sexta-feira, dezembro 31, 2004

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(solução da forca na postagem anterior: S O N E T O)


Não foi normal minha partida da inimiga:
Fui assoado lá de dentro num tal tranco
Que logo ao ser evacuado da barriga
Caí direto no primeiro cueiro branco.

De tão sensível, essa fralda imaculada
Se contraiu toda com asco, náusea, engulho:
Cruel e criminosamente atormentada
A fralda triste perdeu todo o seu orgulho.

Quando cresci tornei-me um célebre escritor
E pela fama de criar o verbo horror
Dos peçonhentos eu fui proclamado rei.

Mas os meus versos riparófilos e vis
Foram mais belos, mais sinceros e gentis
Que as inqualificáveis gentes que encontrei.

quarta-feira, dezembro 29, 2004

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Que nojo dessa métrica perfeita:
O gosto dessa péssima poesia,
Sem graça, labiríntica e vazia,
Desperta-me uma náusea que rejeita.

Se a rima entorta e nunca se endireita,
Convém não requentar a média fria.
Emendar demanda profilaxia:
Palavras passam cólera e maleita.

O verso só se acerta no terceto:
O abstruso torna-se algo de concreto
Se o concerto desconcerta-se abstrato.

Minha setra etcetera este soneto:
Exijo que o exegeta conte certo
E se entender que passe a andar de quatro.

segunda-feira, dezembro 27, 2004

Com certeza já morreu (Papai Noel)

Muito bem:

ninguém percebeu, mas a postagem anterior foi postada apenas por postar: não teve graça e mereceu passar batida sem nenhum comentário.

Mas esta aqui é um pedido de socorro: você, uma das poucas pessoas que me lê, está convidado(a) a levantar minha auto-estima, deixando um comentário edificante aqui.

Tipo assim: nossa, você escreve muito muito bem, já está na minha lista de favoritos, passa lá no meu blog também, bjaum...

A contagem regressiva já começou: se até o ano que vem esta postagem não atingir dez comentários eu vou entrar em greve de blog.

Me desculpem a crocodilagem, mas eu preciso ir ali chorar um pouquinho...

Adeus.

sexta-feira, dezembro 24, 2004

Desculpem a nossa falha

estivemos fora do ar por motivos de ordem cardíaca:


SÃO GONÇALO URGENTE: após o enfarte sofrido ao final da última rodada do brasileirão, a equipe de redatores do blog Delírio (aplaudindo com os pés) convalesce na cidade, longe da torcida curitibana.

A idéia é conseguir postar até a véspera do natal, sem mencionar o natal, pra não ter que dar nenhum presente.

Voltamos agora com nossa programação normal.

Não haverá mais interrupções.

domingo, dezembro 19, 2004

Momentos de tensão

A disputa de penalidades máximas terminou.

Placar: Postagens 10 x 6 Comentários.

Agora é tempo de aplaudir o delírio com a planta dos pés:

(está lançado o desafio:
é um número perigoso,
mas hoje, excepcionalmente,
podem tentar fazer isso em casa)

estamos a uma hora das partidas decisivas:

se você não sabe quais são,

não há mais tempo pra explicar:

a próxima postagem será no meio-tempo,

quando restará apenas mais uma meia-vida.


*bate os tambores*



quinta-feira, dezembro 16, 2004

A vida sem graça

Terça à noite enchi a caveira de álcool.
Ontem passei o dia na horizontal.
Foi aniversário do finado poeta Marcos Prado:
completaria 43 anos o desgracido.
Aí vai um inédito em comemoração.
A autoria deste poema está em litígio.


Todo durão é frio,
com o coração de gelo.
Mas basta uma vil
de sangue quente
e coração ardente
para derretê-lo.

domingo, dezembro 12, 2004

Coração engolido por uma baleia

__

Meu time rubro-negro perdeu.

O telefone continua surdo e mudo.

Nenhum contato meu está online.


Agora só resta sair pra ver se tem um fusca gelo ali na esquina.

