Que amadureças à justiça,
Que amadureças à verdade,
Que saibas sempre discernir
E as luzes ver em torno a ti.
Que tenhas sempre mais coragem,
Que te ergas alto e sejas forte,
Que tu prossigas jovem sempre,
Jovem pra sempre, jovem pra sempre,
Que tu prossigas jovem sempre.

Que tuas mãos sempre se ocupem,
Que teus pés sempre sejam ágeis,
Que tuas bases sejam firmes
Quando vierem vendavais.
Que o coração sempre te anime,
E sempre cantem tua canção,
Que tu prossigas jovem sempre,
Jovem pra sempre, jovem pra sempre,
Que tu prossigas jovem sempre.


Versão brasileira: Ivan Justen Santana

terça-feira, junho 01, 2010

UMA NÊNIA A WILSON BUENO

*

Nossa Santa já não pode mais ser Cândida

Nossa vida assassinada e cada vez mais bandida

Facada que vem sem nem falar pra que vinha


Mas as frases não acabam no final da linha

Um sangue de poeta grava toda a escrivaninha


*

quarta-feira, maio 26, 2010

A SEREIA DO RIO IVO

Havia uma sereia numa cava do Rio Ivo:
tinha curvas deslumbrantes e olhar verde furtivo.
Quando a viu, à luz da lua,
flutuando na foz, nua,
Ivo disse a ela: “por ti, eu fluo e vivo.”

Mas um dia Ivo ouviu uma pedra filosofal,
segundo a qual a monogamia não seria normal:
“um rio não molha a mesma sereia duas vezes”
dizia a pedra em suas heráclitas, dialéticas teses.

A sereia também cairia naquela conversa, porém
já havia sido vítima do último viral
e abalara-se, em desabalada carreira fluvial,
a se esbaldar nas badaladas baladas do Rio Belém.

segunda-feira, maio 24, 2010

SEMPRENOVOQUANDO

(pra Gianna Roland)

enquanto eu fico aqui parado na parada
enquanto você foca ali parada nalgum prado
enquanto a gente sai pela direita ou pela esquerda

ou sai daquela uma e vai nessa pelada
ou empacota ou tem um treco e larga ao lado
ou fala um troço sério e alguma bela merda

em ganho ou perda
em detestado estado
em pleno pelo duma gata parda na calada

enquanto tudo e nada:

a vida vem ventando
inventa e cria em contrabando
um mesmo nunca velho e sempre novo quando

quarta-feira, maio 19, 2010

Rendendo homenagens


Tem um sujeito na nossa turma de amigos que eu vou falar pra vocês, é um cara que merece homenagens e condecorações.
É o tipo mais animado e divertido que eu conheço.
Eu o considero uma lenda viva da contracultura curitibana.
Ele organizou a primeira e maior exposição mundial de fanzines dessa cidade.
Ele teria diversos motivos para ser amargurado e agressivo, mas prefere ser simplesmente feliz.
E ainda por cima, formou-se em filosofia pela UFPR, em plena ditadura militar.

Édson de Vulcanis, também conhecido como "Aranha" e "Michael Édson", feliz proprietário dos blogs Aranha Céu, Dê dinheiro ao poeta, Ideias aracnídeas e Noções unidas.

Em sua própria definição, Édson é um anarcovigarista do bem.

Inigualável frasista trocadilheiro, Édson foi um dos poetas que abrilhantaram o evento Curitiba 12 Horas.

Prometi ao Édson traduzir uma canção de John Lennon (e Yoko Ono), uma canção que Édson gosta de cantar e cuja mensagem dá o que pensar.

Hoje, finalmente, cumpro essa promessa, feliz.

