segunda-feira, outubro 31, 2011

CINCO HAICAIS OCASIONAIS À VIGÍLIA DE TODOS OS SANTOS

(para Ricardo Pozzo, Marilda Confortin, Alvaro Posselt, Tania Mara Chaiben, e Luiz Felipe Leprevost)

* * *


noite das bruxas:
de quem os cachos
que puxas?


* * *


afinados e desafinados
ensaiam pra ser celebrados
talvez só nalgum dia de finados


* * *


halloween diferente:
Curupira, de Michael Jackson,
dança o moonwalk pra frente


* * *


uma razão pra Walpurga:
o que a igreja suja
o diabo purga


* * *


infâncias felizes
curvas obscuras
travessuras ou gostosuras?


* * *

domingo, outubro 30, 2011

ORDEM E CAOS

“No início não era no início,
Abismo, buraco, precipício,
Hospital, penhasco, resquício,
Hospício, silício, vício, estropício”,

Disse o Caos e calou a boca.
Fechou o tempo. Voltou pra toca.

Conforme macho e fêmea concordem,
Bocas que se beijem mordem.
E antes que apocalipses acordem
Cosmos e átomo explodem em Ordem.

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sábado, outubro 29, 2011

7.000.000.000

Dia das bruxas, dia de você,
ou dia até de Curupira e Pererê,
compartilho o que descubro:

neste 31 de outubro,
neste mundo e nesta humanidade,
em meio ao sonho e à maldade,

entre religiões e fés, imo-
lações e amolações, nãos, sins,
abracadabras e sinsalabins,

nasce o nosso sétimo bilionésimo.


Ivan Justen Santana
(após interceptar a seguinte mensagem do enxadrista Henrique Marinho: "Cálculos preveem que no primeiro segundo do dia 31 de outubro de 2011 nascerá o ser humano (bebê) de n.º 7.000.000.000 ... seja bem vindo!)

quinta-feira, outubro 27, 2011

Em pleno surto poético...

PROCURA-SE DESESPERADAMENTE:

Pessoas boas que consigam festejar.
Que falem o que sentem bem como o que querem.
Que saibam ser gentis. Respeitem lar e bar.
Mantenham bom humor. E as que vierem e derem.
Que venham sim. Sutis. E demonstrem prazer.
Tanto em cumprimentar quanto em reconhecer.

Gente que leia mais. Frequente lançamentos
No veneno de ler. De avaliar as artes.
De verdadeiramente ampliar conhecimentos
E divulgar o que acha bom por quaisquer partes.
Um público que assista aos genuínos artistas.
Que aplauda sem ligar se assim vai dar nas vistas.

Alguém que não precise do choque de agora.
Que leia isto e tolere este tapa na cara.
Que entenda o que é linguagem. Som. Tom. Dor. Cor. Fora
Tudo mais que não cabe em rima pobre ou rara.
Quem ofereça a face. A fuça. A carapuça.
Fure-se a carapaça. Engula. Cuspa. Tussa.

Ivan Justen Santana
(27-10-2011)

quarta-feira, outubro 26, 2011

QUEM TEM MEDO DE DALTON TREVISAN?

(ou: PROSINHA MAIS QUE ORDINÁRIA)

Releio Em busca de Curitiba perdida:
a chance não merece o autor de Desgracida?

Conto umas seis menções expressas a Emiliano.
Desconto o humor: nenhum, na Negrinha acenando.

Contudo até que não se salva a Pensão Nápoles?
Não soa bem o tom deste último dos crápulas?

Não limpa a barra a graça deste aflito drácula?
À nossa sujeira é mais pura dele a mácula?

Se até não colho alexandrino sem cesura
(“um que se salve aos pulos da perninha dura”)

no agressivo Curitiba revisitada?
E essa A faca no coração? Melhor que nada.

Concedo: tem estilo o nosferatu. Lírico,
dramático, e até épico, além de satírico.

Será que desistiu então da própria morte
pra reescrever Canção do exílio que o conforte?

Tá bem. Eu sei. Vazou aqui o alexandrino.
E diante de Dalton eu menos que um menino.

Mas mijo na Cartinha a um velho prosador
e não perco o final: pau em seja quem for!

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domingo, outubro 23, 2011

EXTRA! EXTRA! DALTON TREVISAN TOMA UM CACETE E NEM FICA SABENDO

Vou tentar explicar, então tome fôlego quem quiser saber qual é.

Neste sábado, estava eu na casa do polaco da barreirinha quando com todos os fios de seu bigode ele repetiu e sublinhou que foram três os caras que lhe ensinaram a escrever boa prosa: Machado de Assis, Nelson Rodrigues e Dalton Trevisan (não por coincidência, o polaco usou muito o pseudônimo de Dalton Machado Rodrigues).

No domingo, o polaco postou no facebook uma foto do Dalton e um poema de homenagem, convidando os amigos a prestarem as suas respectivas celebrações da trevisânica figura.