Enquanto isso, fiquem com um poeminha deprimente:



tristeza profunda:

um tapinha nas costas

do corcunda


Marcos Prado

quinta-feira, dezembro 09, 2004

Atendendo a pedidos

(a série Teletubbie das variações para Escravos de Jó é dedicada especialmente à minha filha Rubinha, que me ensinou a gostar de Bing e Bong também)

Barrigas com telinhas fazem Tinky, Tinky, Wink

Lalinhas com Lalinhas fazem lá li, lá li, lá

Os Teles com os Tubbies fazem Dipsy, Dipsy, Poh


***

Ginastas com ginastas fazem flique, flique, flac

Relógios com transtornos fazem tique, tique, tac

Walt Disneys com Walt Disneys fazem Mickey, Mickey, Mouse

Bin Ladens com Bin Ladens fazem Bushy, Bushy, War

Estragas com prazeres fazem nãna, nina, não


E os Looneys com os Tunes fazem por enquanto é só

quarta-feira, dezembro 08, 2004

8 de Dezembro de 2004 forever

Muito bom, muito bem: vocês pediram e vão levar.
Mas não hoje:
hoje é dia de celebrações:
24 anos do assassinato de John Lennon;
61 anos bem vividos e morridos de Jim Morrison.

Para fazer os brindes, um inédito do degas aqui:

E A RIMA SUMIU

ela entrou pela janela do banheiro
sei lá se já era janeiro
talvez fosse quase dezembro
essa rima é óbvio que não lembro

ela veio fugindo da métrica
sua velha madrasta, frígida e tétrica
vestida do pânico que viu na rua
aquela era uma rima a meu ver nua

eu todo estupefato e ela logo ali
de fato no ato não a reconheci
apesar dos dois bicos dos seios duros
a rima não tirou os óculos escuros

quando fui agarrar senti só o vazio
e em vez de sumir ela desapareceu

segunda-feira, dezembro 06, 2004

Em homenagem aos cinco gols mai lindos de domingo

Cinco variações para a canção-atitude Escravos de Blog:
(vide a postagem A QUEM A POÇA INTERESSAR)
*repetir cada uma indefinidamente:
quem errar cai fora da brincadeira*



discados com discados fazem ligue, ligue, lag


cinéfilos com cinéfilas fazem betty, betty, zorg


roqueiras com pilotos fazem pitty, pitty, stop


gripados com gripinhas fazem vicky, vapo, rub


três craques com três craques fazem cinco, cinco a dois



*fiz uma lista com umas 50 variações,
mas só vou postar se pedirem mais*

sábado, dezembro 04, 2004

Humorável diálogo velho (esse título foi um pênalti pra fora)

(transcrito para a dentista mais linda que eu conheço)

