terça-feira, fevereiro 22, 2005

Na casa 23

*
Na casa vinte e três
existem duas jogadoras de xadrez.
Duplo fascínio: branca e negra.

O tabuleiro treme na vez
das brancas: troiana e grega
delicadas destroem os trebelhos,
pupilas faíscam pelos espelhos,
lances velhos, novas combinações,
sangue veloz nas veias, tentações,
cenas estáticas que se sucedem, e então


um golpe tático!
Previsto muito à frente,
um sacrifício calculado:

as negras entregam material
pra ganhar inevitavelmente
no final.

4 comentários:

Zoe de Camaris disse...

Se os poetas fossem menos patetas


Se os poetas fossem menos patetas
E se fossem menos preguiçosos
Faziam toda gente feliz
Para poderem tratar em paz
Dos seus sofrimentos literários
Construíam casas amarelas
Com grandes jardins à frente
E árvores cheias de zaves
De mirliflautas e lizores
De melharufos e toutiverdes
De plumuchos e picapães
E pequenos corvos vermelhos
Que soubessem ler a sina
Havia grandes repuxos
Com luzes por dentro
Havia duzentos peixes
Desde o crusco ao ramussão
Da libela ao papamula
Da orfia ao rara curul
E da alvela ao canissão
Havia um ar novo
Perfumado do odor das folhas
Comia-se quando se quisesse
E trabalhava-se sem pressa
A construir escadarias
De formas antes nunca vistas
Com madeiras raiadas de lilás
Lisas como elas sob os dedos

Mas os poetas são uns patetas
Escrevem para começar
Em vez de se porem a trabalhar
E isso traz-lhes um remorso
Que conservam até à morte
Encantados de ter sofrido tanto
Dedicam-lhes grandes discursos
E são esquecidos num dia
Mas se trabalhassem mais
Só seriam esquecidos em dois


BÓRIS VIAN
Canções e Poemas
Ed. Assírio e Alvim
Lisboa/ Coleção Rei Lagarto

Carla disse...
Este comentário foi removido por um administrador do blog.
Carla disse...

Tinha um erro de digitação.
***
Eu queria dizer que o número da casa á 22 - confirmei há pouco.

Carla disse...

é
é
é