Não resistindo ao convite, perpetrei a seguinte, que aqui intitulo

DAI A DALTON O QUE É DE JÉRSON,
E A TREVISAN, O QUE VEIO DE IVAN

Que vampiro? Gênio aonde?
Vai seguindo sempre em busca
dum estilo que se esconde
numa angústia tão patusca
que nem chega a ser de velho:
um fraquinho autoevangelho.

Sabe apenas pôr o dedo
na ferida se é a alheia:
possivelmente isso é medo
de pulsar a própria veia,
que mete nesse inseguro
um pavor de claro e escuro.

Mas não rimarei com dalton
rima nenhuma biônica.
Faço rimas só pros nêutrons
da prosa dele chatônica:
nem mil anos na salmoura
nem biotônico fontoura

não elevarão o status
deste literato cactus,
porque a lei de Jérson é
diminuir o cacife
pra ver se ainda para em pé
o seu conto de patife.

Assim prestei homenagem
a este Jérson Trevisan,
dos Daltons tem bandidagem,
muita prosa e pouco elã.

E o polaco que me aguente
pois ponho um pingo num i:
ninguém xinga impunemente
Emiliano e Kolody.


Ivan Justen Santana

sábado, outubro 22, 2011

RAPACIÊNCIA

Eu só ouço e obedeço.
Esse mundo é da obediência.
O valor é mais que o preço
E a medida é a paciência.

Mas se eu fosse um bom rapaz,
Obediente a toda classe,
Eu rimava como faz
A batata quando nasce.

Só que sou insuficiente.
Não obstante, digo quando
Certa voz me alerta a mente:
Sim, senhora, ao seu comando!

E a quem doma a vida e vence-a
Lego assim a rapaciência.

quarta-feira, outubro 19, 2011

EPÍLOGO DOS PEQUENOS POEMAS EM PROSA

De coração contente eu subo ao precipício
Dali de onde se enxerga toda esta cidade,
Prisão, bordel, inferno, purgatório, hospício,

Dos quais qual uma flor floresce a enormidade.
Tu sabes bem, Satã, meu guia na desgraça,
Que aqui no abismo o choro inútil não me invade;

Que feito o velho amante da velha devassa
Eu vim me embebedar dessa enorme vadia
Cujo charme infernal remoça quando passa.

E mesmo que ainda durmas nos lençóis do dia,
Surda, obscura, gripada, ou que ainda em afãs
Nos véus da tarde tu te exibas, joia fria,

Eu te amo, ó capital infame! As cortesãs
E os bandidos, às vezes são tais os prazeres
Incompreendidos pelas leigas massas vãs.

Charles Baudelaire
versão curitibana: Ivan Justen Santana

sexta-feira, outubro 14, 2011

O TEMPLO TODO

Impronunciavelmente,
numa pequena barreira
polaca e bem brasileira,
muito igual e diferente,

existe um templo da gente
do Oriente e até mineira.
Mais que só gente festeira,
gente muito inteligente.

Neste templo, o tempo todo
tem batuque e tem fanfarra,
tem godo, ostro e visigodo,

tem poesia que te agarra
numa algazarra tão zen
que o quintal tem Tao também.


(esta foi, obviamente, uma homenagem gratuita e merecida
ao Polaco da Barreirinha, sua casa, sua poesia e sua vida)

Ivan Justen Santana

quarta-feira, outubro 12, 2011

QUATRO RAPFASES DE VIVERPOOL

Nasci Lennon:
me mataram cedo.

Cresci McCartney:
parei de comer carne.

Envelheci Harrison:
uma faca no coração.

Morri Ringo:
super Starr.

* * *

Lincoln Fabricio [líder do Splipple Man]
Ivan Justen Santana [líder dos Dublês de Dublin]

domingo, outubro 09, 2011

A ESTRELA, A SEREIA E O BOBO

A Estrela Leminski, Jana Fellini e Monica Berger


Brilhava a Estrela um brilho raro:
Quarto crescente de manhã;
Qual um luar que sem forçar o
Raiar atinge Aldebarã.

“A luz e a cor posso escutar
Se vêm até profundos poços
Que em meu cantar têm seu lugar
Pra tornar ricos pobres moços...”

Assim falava o canto alado
De uma Sereia à Estrela então;
E um Bobo, bobisco, abobado,
Babava bolhas de sabão.

* * *

O SONHO DA SEREIA

Para Jana Fellini

“Serei a última?
Serei Lorelei ou só uma seara de cara da Iara?
Ou só uma única Uyara Torrente?
Seria o caso de simplesmente mergulhar na torrente?

Enquanto sua consciência suava e lutava,
o inconsciente da Sereia deslizava
qual metal desfeito em lava:

“Sim: sinto as origens no fundo de um épico,
como uma Ilíada em mares sempre dantes navegados;
sei que tudo pode virar só mais um texto dramático,
como um romance realista de personagens-gados
(ou mesmo drogados e estragados), mas ainda assim é lírico
o final infeliz de um clichê banal inédito, extático,
talvez em cirílico.