At the Denis
No desdentista

Madam: I have a hallowed tooth that suffer me grately.
Madame: Tenho um dente desses que doem pra diabo.
Sir: Sly down in that legchair Madam and open your gorble wide - your mouse is all but toothless.
Senhor: Decente-se naquela cadeira Madame e abra sua bocarra bem abracadabra - sua cavidade bucólica não deixa de ser dentes.
Madam: Alad! I have but eight tooth remaining (eight tooth left).
Madame: Meudois! Oito dentes me restam (oito dentes e o resto).
Sir: Then you have lost eighty three.
Senhor: Então você perdeu oitenta e três.
Madam: Impossyble.
Madame: Impocível.
Sir: Everydobby knows there are foor decisives two canyons and ten grundies, which make thirsty two in all.
Senhor: Mundotodo sabe que há quatro decisivos dois canoros e dez moleculares, o que faz trinta menos dois ao todo.
Madam: But I have done everything to save my tooth.
Madame: Mas eu fiz tudo para salvar meu dente.
Sir: Perhumps! but to no avague.
Senhor: Talqualvez! mas em vão.
Madam: Ah! why did I not insult you sooner?
Madame: Ah! Por que é que não te xinguei mais cedo?
Sir: To late, it must be now or neville.
Senhor: Tarde desdemais, ou vai ou marta racha.
Madam: You will put it out for me then?
Madame: Quer dizer que vai tirar ele pra mim?
Sir: No, madman, I will excrete it.
Senhor: Não, macadame, vou cagá-lo.
Madam: But that is very painfull.
Madame: Mas isso dói pra burro.
Sir: Let me see it - Crack! there it be madarce.
Senhor: Deixe-me vê-lo - Splash! lá se foi.
Madam: But sir I wished to keep (was anxious to keep) that tooth.
Madame: Mas senhor eu gostaria de continuar (estava louca pra continuar) tendo aquele dente.
Sir: It was all black and moody, and the others are too.
Senhor: Estava todo preto e pronto, e os outros também.
Madam: Mercy - I will have none to eat with soon.
Madame: Obrigada - em breve não vou ter com que comer.
Sir: A free Nasty Heath set is good, and you will look thirty years jungle.
Senhor: Uma dentadura Sorriso Amarelo é boa, e você vai aparecer trinta anos mais morsa.
Madam: (Aside) Thirty year jungle; (Aloud) Sir I am no catholic, pull out all my stumps.
Madame: (à parte) Trinta anos mais morsa; (em voz alta) Senhor não sou nenhuma católica, extraia todos os meus cacos.
Sir: O.K. Gummy.
Senhor: O.K. Dê-mos.

John Lennon - In his own write (1964)
Paulo Leminski - Lennon com sua própria letra (1984)

sexta-feira, dezembro 03, 2004

Trago-lhe uma Medusa e um Gato

LA MÉDUSE

Méduses, malheureuses têtes
Aux chevelures violettes,
Vous vous plaisez dans les tempêtes,
Et je m´y plais comme vous faites.

A MEDUSA

Medusas, tristes cabeças
Com cabeleiras violetas,
Vocês brincam na voragem,
E me agrada o como agem.

Versão brasileira: Ivan Perseu

LE CHAT

Je souhaite dans ma maison:
Une femme ayant sa raison,
Un chat passant parmi les livres
Des amis en toute saison.
Sans lesquels je ne peux pas vivre.

O GATO

Desejo manter em meu lar:
Uma companheira a pensar,
Andando entre livros um gato,
Bons amigos sempre a passar
Sem os quais viver é ingrato.

tradução: Álvaro Faleiros

textos originais: Guillaume Apollinaire (Bestiário)

NÃO SE META, POESIA (versinhos de bar)

***

a poesia não é nada:
é a luz da estrela refletida
numa poça evaporada


***


a poesia é a cereja no topo do iceberg


***


todas as palavras
cabem no poema

algumas já vêm com asas
outras não têm nenhuma pena


***

versinhos de autoria
(não confirmada)
de Ivan, Francisco e Ludmila

as transcrições semi-alcoolizadas
foram uma cortesia de

ossurtado.blogspot.com

logue e ajude Umma a matar toda a sua Thurman


***


os poetas Francisco e Ludmila
foram gentilmente cedidos pelo

Bar do Torto,
o endereço
do melhor preço
e o pior atendimento:

vem pra cá você também

quinta-feira, dezembro 02, 2004

Versinhos ludopédicos bastante a propósito

**
A ONZE METROS DA TELEVISÃO

Falta feia na grande área:
quando o trilo do apito decide o
lance, não há nada que separe a
imagem congelada do olho seco no vídeo.

Cobrado impiedosamente:
quem vê não diz que você mal ti-
ra o olho da TV e também sente
o mesmo medo do goleiro diante do pênalti.

