quarta-feira, maio 26, 2010

A SEREIA DO RIO IVO

Havia uma sereia numa cava do Rio Ivo:
tinha curvas deslumbrantes e olhar verde furtivo.
Quando a viu, à luz da lua,
flutuando na foz, nua,
Ivo disse a ela: “por ti, eu fluo e vivo.”

Mas um dia Ivo ouviu uma pedra filosofal,
segundo a qual a monogamia não seria normal:
“um rio não molha a mesma sereia duas vezes”
dizia a pedra em suas heráclitas, dialéticas teses.

A sereia também cairia naquela conversa, porém
já havia sido vítima do último viral
e abalara-se, em desabalada carreira fluvial,
a se esbaldar nas badaladas baladas do Rio Belém.

segunda-feira, maio 24, 2010

SEMPRENOVOQUANDO

(pra Gianna Roland)

enquanto eu fico aqui parado na parada
enquanto você foca ali parada nalgum prado
enquanto a gente sai pela direita ou pela esquerda

ou sai daquela uma e vai nessa pelada
ou empacota ou tem um treco e larga ao lado
ou fala um troço sério e alguma bela merda

em ganho ou perda
em detestado estado
em pleno pelo duma gata parda na calada

enquanto tudo e nada:

a vida vem ventando
inventa e cria em contrabando
um mesmo nunca velho e sempre novo quando

quarta-feira, maio 19, 2010

Rendendo homenagens


Tem um sujeito na nossa turma de amigos que eu vou falar pra vocês, é um cara que merece homenagens e condecorações.
É o tipo mais animado e divertido que eu conheço.
Eu o considero uma lenda viva da contracultura curitibana.
Ele organizou a primeira e maior exposição mundial de fanzines dessa cidade.
Ele teria diversos motivos para ser amargurado e agressivo, mas prefere ser simplesmente feliz.
E ainda por cima, formou-se em filosofia pela UFPR, em plena ditadura militar.

Édson de Vulcanis, também conhecido como "Aranha" e "Michael Édson", feliz proprietário dos blogs Aranha Céu, Dê dinheiro ao poeta, Ideias aracnídeas e Noções unidas.

Em sua própria definição, Édson é um anarcovigarista do bem.

Inigualável frasista trocadilheiro, Édson foi um dos poetas que abrilhantaram o evento Curitiba 12 Horas.

Prometi ao Édson traduzir uma canção de John Lennon (e Yoko Ono), uma canção que Édson gosta de cantar e cuja mensagem dá o que pensar.

Hoje, finalmente, cumpro essa promessa, feliz.

Aí está, Édson!:

A MULHER É O CRIOULO DO PLANETA
(WOMAN IS THE NIGGER OF THE WORLD,
by John Lennon & Yoko Ono)

A mulher é o crioulo do planeta
Sim ela é... pense sobre isso
A mulher é o crioulo do planeta
Pense sobre isso... ou aja sobre isso

Fazemos ela pintar o rosto e dançar
Se não é uma escrava, dizemos que ela não nos ama
Se ela é verdadeira, dizemos que está tentando ser homem
Enquanto a rebaixamos, fingimos que ela está acima de nós

A mulher é o crioulo do planeta
Se não acredita em mim, olhe a que está com você
A mulher é a escrava dos escravos
Ah, sim... melhor gritar sobre isso

Fazemos ela suportar e educar nossas crianças
E então a largamos de vez por ser uma velha mãe gorducha
Dizemos que o lar é o único lugar para ela
E aí reclamamos que ela não é companhia civilizada

A mulher é o crioulo do planeta
Se não acredita em mim, olhe a que está com você
A mulher é a escrava dos escravos
Ah, sim... (pense sobre isso)

Insultamos ela todo dia na TV
E cogitamos por que ela não tem confiança
Quando é jovem, matamos seu desejo de ser livre
E enquanto dizemos para ela não ser inteligente demais
Rebaixamos ela por ser muito tolinha