Aí está, Édson!:

A MULHER É O CRIOULO DO PLANETA
(WOMAN IS THE NIGGER OF THE WORLD,
by John Lennon & Yoko Ono)

A mulher é o crioulo do planeta
Sim ela é... pense sobre isso
A mulher é o crioulo do planeta
Pense sobre isso... ou aja sobre isso

Fazemos ela pintar o rosto e dançar
Se não é uma escrava, dizemos que ela não nos ama
Se ela é verdadeira, dizemos que está tentando ser homem
Enquanto a rebaixamos, fingimos que ela está acima de nós

A mulher é o crioulo do planeta
Se não acredita em mim, olhe a que está com você
A mulher é a escrava dos escravos
Ah, sim... melhor gritar sobre isso

Fazemos ela suportar e educar nossas crianças
E então a largamos de vez por ser uma velha mãe gorducha
Dizemos que o lar é o único lugar para ela
E aí reclamamos que ela não é companhia civilizada

A mulher é o crioulo do planeta
Se não acredita em mim, olhe a que está com você
A mulher é a escrava dos escravos
Ah, sim... (pense sobre isso)

Insultamos ela todo dia na TV
E cogitamos por que ela não tem confiança
Quando é jovem, matamos seu desejo de ser livre
E enquanto dizemos para ela não ser inteligente demais
Rebaixamos ela por ser muito tolinha

A mulher é o crioulo do planeta
Sim ela é... se não acredita em mim,
Olhe a que está com você
A mulher é a escrava dos escravos
Sim ela é... se você acredita em mim,
É melhor gritar sobre isso

Fazemos ela pintar o rosto e dançar
Fazemos ela pintar o rosto e dançar
Fazemos ela pintar o rosto e dançar

domingo, maio 16, 2010

Revivificação do Credoencial das Águas Claras

Neste fim de semana, tivemos eu & Gianna Roland o prazer de receber em nossa casa o poeta e meu amigo-irmão William Crosué Teca, proprietário do blog TECATATAU.

Entre outras estripulias, articulamos a volta dos Dublês de Dublin, que deve ocorrer nas comemorações do próximo Bloomsday em Curitiba.

Aguardem maiores informações...

Por enquanto, fiquem com o texto da maviosa versão que fizemos desta emblemática canção do Creedence Clearwater Revival -- quem conhece pode cantar junto...:

*
NASCEU NO BANHADO
(Born on the Bayou, John Fogerty /
Creedence Clearwater Revival)

Quando eu era só um piá de bosta,
Da altura do pé do meu pai – ali,
O pai disse “filho, não durma de touca
Do jeito que eu dormi.”
Não se perca aí...
Não se perca por aí...

E um sete de setembro, eu me lembro,
Correndo lá no bosque, nu,
Ainda escuto meu velho guapeca
Latindo atrás de um vodu.
Latindo atrás de um vodu.

Nasceu no Banhado;
Nasceu no Banhado;
Nasceu no Banhado.

Queria chegar de volta ao banhado,
Rolasse uma princesa na mão,
Como se fosse um biarticulado
Descendo até o Boqueirão.

Descendo até o Boqueirão.

Nasceu no Banhado;
Nasceu no Banhado;
Nasceu no Banhado.

Versão brasileira:
Ivan Justen Santana & William Crosué Teca

quinta-feira, maio 13, 2010

E lá vai mais um poema de uma rima só, solando pela blogosfera...

*
ORA ORA ORA

Ora bolas – ora, ora:
se você vai indo embora
sem esporro senta espora
sempre nunca mais agora
na esperança da demora
e na fé que ao demo ora
minha cor já se descora.

Ora bolas – ora, ora:
hora que passou da hora,
verso que ficou na escora
e esta estrofe não melhora.
Rainha do frevo é Dora
mas se a Carmen mira e chora
eu sou mais ouvir a Aurora.

Ora bolas – ora, ora:
se mexer o molho gora
e não chega a Bora Bora.
Abra a caixa de Pandora:
se a canção você decora
na filosofia mora
e talhou sozinha a tora
por que busca dar o fora?

terça-feira, maio 11, 2010

Ainda repercutindo o Curitiba 12 Horas...

Ainda estou vibrando com as energias do fim de semana. Convido vocês a passarem lá no blog do meu poeta camarada Luiz Felipe Leprevost, que também postou a respeito.

Pra quem não sabe do que estou falando: por gentileza, veja o texto e leia as fotos da postagem anterior.

E pra quem quer mais (sempre tem mais, e eu quero sempre maaaais!...), e também pra quem está chegando aqui pela primeira vez (dobrou a visitação deste blog: mais um dos efeitos-Curitiba-12-Horas:)

aí vai um poema inédito, que estreou no Paço Municipal, mas teve boa aceitação no Cajuru e no Bairro Novo...


