quinta-feira, dezembro 29, 2005
Tudo que você queria
Você queria escrever sobre si mesmo diretamente, em vez de usar esse truque retórico aprendido lendo gibi do Mestre do Kung Fu.
Você queria controlar seus impulsos primitivos e suas pulsões autodestrutivas.
Você queria assimilar finalmente que não adianta ficar querendo as coisas sem fazer os esforços necessários para elas acontecerem.
Você queria que o vinho não tivesse acabado dez minutos atrás.
Você queria acender um cigarro ou dois...
Você queria não usar reticências pra dar a entender tudo aquilo que quem ler não vai ter uma idéia completa do que é...
Você queria não lembrar da frase que sua filha construiu "ela sempre não fazia isso", quando você a corrigiu, ensinando o uso da palavra "nunca", sendo que o que você queria e devia mesmo era ensiná-la a nunca usar a palavra "nunca"...
Você queria estar num lugar sempre nunca, junto com a sua nunca, aquela que romanticamente é sua nunca de sempre, e que você nunca sabe definir nem sabe mesmo amar como nunca.
Você queria saber amar, você queria saber se livrar das suas babaquices, da sua congênita falta de educação, da sua vontade de ser o que não é.
Você queria parar com essas postagens golcontra típicas desse período de festas quando quem está triste fica ainda mais triste.
Você queria.
Mas não pode.
Bem feito pra você.
sábado, dezembro 24, 2005
- Péssimo dia pra você também...
- Eu sei...
- Sabe?
- É: posso dizer?
- Se você insiste...
- Bom: você acordou com aquela sensação.
- Qual delas?
- Aquela uma que você tem curtido muito ultimamente...
- Desenvolva, elabore, ou melhor: desenrole...
- É assim: sensação de "tudo errado": você acorda e vê que está no lugar errado, na hora errada, na situação errada, e aí num átimo você sente que fez tudo errado, retroativamente até pelo menos três anos atrás, e aí pensando melhor você recua uns sete anos atrás, e percebe (ou experimenta) um gosto de que sua vida tem sido um erro (uma patetice, uma tolice, etc) seguido por outro, e mais outro e mais outro...
- Pois é.
- Gostaria que você não olhasse mais pra mim...
- Tá: vou sair da frente do espelho antes que ele quebre...
- Certo: tenha um péssimo dia!
- Você também: tenho certeza que vai ser pior que você pensa!
- Incrível como a gente consegue concordar, mesmo sendo a mesma pessoa...
- É verdade: vê se bagunça um pouco mais essa nossa vida por nós, hein?
- Deixa comigo...
terça-feira, dezembro 20, 2005
Postagem de Registro
eu tinha que ter embarcado
de qualquer jeito:
eu sei, foi um gesto atabalhoado,
mas se eu estivesse menos apaixonado
não teria feito.
segunda-feira, dezembro 19, 2005
Dias estranhos
dias estranhos nos rastrearam pelo faro
eles vão destruir nossa alegria
de cada dia
temos que seguir tocando
ou achar outra freguesia
olhos estranhos
preenchem quartos estranhos
vozes vão sinalizar seu final cansado
a hospededeira está sorridente
seus hóspedes dormem após o pecado
me escute falar em pecado
e você saberá que é isso aí
dias estranhos nos acharam
e através de suas horas estranhas
vamos permanecer solitários
corpos confusos
memórias abusadas
enquanto fugimos do dia
até uma noite estranha
de cara chapada
(decalque brasileiro de Strange Days, dos Doors)
domingo, dezembro 18, 2005
Horror e rancor de um perdedor
sábado, dezembro 17, 2005
Pra minha musa da tragédia
Levou sua beleza própria
e também a nossa belezinha feita em casa.
Levou sua raiva e sua personalidadezinha difícil.
Deixou só umas tragédias pra eu matar no peito.
Hoje é um dia bem apropriado pra cantar
a minha musa da tragédia.
O dia nasceu azul e vai se acinzentando,
estou me sentindo banalmente triste,
aquela velha tristeza de se achar o último e pior.
Me ataca também,
feito um pronome oblíquo no início da frase,
a dor na consciência por ter machucado tanta gente,
que na verdade é a dor
de ter me machucado a mim mesmo, somente.
De repente aparece uma rima,
súbita surge uma lindeza aqui ou ali,
mas esse canto tem que ser feio, mal feito,
feito só do jeito que eu posso fazer agora:
porca,
irregularmente,
com cara de nenhum amigo.
Isso porque eu ia cantar a minha musa da tragédia
e só consigo mesmo me queixar,
falar de mim,
falar dos próprios versos que vou arrematando,
matando, atando, arre:
nenhum trocadilho que preste pode salvar
ou redimir por um mínimo instante
este pretenso poetastro
que tenta cantar mais uma musa ausente.