A mulher é o crioulo do planeta
Sim ela é... se não acredita em mim,
Olhe a que está com você
A mulher é a escrava dos escravos
Sim ela é... se você acredita em mim,
É melhor gritar sobre isso

Fazemos ela pintar o rosto e dançar
Fazemos ela pintar o rosto e dançar
Fazemos ela pintar o rosto e dançar

domingo, maio 16, 2010

Revivificação do Credoencial das Águas Claras

Neste fim de semana, tivemos eu & Gianna Roland o prazer de receber em nossa casa o poeta e meu amigo-irmão William Crosué Teca, proprietário do blog TECATATAU.

Entre outras estripulias, articulamos a volta dos Dublês de Dublin, que deve ocorrer nas comemorações do próximo Bloomsday em Curitiba.

Aguardem maiores informações...

Por enquanto, fiquem com o texto da maviosa versão que fizemos desta emblemática canção do Creedence Clearwater Revival -- quem conhece pode cantar junto...:

*
NASCEU NO BANHADO
(Born on the Bayou, John Fogerty /
Creedence Clearwater Revival)

Quando eu era só um piá de bosta,
Da altura do pé do meu pai – ali,
O pai disse “filho, não durma de touca
Do jeito que eu dormi.”
Não se perca aí...
Não se perca por aí...

E um sete de setembro, eu me lembro,
Correndo lá no bosque, nu,
Ainda escuto meu velho guapeca
Latindo atrás de um vodu.
Latindo atrás de um vodu.

Nasceu no Banhado;
Nasceu no Banhado;
Nasceu no Banhado.

Queria chegar de volta ao banhado,
Rolasse uma princesa na mão,
Como se fosse um biarticulado
Descendo até o Boqueirão.

Descendo até o Boqueirão.

Nasceu no Banhado;
Nasceu no Banhado;
Nasceu no Banhado.

Versão brasileira:
Ivan Justen Santana & William Crosué Teca

quinta-feira, maio 13, 2010

E lá vai mais um poema de uma rima só, solando pela blogosfera...

*
ORA ORA ORA

Ora bolas – ora, ora:
se você vai indo embora
sem esporro senta espora
sempre nunca mais agora
na esperança da demora
e na fé que ao demo ora
minha cor já se descora.

Ora bolas – ora, ora:
hora que passou da hora,
verso que ficou na escora
e esta estrofe não melhora.
Rainha do frevo é Dora
mas se a Carmen mira e chora
eu sou mais ouvir a Aurora.

Ora bolas – ora, ora:
se mexer o molho gora
e não chega a Bora Bora.
Abra a caixa de Pandora:
se a canção você decora
na filosofia mora
e talhou sozinha a tora
por que busca dar o fora?

terça-feira, maio 11, 2010

Ainda repercutindo o Curitiba 12 Horas...

Ainda estou vibrando com as energias do fim de semana. Convido vocês a passarem lá no blog do meu poeta camarada Luiz Felipe Leprevost, que também postou a respeito.

Pra quem não sabe do que estou falando: por gentileza, veja o texto e leia as fotos da postagem anterior.

E pra quem quer mais (sempre tem mais, e eu quero sempre maaaais!...), e também pra quem está chegando aqui pela primeira vez (dobrou a visitação deste blog: mais um dos efeitos-Curitiba-12-Horas:)

aí vai um poema inédito, que estreou no Paço Municipal, mas teve boa aceitação no Cajuru e no Bairro Novo...


PASSAGEM NEM SEQUER DE IDA...

Tudo começou como sempre no meio do caminho:
Eu estava ali feito quem não quer nada, sozinho.
Nada se acabava em quase nunca, mas era uma vez:
Só podia ser assim, falando em bom português –
A viagem via-se em muitos mapas, e não tinha escolta:
E daí? Daí eu vi que não ia mais ter volta.