PASSAGEM NEM SEQUER DE IDA...

Tudo começou como sempre no meio do caminho:
Eu estava ali feito quem não quer nada, sozinho.
Nada se acabava em quase nunca, mas era uma vez:
Só podia ser assim, falando em bom português –
A viagem via-se em muitos mapas, e não tinha escolta:
E daí? Daí eu vi que não ia mais ter volta.

O sim seria sim, sem sinsalabins nem abracadabras,
Portas e janelas se abriam com ou sem pés de cabras –
As guilhotinas caíam, as rotinas repetiam: era outono –
A brincadeira me dizia das dez tinas dum pão sem dono –
O ponto final não valia mais que uma frase solta:
E daí? Daí eu vi que não ia mais ter volta.

Achei Shakespeare, e também umas sereias em minha vida:
As mesmas trilhas de chegada também foram as de ida.
Por Camões nunca Dantes lidos, Homero em safa Safo se acabava
E meu cotovelo sempre ali, sofrendo de coceira brava.
Eu dormi conservador, acordei cheio de revolta:
E daí? Daí eu vi que não ia mais ter volta.

Sem mais enrolações, sem mais para o momento,
Li Orgulho e Preconceito, Guerra e Paz, o Tempo e o Vento –
Ri com James Joyce à sombra das mocinhas em flor
E Razão e Sensibilidade me trouxeram de novo ao amor.
Fui sabendo estar sujeito a mais alguma reviravolta:
E daí? Daí eu vi que não ia mais ter volta.

Faço ideia da cultura, do plantio e da colheita, de outra
Forma de dizer: fiz a semeadura e farei a recolta –
E daí?
Daí, no ensejo, ainda vejo: não vai mesmo ter mais volta.

domingo, maio 09, 2010

Todos os espetáculos de ontem...

Hoje só posso registrar momentos mágicos:
no Parque dos Peladeiros, os casais dançando,
os Eles Mesmos detonando,
mesmo com o ginásio semivazio,
meus três comparsas poetas e eu,
mandando bala e nos divertindo
com aquela minoria esmagadora.

Depois, no Parque do Semeador,
chegamos e Batista de Pilar estava lá,
sacudindo a massa, comandando a festa.

Subimos ao palco, nós, é bom que se registre:
Jorge Barbosa (o do Irajá)
Edson de Vulcanis,
Luiz Felipe Leprevost
e este que vos escreve --
e o povo disse: sim, a gente gosta de poesia!

Posteriormente, assistimos à Relespública,
que realmente quebrou tudo,
subimos de novo ao palco e, por nossa vez,
também quebramos tudo de novo.

E veio o Blindagem, com o novo vocalista
reencarnando o Ivo e quebrando tudo novamente,

e então,
depois de tantos instantes impressionantes,

vieram os Mutantes, com os originais integrantes
Serginho na guitarra,
Dinho Paes Leme nas baquetas,
e os novos atualmente Mutantes
(tem um curitibano nessa parada)
e agora só posso terminar com o poema imediato
feito pelo Fábio Elias e por este que aqui delira
com pé firme na realidade:

A VIDA EM CURITIBA

pro Leminski, foi meio que uma pedreira.
A vida em Curitiba já foi um Prado Velho,
mas hoje está que é um Bairro Novo,
e nenhum Sítio Cercado,
nenhuma Barreirinha
nos impedirão de abrir este Portão:

Curitiba evolui a cada segundo
e hoje o símbolo da cidade
é o Novo Mundo!


Minha filha Rúbia e Sérgio Dias Baptista (foto: Gianna Roland)


Edson de Vulcanis, Jorge Barbosa, Luiz Felipe Leprevost e Ivan Justen Santana, no palco do Parque do Semeador, em Curitiba: a poesia é boa e o povo gosta! (foto: Gianna Roland)


Eu & Gianna (foto: Ivan)


Serginho, em lótus espiritual com a guitarra, a meio metro de nós, encantando a multidão. (foto: Gianna)


Eu, incrédulo e em êxtase, naquele instante-Mutante. (foto: Gianna)


Tietagem no camarim: Serginho e Gianna, após o espetáculo. (foto: Rúbia)

terça-feira, maio 04, 2010

Pangur Bán, um felino trilíngue...

