segunda-feira, abril 14, 2008

Menipeando a sonetagem...

Soneto é um tipo de vírus que a gente contrai e não é fácil largar mão - quando você se flagra, já começou a calcular as rimas e a escandir o verso em decassílabos.
Nos idos do milênio passado, quando comecei a descobrir a poesia, abominava a técnica parnasiana, e, apesar de nunca ter deixado de idolatrar as sonetagens simbolistas, se me dissessem que dali a uns vinte anos eu estaria perpetrando algo remotamente semelhante a um soneto, seria pior que a última das ilusões perdidas.
Este intróito em prosa não redime nada, mas serve pra me autojustificar, porque vou postar aqui mais um soneto, e ver se na seqüência me livro da infecção - quem sabe um poema visual seja o antídoto, mas ficou difícil desencalacrar um esqueleto tão pronto, que só precisa do recheio carnoso das palavras pra ficar um monstrinho tão cheio de graça...
Senão vejamos...

1, 2, 3, 4, ... , 31

Parte de mim sente um ódio brutal
Sempre que lê as coisas que escrevi:
– Como você pôde, pobre animal,
Matar o lirismo que estava ali? –
Outro pedaço não chega ao extremo,
Perdoa refrão aqui, versinho lá:
– Com essa rima opulenta até tremo,
Mas o teor abstruso, pô: não dá! –
As partes promíscuas que agora admitem
Mais um soneto feito item por item
Nutrem a crença com força de fé –
Que um dia eu redima tantos maus modos
E ao bater trinta-e-um-meu-salva-todos
Mostre a pureza do amor como ela é.

3 comentários:

Giuliano Gimenez disse...

não era trinta e três?

[el poetito dançando tango]

Ivan, tô sapecando muito o seu jeito maroto e coerente na escrita. Ela começa a tomar corpo de vida.

Anônimo disse...

Muito bom!

Eu diria vício, e os bons devem ser mantidos.

Bater o trinta e um não é como o jogo vinte e um?

Ivan disse...

Grato pelos comentários, vou tentar explicar - nos idos do milênio passado, quando eu era criança e brincava de esconde-esconde, costumava-se contar até 31 (quem ia procurar) e quando alguém conseguia driblar este primeiro infeliz, e bater sua "liberação", no ponto onde o infeliz tinha contado, gritava "31 e 1 meu" - e se fosse o último, podia bater "31 meu salva todos", redimindo quem tivesse sido achado, e fazendo o infeliz ter que contar de novo -

tá - não ficou bem claro, mas enfim... acho que quem já foi criança e brincou de esconde-esconde entendeu - e eu nem precisava ter explicado - de qualquer modo, azar.