O sim seria sim, sem sinsalabins nem abracadabras,
Portas e janelas se abriam com ou sem pés de cabras –
As guilhotinas caíam, as rotinas repetiam: era outono –
A brincadeira me dizia das dez tinas dum pão sem dono –
O ponto final não valia mais que uma frase solta:
E daí? Daí eu vi que não ia mais ter volta.

Achei Shakespeare, e também umas sereias em minha vida:
As mesmas trilhas de chegada também foram as de ida.
Por Camões nunca Dantes lidos, Homero em safa Safo se acabava
E meu cotovelo sempre ali, sofrendo de coceira brava.
Eu dormi conservador, acordei cheio de revolta:
E daí? Daí eu vi que não ia mais ter volta.

Sem mais enrolações, sem mais para o momento,
Li Orgulho e Preconceito, Guerra e Paz, o Tempo e o Vento –
Ri com James Joyce à sombra das mocinhas em flor
E Razão e Sensibilidade me trouxeram de novo ao amor.
Fui sabendo estar sujeito a mais alguma reviravolta:
E daí? Daí eu vi que não ia mais ter volta.

Faço ideia da cultura, do plantio e da colheita, de outra
Forma de dizer: fiz a semeadura e farei a recolta –
E daí?
Daí, no ensejo, ainda vejo: não vai mesmo ter mais volta.

domingo, maio 09, 2010

Todos os espetáculos de ontem...

Hoje só posso registrar momentos mágicos:
no Parque dos Peladeiros, os casais dançando,
os Eles Mesmos detonando,
mesmo com o ginásio semivazio,
meus três comparsas poetas e eu,
mandando bala e nos divertindo
com aquela minoria esmagadora.

Depois, no Parque do Semeador,
chegamos e Batista de Pilar estava lá,
sacudindo a massa, comandando a festa.

Subimos ao palco, nós, é bom que se registre:
Jorge Barbosa (o do Irajá)
Edson de Vulcanis,
Luiz Felipe Leprevost
e este que vos escreve --
e o povo disse: sim, a gente gosta de poesia!

Posteriormente, assistimos à Relespública,
que realmente quebrou tudo,
subimos de novo ao palco e, por nossa vez,
também quebramos tudo de novo.

E veio o Blindagem, com o novo vocalista
reencarnando o Ivo e quebrando tudo novamente,

e então,
depois de tantos instantes impressionantes,

vieram os Mutantes, com os originais integrantes
Serginho na guitarra,
Dinho Paes Leme nas baquetas,
e os novos atualmente Mutantes
(tem um curitibano nessa parada)
e agora só posso terminar com o poema imediato
feito pelo Fábio Elias e por este que aqui delira
com pé firme na realidade:

A VIDA EM CURITIBA

pro Leminski, foi meio que uma pedreira.
A vida em Curitiba já foi um Prado Velho,
mas hoje está que é um Bairro Novo,
e nenhum Sítio Cercado,
nenhuma Barreirinha
nos impedirão de abrir este Portão:

Curitiba evolui a cada segundo
e hoje o símbolo da cidade
é o Novo Mundo!


Minha filha Rúbia e Sérgio Dias Baptista (foto: Gianna Roland)


Edson de Vulcanis, Jorge Barbosa, Luiz Felipe Leprevost e Ivan Justen Santana, no palco do Parque do Semeador, em Curitiba: a poesia é boa e o povo gosta! (foto: Gianna Roland)


Eu & Gianna (foto: Ivan)


Serginho, em lótus espiritual com a guitarra, a meio metro de nós, encantando a multidão. (foto: Gianna)


Eu, incrédulo e em êxtase, naquele instante-Mutante. (foto: Gianna)


Tietagem no camarim: Serginho e Gianna, após o espetáculo. (foto: Rúbia)

terça-feira, maio 04, 2010

Pangur Bán, um felino trilíngue...