E o sonho da sereia buscava,
não um brusco Pã, nem um buscopan,
mas sim um brusco fim:
feito um regime político democrático e tirânico,
como se acha a atual liberdade que ri do pânico,
qual se ela disputasse algum combate titânico
e, ainda com as próprias escamas, acordasse
e lhe aparecesse esse poeta sem classe
que lhe dissesse:
Bom dia! Bem vinda a nove do dez do onze:
ouça agora os nossos sinos de bronze
numa rima de raros sons e
sinta o calor. Nada com nada se parece,
mas não se iluda: é tudo mecânico.
Beba uma tônica. A vida é crônica.
E hoje é outro dia ivânico.

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domingo, outubro 02, 2011

O FAUNO, AS NINFAS E O MOVIMENTO PUNK CURITIBANO

Chifres, dois, primeiro,
Emergia um fauno
Do raso ribeiro
No qual o vagau, no

Final do verão,
Enfim se banhava,
Qual se de um vulcão
Fosse a água que o lava;

Quando fedia tanto até pra si
Mesmo aquele egipã (filho de Pã
E duma putativa mãe que ri
A quem vem de tarde, noite e manhã),

Tão satiricamente então topava
Atirar o dúbio corpo no rio,
A título de banho: depois dava
Pra correr molhado sem passar frio;

Emergia assim o fauno,
Molhado e mais malicioso
Que um poeta botando sal no
Caldo ralo e malcheiroso
Dado a um hóspede orgulhoso;

Muito mais feliz que um Bozo,
E muito mais angustiado, o
Fauno molhado, dengoso,
Olhava pra todo lado
Com brilho no olhar afiado:

Eis lhe surgem visões mais que belas
Na sagrada e profana quantia
De três, sim, três visões, como estrelas
Numa cinta que ao fauno cingia,
E a linguagem a fim de escrevê-las
Curva turva treva e claro dia:

Que esporro não faria o fauno pelo mato
Se em vez de fauno fosse um malaco em mocó!
A primeira visão fê-lo de estupefato
Ao ‘fêla’ duma putrefata rata só! –

Era uma ninfa
Tirando chinfra
De mina punk –
Botando banca
Que a bota espanca
Quem quer que a espanque –

Cabelos verdes,
Nas meias redes
Que arrastam trouxas –
O fauno treme:
Figura o creme
Daquelas coxas.

Só que aquela era uma oréade das montanhas
Que falava um grego de inflexões estranhas:
“Qualé a tua, pé-de-bode, assim, limpinho?
Tá me achando aqui com panca duma puta?
Não sou raspa pra esse teu caminhãozinho.
Tchau, que eu já vou lá cuidar da minha gruta.”

E o nosso herói notou que dói
Não ser bem seu o dom de Orfeu.

Eis que surgiu por sua vez outra visão
Que torceria até do cego Homero a nuca;
Vamos falar o que é, sem mais enrolação:
Mais uma ninfa ao fauno a vista já cutuca...

Aquela tinha a trança tão vermelha
Que ferro, fogo e forja já ajoelha
E a curva da cintura tão macia
Súbita sinuosa desafia
Sob a chispa da pupila de esguelha:

Mais, de-
Mais da
Saia de
Náiade
Feita, a-
Jeita as-
Sim (com o per-
Dão da
Língua) en-
Tão dis-
Sílaba e dis-
Cípula que
Tinha a te-
Tinha...

Não disse coisa alguma
E sumiu como espuma.

Protestaria o fauno, mas
Não achou as visões tão más;
Pois depois de prima e segunda
Da terceira viu logo: a bunda!

E a seguir notou que era uma loira dríade
Que ele amaria como a uma hamadríade,
Mas que tão logo surgiu ia de
De si pra si falando
E a rima atando
Sem mando.

E então pulsou: fogo, fênix,
Facho em flama, fulgor de ônix,
Embebendo ambos num cálix –
Tudo em tantra
Dum só mantra;
Salamandra
Mais malandra
Em chamas metamorfoseando-se
Até que como uma escola de escândalos
O fauno e a ninfa foram transformando-se
Numa situação simples lá num bar.
Pois é; não tem mais o que se estranhar:

Estamos em pleno movimento punk curitibano
Nos idos de sei lá eu nem muito bem qual ano.
Três garotas sentadas numa mesa redonda ali no –
Sim, agora estamos percebendo: é o Bar do Lino.

E tudo termina quando, olhando do balcão,
Um poeta vagabundo comenta a um seu não-irmão:
“Você até parece um Pã, fauno poeta punk fedendo a alho,
Mas cá pra nós não passa dum tremendo pau no cu do caralho!”

Imagem incidental: Halcyone, de Herbert James Draper
(visualizar melhor clicando aqui)