quarta-feira, agosto 23, 2006

OU ES-TU

ONDE ESTÁS

Je voudrais te parler cristal fêlé hurlant comme un chien dans une nuit de draps battants
comme un bateau démâté que la mousse de mer commence d´envahir
où le chat miaule parce que tous les rats sont partis
Eu queria te falar cristal fendido uivando como um cachorro numa noite de panos drapejantes
como um barco desmastreado que a espuma do mar começa a invadir
onde o gato mia pois todos os ratos se foram
Je voudrais te parler comme un arbre renversé par la tempête
qui a tellement secoué les fils télégraphiques
qu´on dirait une brosse pour les montagnes pareilles à la machoire inférieure d´un tigre
qui me déchire lentement avec un affreux bruit de porte enfoncée

Eu queria te falar como uma árvore estatelada pela tempestade
que sacudiu de tal maneira os fios telegráficos
que dir-se-ia uma escova para as montanhas semelhantes à mandíbula inferior dum tigre
que me dilacera lentamente com um ruído apavorante de porta forçada
Je voudrais te parler comme une rame de métro en panne à l´entrée
d´une station où je pénètre avec une écharde dans un orteil pareil à un oiseau dans une vigne
qui ne donnera pas plus de vin qu´une rue barré
oú j´erre comme une perruque dans une cheminée
qui n´a plus rien chauffé depuis si longtemps
qu´elle se croit le comptoir d´un café
où les cercles laissés par les verres dessinent une chaîne
Eu queria te falar como uma seção de metrô em pane na entrada

duma estação na qual penetro com um espinho num artelho semelhante a uma ave numa vinha
que não dará mais vinho que uma rua barrada
onde eu erro como uma peruca numa chaminé
que não aquece nada já faz tanto tempo
que ela pensa agora que é um balcão dum café
onde os círculos deixados pelos copos desenham uma corrente
Je te dirais simplement
que je t´aime comme le grain de blé aime le soleil se levant en haut de sa tête de merle
Eu te diria simplesmente
que eu te amo como o grão de trigo ama o sol erguendo-se no alto de sua cabeça de melro


Benjamin Péret
Ivan Justen Santana & Priscila Manhães

segunda-feira, agosto 21, 2006

Pra não passar meio batido...

Pra não passar meio batido nos comentários, agradeço nessa postagem epilogal as manifestações de apreço (bem como as observações sagazes) da parte de

Alexandre França, Zoe de Camaris, Bárbara Lia, Beco Prado, Marcelo Trancoso e Nyha (cujo blog encontros com o vampiro eu ainda não li nem vi, mas já gostei, se é que eu não amo quando me chamam de Ivampiro... *gargalhadas nosferáticas*)

sobre a terça passada no Wonka - por sinal, amanhã vai ter mais bacanagens poéticas por lá, como de costume, e estarei presente (na assistência, desta feita..) - não perdam de novo...

Agradeço também o poeta Batista de Pilar, a quem prometi declamar versinhos que por lapso meu não mandei lá: aí vão...


Meu amigo, o poeta Batista de Pilar

Meu amigo, o poeta Batista de Pilar
entra no bar feito quem sai de casa,

feito quem está prestes a cantar
a última canção.

___________Pare com a cachaça,
Batista! eu digo ao lhe passar o copo,

e apenas um olhar dele me arrasa,
e se é pra beber todas logo eu topo...

E então bebemos toda a madrugada,
e declamamos todos os poemas, sem

pestanejar.
________- Não devemos nada,
Batista, não devemos a ninguém!

E ouvindo a minha frase assim errada,
Batista sai do bar com só uma ponta

de alegria,

________e eu fico, pra pagar a conta.

sexta-feira, agosto 18, 2006

- Positivo, copiamos tudo, Wonka Loquax: câmbio final...

Eta que o juvenil aqui não deixa por menos na empáfia...

Então digo mais: esqueci de mencionar os versinhos em japonês que destrincei na fatídica terça, com direito a tradução comentada (e de fato eu traduzi tudo que disse, "menas" o começo da Celebration of the Lizard, que mandei no início do início, e que era pra verter ao português no final - o qual acabou não sendo bem um final - talveliz perhapiness "um fim que começa" - pra recordar um poema em parceria com o polacodabarreirinha...)...

E visto que eu prometi versinhos, pra encerrar de vez o ensejo, aqui vão dois poeminhas minimalistinhas e iconoclastinhas a seu modo - dado que se reportam a grandes canções de máxima emotividade. O primeiro é do irrefragável Paulo Leminski, e o segundo é deste seu criado (que pegou essa mania agora...):



lamente
uma
___vez

_______

sem ti
nem tal
eu sou

quarta-feira, agosto 16, 2006

- Aqui é Loquax Wonka: estamos te ouvindo: alto e claro, câmbio...

Pois então: atendendo a curiosidade geral e particularmente a de Gisele Trierweiller:

o evento foi muito dialógico - a assistência colaborou e interferiu com aplausos, sorrisos, gargalhadas desbragadas, e até mesmo sinais de desrespeito alcoolizado que contribuíram muito pra distender a cancha e a paciência deste vosso criado...

Mandei poemas em grego, latim, provençal, russo, inglês - e até mesmo em português (inclusive versinhos de minha lavra...) - falei quase tudo que tinha calculado - disse quase todos os versinhos que queria e quem sabe até precisava e não precisava dizer.

