domingo, outubro 02, 2011

O FAUNO, AS NINFAS E O MOVIMENTO PUNK CURITIBANO

Chifres, dois, primeiro,
Emergia um fauno
Do raso ribeiro
No qual o vagau, no

Final do verão,
Enfim se banhava,
Qual se de um vulcão
Fosse a água que o lava;

Quando fedia tanto até pra si
Mesmo aquele egipã (filho de Pã
E duma putativa mãe que ri
A quem vem de tarde, noite e manhã),

Tão satiricamente então topava
Atirar o dúbio corpo no rio,
A título de banho: depois dava
Pra correr molhado sem passar frio;

Emergia assim o fauno,
Molhado e mais malicioso
Que um poeta botando sal no
Caldo ralo e malcheiroso
Dado a um hóspede orgulhoso;

Muito mais feliz que um Bozo,
E muito mais angustiado, o
Fauno molhado, dengoso,
Olhava pra todo lado
Com brilho no olhar afiado:

Eis lhe surgem visões mais que belas
Na sagrada e profana quantia
De três, sim, três visões, como estrelas
Numa cinta que ao fauno cingia,
E a linguagem a fim de escrevê-las
Curva turva treva e claro dia:

Que esporro não faria o fauno pelo mato
Se em vez de fauno fosse um malaco em mocó!
A primeira visão fê-lo de estupefato
Ao ‘fêla’ duma putrefata rata só! –

Era uma ninfa
Tirando chinfra
De mina punk –
Botando banca
Que a bota espanca
Quem quer que a espanque –

Cabelos verdes,
Nas meias redes
Que arrastam trouxas –
O fauno treme:
Figura o creme
Daquelas coxas.

Só que aquela era uma oréade das montanhas
Que falava um grego de inflexões estranhas:
“Qualé a tua, pé-de-bode, assim, limpinho?
Tá me achando aqui com panca duma puta?
Não sou raspa pra esse teu caminhãozinho.
Tchau, que eu já vou lá cuidar da minha gruta.”

E o nosso herói notou que dói
Não ser bem seu o dom de Orfeu.

Eis que surgiu por sua vez outra visão
Que torceria até do cego Homero a nuca;
Vamos falar o que é, sem mais enrolação:
Mais uma ninfa ao fauno a vista já cutuca...

Aquela tinha a trança tão vermelha
Que ferro, fogo e forja já ajoelha
E a curva da cintura tão macia
Súbita sinuosa desafia
Sob a chispa da pupila de esguelha:

Mais, de-
Mais da
Saia de
Náiade
Feita, a-
Jeita as-
Sim (com o per-
Dão da
Língua) en-
Tão dis-
Sílaba e dis-
Cípula que
Tinha a te-
Tinha...

Não disse coisa alguma
E sumiu como espuma.

Protestaria o fauno, mas
Não achou as visões tão más;
Pois depois de prima e segunda
Da terceira viu logo: a bunda!

E a seguir notou que era uma loira dríade
Que ele amaria como a uma hamadríade,
Mas que tão logo surgiu ia de
De si pra si falando
E a rima atando
Sem mando.

E então pulsou: fogo, fênix,
Facho em flama, fulgor de ônix,
Embebendo ambos num cálix –
Tudo em tantra
Dum só mantra;
Salamandra
Mais malandra
Em chamas metamorfoseando-se
Até que como uma escola de escândalos
O fauno e a ninfa foram transformando-se
Numa situação simples lá num bar.
Pois é; não tem mais o que se estranhar:

Estamos em pleno movimento punk curitibano
Nos idos de sei lá eu nem muito bem qual ano.
Três garotas sentadas numa mesa redonda ali no –
Sim, agora estamos percebendo: é o Bar do Lino.

E tudo termina quando, olhando do balcão,
Um poeta vagabundo comenta a um seu não-irmão:
“Você até parece um Pã, fauno poeta punk fedendo a alho,
Mas cá pra nós não passa dum tremendo pau no cu do caralho!”

Imagem incidental: Halcyone, de Herbert James Draper
(visualizar melhor clicando aqui)

8 comentários:

blueschief disse...

Bom pra caramba, véio!

Panda Lemon disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Panda Lemon disse...

Corrigindo as gafes da chapação:

Esse fauno emergindo das águas (eram as águas do Belém?) me lembrou as madrugadas que passava no Gato Preto após as portas do Lino fechadas.

Eis que eu, com as outras duas ninfas, ninfetávamos por lá em busca de mais cerveja e, se a sorte fosse grande, daquele delicioso Prato Feito com feijão, arroz, bife e batata frita...

Iludíamos os velhos faunos que, bêbados e fedorentos, nos julgavam, longe de ninfas, putas baratas a quem se pagava somente com cerveja e batatas.

Ó! Como era bom ser punk. Excelente movimento, Ivan, vc até parece mesmo um Pã do qual me ufano, um poeta poderoso, Pã urbano.

Ivan disse...

Ah, lôsco -

este sim um comentário, Alexandra - na travação aqui do vinhoi, replico:

descontando até mesmo todo o conteúdo, você já exibe a profundidade da sua apreensão poética no insuspeito anagrama (que pode ou não ter sido intencional:)

fauno - ufano

vou ter que usar isso no próximo poema-fauno que eu fizer;

e que ducaralho que você curtiu.

Panda Lemon disse...

totalmente inconsciente, Ivan. sem querer desmerecer o elogio mas o ufano foi mais pra formar uma rima óbvia com poeta urbano do que pra incidir com poética gana neste astuto anagrama.

Hahaha.

Esse seu blog me poeta demais.

mimi sato disse...

irreverente
criativo
erótico
pornográfico
gráfico!

adorei!
um estilo surrealista q me cativa e me move nesta vida

GENIAL

Ivan disse...

Registro então as devidas mesuras
de direito e de fato
aos elogios tecidos e rasgados
pela Mimi Sato.

Desmesuradamente grato,

Ivan, pornógrafo mas com algum tato.

Sálvio Nienkötter disse...

Ufane-se, fauno,

labiríntico como a penetração.

amplexo!