*
Sem meio nem caminho ou sequer pedra
Dalguma tradição (mesmo mais nova),
Na selva hipercinzenta que não medra
Num tempo atemporal de velha cova,
Me achei num limbo – placa: Paraná.
Um ente então piscou na treva torva
Feito se ali não fosse aqui nem lá –
Fosse ente diferente de seu ego,
Futuro a ser, passado que será.
Não era algum fantasma em desapego,
Tampouco um louco trasgo envolto em visgo.
Tratava-se do velho Bento Cego,
Cantor de redondilhas, nunca misgo
Nas rimas de improvisos mais certeiros
Que aqueles que de vez em quando eu fisgo
Até nos reservados dos banheiros.
Os olhos do poeta eram faróis
Iluminando sons, gostos e cheiros,
E ele me perguntou: “Por mim te dóis?
Machuca-te eu estar no esquecimento?”
E eu quis dizer-lhe que entre os meus heróis
Seu vulto era mais firme que cimento.
Porém não houve tempo. Repentino
O repentista se desfez num vento
O qual soprava feio, forte, fino,
Da direção da realidade humana.
Mas eu me recusava ao frio destino
De retornar a um mundo que só engana,
E assim no limbo ali dobrei a aposta
Na inexistência pura, boa, insana:
E aí me apareceu, qual mesa posta,
Outra figura, branca, meiga, longa,
Que em vida se chamou Júlia da Costa.
“Como eu não me afoguei na Babitonga,
Me alegro em ver você escrevendo assim...”
Foi feito algum feitiço de milonga
Saber que aquela voz vinha pra mim,
E todo o Romantismo dessa Júlia
Talvez já me bastasse como um fim.
No entanto o vento, novamente pulha,
Soprou levando a triste e malfadada,
E me foi necessária força hercúlea
Pra não voltar à Terra devastada.
Eu suspeitava mais, desde o princípio,
Que a sugestão de tudo, ou mais que nada,
Ao limbo, mais que estado ou município,
Tornava em dimensão jamais prevista,
Em verbo além gerúndio e particípio,
Na graça duma nuvem simbolista.
E a nuvem eram poucos e eram muitos,
A ouvido, língua, pele, nariz, vista –
Caleidoscópicos curtos circuitos
Tangidos dum saudável brilho insano
De músicas, imagens, tons fortuitos –
Vinham Dario, Silveira e Emiliano,
E Nestor Victor, Rocha Pombo, Adolfo
Werneck e outros junto a este Capistrano,
Rompendo ritmos e envolvendo em golfos
De rufos, de tambores, de fanfarras,
Rindo e chorando ao lado do balofo
Emílio com inda afiadas garras –
Eu percebia que era sonho e que era
Também fruto das minhas próprias marras
De cultivar com asas e com cera
Um pensamento que não há quem pense –
E os vultos proclamavam-me: “Pudera!
Existe a poesia paranaense!
Mesmo escandida em metros pés quebrados,
Mesmo se à crítica ela não convence!”
E festejamos livres kolodys leminskis por marcos e prados...
IJS
* * *
Assinar:
Postar comentários (Atom)
3 comentários:
Os poetas mortos, vivos em versos...
Que baitas decassílabos ivânicos!
maravilha, ivan, uma beleza de paródia!!!
a máquina do cu-do-mundo...
abçs.
Postar um comentário