Agradeço aos amigos todos pela força (inclusive ao Lepre, que não estava lá, mas manifestou antecipadamente o apoio), especialmente na pessoa do Alexandre França, que chegou mesmo a exarar prontamente um poema de rebote em referência aos interessantíssimos incidentes ocorridos durante a função.

Agradeço também à Barbara Lia - e à Zoe de Camaris, para quem gastei versinhos felinos a serem devidamente reciclados no mês que vem - quando será a vez dela e eu tentarei modestamente coadjuvar.

Tenho que me reportar também ao Mario Domingues, que anfitriou tudo com toda a catega, e disciplinou também depois a homenagem ao Leminski, quando outros poetas puderam nos brindar com o que de melhor eram capazes...

Enfim: semana que vem tem mais - e hoje eu vou lá de novo, ouvir música indiana, fazer a opção culinária, e flutuar em direção ao satori que ainda bem que vai demorar pra me atingir...

Quanto aos versinhos, fica pra depois, valeu?

sábado, agosto 12, 2006

- Loquax Wonka, 15 do 8, câmbio...

E aí eu ia escrever um texto respondendo ao título, o que seria bem infanto-juvenil de minha parte, mas quem sabe seja melhor explicar:

nesta próxima terça-feira, 15 de agosto, no Wonka Bar (na Trajano Reis, ali onde era o Birinights... você sabe, não? ... é entre a Inácio Lustosa e a Paula Gomes, no meio da quadra, à esquerda de quem sobe e à direita de quem desce...), será finalmente a minha vez de ser jogado às feras amantes da poesia... A entrada são módicos R$1,99 - fora o que você vai consumir pra suportar as circunstâncias...

O bar abre às 21h e a função deve começar ali pelas 23h... Será uma oportunidade rara de ver e ouvir minha eloquência juvenil (esse é o título da bagaça que estou planejando), fora o fato de que na seqüência vamos todos prestar homenagem a Paulo Leminski (nós, quer dizer: todos os convidados e o público presente, ou seja: como diriam deus e o mundo e todos os anjos e demônios: junte-se a nós...)...

Além dos versinhos, prometo desde já que vou explicar a origem e o significado dos nomes Wonka e Loquax...

Não perdam.

domingo, agosto 06, 2006

Isso foi um assalto... E não tem o crédito da tradução...

ESCRITO COM TINTA VERDE

A tinta verde cria jardins, selvas, prados,
folhagens onde gorjeiam letras,
palavras que são árvores,
frases de verdes constelações.

Deixa que minhas palavras, ó branca, desçam e te cubram
como uma chuva de folhas a um campo de neve,
como a hera à estátua,
como a tinta a esta página.

Braços, cintura, colo, seios,
fronte pura como o mar,
nuca de bosque no outono,
dentes que mordem um talo de grama.

Teu corpo se constela de signos verdes,
renovos num corpo de árvore.
Não te importe tanta miúda cicatriz luminosa:
olha o céu e sua verde tatuagem de estrelas.

Octavio Paz

sexta-feira, agosto 04, 2006

Breton de novo, porque você disse claro...

A mulher-criança. É a sua entrada em todo o império sensível que sistematicamente a arte deve preparar. Esse deve ser o seu objetivo constante no seu triunfo, afugentando os morcegos com seu repugnante vôo silogístico enquanto os vagalumes tecem sob suas ordens o fio misterioso, o único que pode levar ao coração do labirinto. Essa criatura existe e, se ela não está investida da plena consciência do seu poder, não deixa de ser verdade que é ela que se vê de tempos em tempos fazer uma aparição na mudança de trilhos, comandar por um tempo curto as delicadas engrenagens do sistema nervoso. E é Balkis com seus olhos tão longos que mesmo de perfil parecem olhar de frente, e é Cleópatra na manhã de Actium, e é a jovem feiticeira de Michelet com seu olhar de matagal, e é Bettina perto de uma cascata falando para seu irmão e seu noivo, e é, mais oblíqua ainda só por sua própria impassibilidade, a fada com o grifo de Gustave Moreau, e és tu. Que recursos de felinidade, de devaneio a ponto de submeter a vida a si, de fogo interior a ponto de ir adiante das chamas, de esperteza a serviço do talento e, acima de tudo, de calma estranha percorrida pela luz da espreita, não estão contidos nesses instantes em que a beleza, como que para fazer enxergar mais longe, torna subitamente vã, deixa morrer para ela a agitação dos homens! De que força explosiva esses instantes não estão carregados! A figura da mulher-criança dissipa ao redor de si os mais bem organizados sistemas porque nada pôde fazer com que ela se submetesse a eles ou neles se incluísse. Sua compleição desarma todos os rigores, a começar, eu mal saberia dizê-lo a ela própria, pelos dos anos. Mesmo aquilo que a atinge fortalece-a, embrandece-a, refina-a ainda mais e para resumir completa-a como o cinzel de um escultor ideal, dócil às leis de uma harmonia preestabelecida e que nunca termina porque, sem a possibilidade de um passo em falso, ele está no caminho da perfeição e esse caminho não poderia ter fim. A irradiação subsiste, ou melhor, é a estátua inteira, ainda mais bela se possível fosse, que, despertando para o imperecível sem nada perder de sua aparência carnal, faz sua substância com um sublime cruzamento de raios.

Arcano 17 (página 51)

tradução: Maria Teresa de Freitas & Rosa Maria Boaventura