Hoje é aniversário de William Shakespeare.
Aniversário de nascimento e morte.
Curioso, não?
Mais curioso ainda é a idade que ele completa, a qual (pelo menos pra mim) exerce um fascínio meio idiota, uma estupidez que talvez entenda quem já ficou de madrugada assistindo ao relógio digital transmitido pelas emissoras de TV junto com as faixas coloridas...
O momento em que os dígitos ficam todos iguais vira um acontecimento a ser comemorado, no mínimo com um esgar de sorriso e um pouco de baba escorrendo no canto da boca...
Pra não largar mão da minha tradição de poetastro, cometi a seguinte quadra de celebração:
Falar da idade do bardo é meio abstrato,
Mas por acaso alguém viu, neste mundo ingrato,
Que o velho Will, cuja obra eu também idolatro,
Faz hoje quatrocentos e quarenta e quatro?
De brinde extra, publico a seguir o que talvez sejam os únicos versos de Shakespeare ainda não traduzidos trocentas milhões de vezes em português – curiosamente, são os versos do seu epitáfio – será que foi ele mesmo o autor? – em qualquer caso, diz a lenda que estão inscritos na sua lápide – e deviam ter servido pra eu não me meter a besta de mexer com a figurinha mais carimbada da literatura universal...
Good friend, for Jesus´ sake forbear
To dig the dust enclosed here;
Blessed be the man that spares these stones
And cursed be he that moves my bones!
Bom amigo, pelo amor de Jesus não tente
Escavar a poeira que aqui jaz presente;
Bendito aquele que poupar estes destroços,
E maldito seja quem mexer nos meus ossos!
quarta-feira, abril 23, 2008
domingo, abril 20, 2008
Mais uma colagem...
Você traiu seus próprios sentimentos,
Brincou de vida feito nem ligasse,
Se fez de bobo e disse em versos lentos
Não conhecer nem mais a própria face.
Você prossegue com seu ego enorme
Como se a indulgência comprovasse
Que mesmo quando a consciência dorme
Uma terzina usada ainda a redime.
Você acredita que nesse uniforme
Sua poesia esconde qualquer crime,
Podendo mesmo se fazer verdade
E revelar a imagem mais sublime.
Porém a própria artificialidade
Que com desplante você leva adiante,
Não importando o quanto e a quem agrade,
Só se revela mesmo redundante.
Você devia era criar vergonha,
Em vez de se arvorar aos pés de Dante,
Substituindo essa ilusão bisonha
Por humildade em doses cavalares.
E se de fato você ainda sonha
Em superar contudos e apesares,
Vai ter que detonar seu egoísmo,
Purgando esses infernos pelos ares,
Vai ter que reencontrar o seu lirismo,
Ter mais pureza, não fazer mais cenas,
Atravessar abismo após abismo,
E, pelo jeito, as chances são pequenas.
Brincou de vida feito nem ligasse,
Se fez de bobo e disse em versos lentos
Não conhecer nem mais a própria face.
Você prossegue com seu ego enorme
Como se a indulgência comprovasse
Que mesmo quando a consciência dorme
Uma terzina usada ainda a redime.
Você acredita que nesse uniforme
Sua poesia esconde qualquer crime,
Podendo mesmo se fazer verdade
E revelar a imagem mais sublime.
Porém a própria artificialidade
Que com desplante você leva adiante,
Não importando o quanto e a quem agrade,
Só se revela mesmo redundante.
Você devia era criar vergonha,
Em vez de se arvorar aos pés de Dante,
Substituindo essa ilusão bisonha
Por humildade em doses cavalares.
E se de fato você ainda sonha
Em superar contudos e apesares,
Vai ter que detonar seu egoísmo,
Purgando esses infernos pelos ares,
Vai ter que reencontrar o seu lirismo,
Ter mais pureza, não fazer mais cenas,
Atravessar abismo após abismo,
E, pelo jeito, as chances são pequenas.
segunda-feira, abril 14, 2008
Menipeando a sonetagem...
Soneto é um tipo de vírus que a gente contrai e não é fácil largar mão - quando você se flagra, já começou a calcular as rimas e a escandir o verso em decassílabos.
Nos idos do milênio passado, quando comecei a descobrir a poesia, abominava a técnica parnasiana, e, apesar de nunca ter deixado de idolatrar as sonetagens simbolistas, se me dissessem que dali a uns vinte anos eu estaria perpetrando algo remotamente semelhante a um soneto, seria pior que a última das ilusões perdidas.