O poema original foi escrito em gaélico, e é atribuído a um monge irlandês, do século IX.
A tradução em inglês foi feita por Robin Flower.
Terminei esta versão brasileira hoje. Dedico a versão e a postagem a Ana Guimarães e seu blog O GOZO DA LETRA, no qual conheci este magnífico poema.

Pangur Bán
Pangur Bán

Pangur Ban

Messe agus Pangur Bán,
cechtar nathar fria shaindán:
bíth a menmasam fri seilgg,
mu menma céin im shaincheirdd.

I and Pangur Bán my cat

`Tis a like task we are at:
Hunting mice is his delight,
Hunting words I sit all night.
Eu e meu felino Pangur Ban,
Eis nossa filosofia vã:
Caçar ratinhos é seu deleite,
Caçando letras eu passo a noite.

Caraimse fos, ferr cach clú
oc mu lebrán, léir ingnu;
ní foirmtech frimm Pangur bán
caraid cesin a maccdán
Better far than praise of men

`Tis to sit with book and pen;
Pangur bears me no ill will
He too plies his simple skill
Muito melhor que aplauso mortal
É estar aqui com livro e penal;
Pangur concorda que a escolha é boa:
Na caça também se aperfeiçoa.

Ó ru biam, scél gan scís
innar tegdais, ar n-óendís,
táithiunn, díchríchide clius
ní fris tarddam ar n-áthius
'Tis a merry thing to see

At our tasks how glad are we,
When at home we sit and find
Entertainment to our mind.
Dá gosto ver a paixão feroz
Que dedicamos, os dois a sós,
Quando nos pomos alegremente
A contentar nosso corpo e mente.

Gnáth, húaraib, ar gressaib gal
glenaid luch inna línsam;
os mé, du-fuit im lín chéin
dliged ndoraid cu ndronchéill
Oftentimes a mouse will stray

In the hero Pangur`s way;
Oftentimes my keen thought set
Takes a meaning in its net.
Frequentemente um ratinho sói
Passar em frente a Pangur, o herói;
Frequentemente meu pensamento
Captura a ideia de um argumento.

Fúachaidsem fri frega fál
a rosc, a nglése comlán;
fúachimm chéin fri fégi fis
mu rosc réil, cesu imdis.
`Gainst the wall he sets his eye

Full and fierce and sharp and sly;
`Gainst the wall of knowledge I
All my little wisdom try.
Colado à parede, o gato vê
Com raro olho vivo, agudo em V;
Colado à parede do saber,
A percepção eu tento estender.

Fáelidsem cu ndéne dul
hi nglen luch inna gérchrub;
hi tucu cheist ndoraid ndil
os mé chene am fáelid.
When a mouse darts from its den,

O how glad is Pangur then!
O what gladness do I prove
When I solve the doubts I love!
Quando um ratinho surge da fresta
Ah, que alegria Pangur infesta!
Mesma alegria infesta meu eu
Se alguma questão se resolveu!

Cia beimmi a-min nach ré
ní derban cách a chéile
maith la cechtar nár a dán;
subaigthius a óenurán
So in peace our tasks we ply,

Pangur Bán, my cat, and I;
In our arts we find our bliss,
I have mine and he has his.
Assim, tranquilos, em santa paz,
Eu e Pangur, meu felino audaz,
Fruímos nossa iluminação,
Eu, no silêncio; ele, na ação.

Hé fesin as choimsid dáu;
in muid du-ngní cach óenláu;
du thabairt doraid du glé
for mu muid céin am messe.
Practice every day has made

Pangur perfect in his trade;
I get wisdom day and night
Turning darkness into light
A prática diária do exercício
Fez Pangur perfeito em seu ofício;
E, noite e dia, o saber me aduz
A transformar as trevas em luz.

Aistrithe ag Robin Flower
Translated by Robin Flower

Versão brasileira: Ivan Justen Santana