Melpômene, Melpômene:
teu nome quer dizer "melodiosa",
também sinônimo de "coro":
quanta ironia:
usar esse tom antimusical,
esses versos capengas,
esse perrengue poético,
esse sentimento de não ser capaz de nada melhor,
pra homenagear você,
minha Melpômene de vila, de subúrbio,
de cu do mundo mesmo.
Mas eu não posso parar de me arrastar,
sub-repticiamente,
com todo esse vocabulário crocodiliano,
com todas essas lágrimas de lagartixa,
evoluindo não pra trágico antagonista,
mas pra anta agonizante.
Pronto.
Eu sei que ainda podia ser pior,
mas está péssimo já do jeito que está.
Na pretensão de escrever um poema em linha torta,
quebrada,
amarfanhada,
fica aqui pra todos botarem defeito
a repetição desrepetida da tragédia
que ando encaçapando no peito:
a musa eu rebati pra linha do escanteio:
não consegui: chamei e ela não veio:
se fiz outro poema horrível,
então vai um poema e meio:
assim
não tem mais poeta em mim:
matei-o.
domingo, dezembro 11, 2005
Museu
Filho de Antífemo (ou de Êumolpo) e de Selene (a Lua), e discípulo de Orfeu (ou seu amigo, ou mestre, ou filho, ou apenas contemporâneo ou alguém que passava ali num momento de distração, conforme as fontes).
Era considerado um músico exímio, a exemplo de Orfeu, de quem talvez fosse apenas uma duplicação ou um sósia, ou um clone, ou um Doppelganger capaz, como este último, de curar os doentes e fazer os animais dançarem e as pedras cantarem e as nuvens se autoesculpirem em forma de partituras gordas e o sol nascer redondinho redondinho bem cedinho com sua música.
Ele seria também adivinho e se lhe atribui (notem-se os pronomes bailando: e se lhe atribui: como é linda a gramática quando se nos acontece...) a introdução dos mistérios eleusínicos na Ática.
[Transcrição comentada por mim mesmo do verbete Museu (G. Musaios). do
DICIONÁRIO DE MITOLOGIA GREGA E ROMANA
KURY, Mário da Gama. Jorge Zahar Editor, sem data.
quinta-feira, dezembro 08, 2005
Tempo das Musas
Dias estranhos nos encontraram... (Strange days have found us...) Ah: outro dia eu pósto a tradução dessa canção dos Doors - por sinal, feliz aniversário para James Douglas Morrison... O caso é que o mundo insiste em girar mais rápido que minha digitação catamilhesca e minha atitude estilo bicho-preguiça com dengue, então não comentei duas coisinhas fofas sacramentadas no domingo passado, a saber: a queda do time coxinha pra segunda divisão, e a colocação do Atlético como melhor clube paranaense nesse conturbado campeonato brasileiro. Porém, eu vinha numa onda de poemas para as minhas musas e ainda nem fiz o primeiro tchan, que dirá o tchum... Enfim, como um bom vagau, pesquisei num dicionário de mitologia sobre as nove musas, filhas de Mnemosine (a Deusa da Memória) e do todo-poderoso Zeus: senão vejamos: Calíope - Musa da Poesia Épica Clio - Musa da História Erato - Musa da Poesia Lírica Euterpe - Musa das Flautas Melpômene - Musa da Tragédia Polímnia - Musa dos Hinos Sagrados Talia - Musa da Comédia Terpsícore - Musa da Dança Urânia - Musa da Astronomia Depois de quebrar muito a cabeça (e a cara), consegui escalar uma seleção de musas da minha vida que corresponde a esse time grego, pelos devidos motivos: mas essa lista fica pra depois: por enquanto é só. |
quarta-feira, dezembro 07, 2005
As últimas horas do começo de todos os tempos
faz tempo que não apareço,
então aí está uma postagem impromptu,
sobre esta noite,
ou melhor,
ontem à noite:
eu ontem fui ao Wonka,
beber umas d(ó)sinhas:
confesso que gostei
de ambas as cozinhas:
a cozinha do bar
nos serviu uma bruschetta à mexicana,
pra esquentar a cerveja na garganta:
e a cozinha de baixo e bateria
(com Rubens K e meu querido amigo Xeque-Mate)
preparou cama mesa & banho
pro (tenho que admitir, embora o egão poético aqui chie e se contorça) grande poeta, tradutor e violonista
Rodrigo Garcia Lopes,
da benfazeja Londrina...
Muito bem,
chega de rasgar toda essa seda:
poesia, poetas & poetisas
me perseguem pela alameda:
saio pela esquerda:
ressaca, dor-de-cabeça,
febre, delírio hipnótico
e muita dita e ouvida merda.
quinta-feira, dezembro 01, 2005
De ressaca a gente sofre melhor
eu nunca te vejo:
por isso, vou postar tudo isso
em versos invisíveis