Este intróito em prosa não redime nada, mas serve pra me autojustificar, porque vou postar aqui mais um soneto, e ver se na seqüência me livro da infecção - quem sabe um poema visual seja o antídoto, mas ficou difícil desencalacrar um esqueleto tão pronto, que só precisa do recheio carnoso das palavras pra ficar um monstrinho tão cheio de graça...
Senão vejamos...
1, 2, 3, 4, ... , 31
Parte de mim sente um ódio brutal
Sempre que lê as coisas que escrevi:
– Como você pôde, pobre animal,
Matar o lirismo que estava ali? –
Outro pedaço não chega ao extremo,
Perdoa refrão aqui, versinho lá:
– Com essa rima opulenta até tremo,
Mas o teor abstruso, pô: não dá! –
As partes promíscuas que agora admitem
Mais um soneto feito item por item
Nutrem a crença com força de fé –
Que um dia eu redima tantos maus modos
E ao bater trinta-e-um-meu-salva-todos
Mostre a pureza do amor como ela é.
Nos idos do milênio passado, quando comecei a descobrir a poesia, abominava a técnica parnasiana, e, apesar de nunca ter deixado de idolatrar as sonetagens simbolistas, se me dissessem que dali a uns vinte anos eu estaria perpetrando algo remotamente semelhante a um soneto, seria pior que a última das ilusões perdidas.
Este intróito em prosa não redime nada, mas serve pra me autojustificar, porque vou postar aqui mais um soneto, e ver se na seqüência me livro da infecção - quem sabe um poema visual seja o antídoto, mas ficou difícil desencalacrar um esqueleto tão pronto, que só precisa do recheio carnoso das palavras pra ficar um monstrinho tão cheio de graça...
Senão vejamos...
1, 2, 3, 4, ... , 31
Parte de mim sente um ódio brutal
Sempre que lê as coisas que escrevi:
– Como você pôde, pobre animal,
Matar o lirismo que estava ali? –
Outro pedaço não chega ao extremo,
Perdoa refrão aqui, versinho lá:
– Com essa rima opulenta até tremo,
Mas o teor abstruso, pô: não dá! –
As partes promíscuas que agora admitem
Mais um soneto feito item por item
Nutrem a crença com força de fé –
Que um dia eu redima tantos maus modos
E ao bater trinta-e-um-meu-salva-todos
Mostre a pureza do amor como ela é.
terça-feira, abril 08, 2008
FEITO ESQUECENDO...
Feito esquecendo as pulsões mais brutais
Encantasse fácil as almas puras
E administrando delícias nos sais
Das palavras travadas de amarguras
Pudesse mesmo arrelvar com carícias
As passadas pesadas de rotinas
Sem que o medo patético partisse as
Rimas com saturações assassinas,
Eu levaria os versinhos na veia
Feito o flautista aos ratos da aldeia
E aos obrigados diria: de nada!
Mas tem sempre um porém em toda via
E a minha inspiração ficou vazia
Lamentando a saliva derramada.
Encantasse fácil as almas puras
E administrando delícias nos sais
Das palavras travadas de amarguras
Pudesse mesmo arrelvar com carícias
As passadas pesadas de rotinas
Sem que o medo patético partisse as
Rimas com saturações assassinas,
Eu levaria os versinhos na veia
Feito o flautista aos ratos da aldeia
E aos obrigados diria: de nada!
Mas tem sempre um porém em toda via
E a minha inspiração ficou vazia
Lamentando a saliva derramada.
sexta-feira, abril 04, 2008
PÓS-DESCONSTRUÇÃO ARCAICA
Sentindo um cheiro pestilento, lento,
Levanto do meu leito estreito, eito,
No tique a que vivo sujeito, jeito
De santo que um dia arrebento, bento –
Notando o quanto me delata, lata,
Aquela sensação tamanha, manha,
A imagem da grande barganha, ganha,
É o nó que na garganta engata, gata –
E o surto a me levar consigo, sigo,
Em ânsia por amor e abrigo, brigo,
Tocando um som que, mesmo surdo, urdo –
Pois graças ao meu velho e cego ego
Entorto verso e rima e blogo, logo,
O nada que me dá, contudo, tudo.
Levanto do meu leito estreito, eito,
No tique a que vivo sujeito, jeito
De santo que um dia arrebento, bento –
Notando o quanto me delata, lata,
Aquela sensação tamanha, manha,
A imagem da grande barganha, ganha,
É o nó que na garganta engata, gata –
E o surto a me levar consigo, sigo,
Em ânsia por amor e abrigo, brigo,
Tocando um som que, mesmo surdo, urdo –
Pois graças ao meu velho e cego ego
Entorto verso e rima e blogo, logo,
O nada que me dá, contudo, tudo.
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