O poema original foi escrito em gaélico, e é atribuído a um monge irlandês, do século IX.
A tradução em inglês foi feita por Robin Flower.
Terminei esta versão brasileira hoje. Dedico a versão e a postagem a Ana Guimarães e seu blog O GOZO DA LETRA, no qual conheci este magnífico poema.

Pangur Bán
Pangur Bán

Pangur Ban

Messe agus Pangur Bán,
cechtar nathar fria shaindán:
bíth a menmasam fri seilgg,
mu menma céin im shaincheirdd.

I and Pangur Bán my cat

`Tis a like task we are at:
Hunting mice is his delight,
Hunting words I sit all night.
Eu e meu felino Pangur Ban,
Eis nossa filosofia vã:
Caçar ratinhos é seu deleite,
Caçando letras eu passo a noite.

Caraimse fos, ferr cach clú
oc mu lebrán, léir ingnu;
ní foirmtech frimm Pangur bán
caraid cesin a maccdán
Better far than praise of men

`Tis to sit with book and pen;
Pangur bears me no ill will
He too plies his simple skill
Muito melhor que aplauso mortal
É estar aqui com livro e penal;
Pangur concorda que a escolha é boa:
Na caça também se aperfeiçoa.

Ó ru biam, scél gan scís
innar tegdais, ar n-óendís,
táithiunn, díchríchide clius
ní fris tarddam ar n-áthius
'Tis a merry thing to see

At our tasks how glad are we,
When at home we sit and find
Entertainment to our mind.
Dá gosto ver a paixão feroz
Que dedicamos, os dois a sós,
Quando nos pomos alegremente
A contentar nosso corpo e mente.

Gnáth, húaraib, ar gressaib gal
glenaid luch inna línsam;
os mé, du-fuit im lín chéin
dliged ndoraid cu ndronchéill
Oftentimes a mouse will stray

In the hero Pangur`s way;
Oftentimes my keen thought set
Takes a meaning in its net.
Frequentemente um ratinho sói
Passar em frente a Pangur, o herói;
Frequentemente meu pensamento
Captura a ideia de um argumento.

Fúachaidsem fri frega fál
a rosc, a nglése comlán;
fúachimm chéin fri fégi fis
mu rosc réil, cesu imdis.
`Gainst the wall he sets his eye

Full and fierce and sharp and sly;
`Gainst the wall of knowledge I
All my little wisdom try.
Colado à parede, o gato vê
Com raro olho vivo, agudo em V;
Colado à parede do saber,
A percepção eu tento estender.

Fáelidsem cu ndéne dul
hi nglen luch inna gérchrub;
hi tucu cheist ndoraid ndil
os mé chene am fáelid.
When a mouse darts from its den,

O how glad is Pangur then!
O what gladness do I prove
When I solve the doubts I love!
Quando um ratinho surge da fresta
Ah, que alegria Pangur infesta!
Mesma alegria infesta meu eu
Se alguma questão se resolveu!

Cia beimmi a-min nach ré
ní derban cách a chéile
maith la cechtar nár a dán;
subaigthius a óenurán
So in peace our tasks we ply,

Pangur Bán, my cat, and I;
In our arts we find our bliss,
I have mine and he has his.
Assim, tranquilos, em santa paz,
Eu e Pangur, meu felino audaz,
Fruímos nossa iluminação,
Eu, no silêncio; ele, na ação.

Hé fesin as choimsid dáu;
in muid du-ngní cach óenláu;
du thabairt doraid du glé
for mu muid céin am messe.
Practice every day has made

Pangur perfect in his trade;
I get wisdom day and night
Turning darkness into light
A prática diária do exercício
Fez Pangur perfeito em seu ofício;
E, noite e dia, o saber me aduz
A transformar as trevas em luz.

Aistrithe ag Robin Flower
Translated by Robin Flower

Versão brasileira: Ivan Justen Santana