***

QUADRA IMPERFEITA NA QUAL SE CONTESTA UM POEMA DE PAULO LEMINSKI QUE VERSA QUE CHUTES DE POETA NÃO LEVAM PERIGO À META

um poeta que ninguém soube donde veio
logo ali no meio do clássico de domingo
entrou em campo pra bater o escanteio
assinalando um belíssimo gol olímpico

segunda-feira, novembro 29, 2004

Deux petites morts pour mon amour

***
LE PREMIER BONHEUR DU JOUR

(Jean Renard / Frank Gerald)

Le premier bonheur du jour
A primeira alegria do dia
C´est un ruban de soleil
É uma fita de sol
Qui s´enroule sur ta main
Que se enrola em tua mão
Et caresse mon épaule
E acaricia minha espádua
C´est la souffle de la mére
É o sopro do mar
Et la plage qui attend
E a praia que aguarda
C´est l´oiseau qui a chantée
É o pássaro que cantou
Sur la branche du figuier
Sobre o ramo da figueira

Le premier chagrin du jour
A primeira tristeza do dia
C´est la porte qui se ferme
É a porta que se fecha
La voiture qui s´en va
O carro que se vai
Le silence qui se instale
O silêncio que se instala
Mais bien vite tu revien
Mas bem veloz você volta
Et ma vie retourn son course
E minha vida retoma seu curso
Le dernier bonheur du jour
A última alegria do dia
C´est la lampe qui s´attend
É a lâmpada em que se confia


Dicionário interlinear: Ivan Justen Santana

***

TEMPO NO TEMPO
(ONCE WAS A TIME I THOUGHT)

(J. Phillips / versão: Os Mutantes)

há sempre um tempo no tempo
que o corpo do homem apodrece
sua alma cansada penada se afunda no chão

e o bruxo do luxo baixado o capucho
chorando no nicho capacho do lixo
caprichos não mais voltarão

já houve um tempo em que o tempo parou de passar
e o tal do homo sapiens não soube disso aproveitar
chorando, sorrindo, falando em calar
pensando em pensar quando o tempo parar de passar

mas se entre lágrimas você se achar
e pensar que está a chorar
esse era o tempo em que o tempo é

domingo, novembro 28, 2004

A Morte da Morte Súbita

Hesitei bastante em matá-la:
afinal, era uma boa morte.

Mas até a morte tem que ter seu fim.

***

40 postagens, média de 12 visitas diárias
(4 a mais que o Depois daquele surto):
este blog vai acabar subitamente assim

agora,
com licença,
vou cantar mais uma canção pra mim


anjo da morte

(Marcos Prado/ Edson de Vulcanis/ Os Catalépticos)

a morte é o último mistério da vida
quando você morre e não esquece de deitar
vira uma forma nebulosa na subida
que vive suspensa em qualquer lugar

além-túmulo haverá vida possível?
zumbem como moscas respostas amorfas
tem muita gente que ainda crê no incrível
dormem acordadas, sonham consigo, levantam mortas

assombrado de estar vivo
a morte é um estado de espírito
sou o ser que quer ser redivivo
sozinho, morto, morto, morto, não consigo

sábado, novembro 27, 2004

Entre parentes

As seguintes canções foram feitas sem influência uma sobre a outra, mas possuem sinistras similaridades siamesas. Confiram, deliciem-se e adotem olhares suspeitos para os sujeitos ocultos e os objetos inanimados.


O PIANO ANDOU BEBENDO

O piano andou bebendo
Minha gravata caiu no sono
E a banda voltou pra capital
A jukebox quer tirar uma água do joelho
E o carpet precisa cortar o cabelo
Já o holofote parece um fugitivo do presídio
Porque o telefone está sem cigarros
E a sacada está na correria
E o piano anda de porre
E os cardápios estão morrendo de frio
E o iluminador é cego de um olho
E não se enxerga com o outro
E o afinador de piano usa aparelho no ouvido
E veio com sua mãe a tiracolo
E o piano está de porre
Porque o leão-de-chácara pratica sumô
E o proprietário tem a mente em miniatura
Com um QI de toco de cerca
Pois o piano anda de porre
E não se encontra a garçonete
Nem com um detetor de radiação
Ela odeia você e seus amigos
E não tem como se servir sem ela
E a bilheteria está babando
E as banquetas estão em chamas
E os jornais se rasgaram de dar risada
E os cinzeiros já se aposentaram
Tudo porque o piano bebeu
Não fui eu, não fui eu...


Tom Waits

versão brasileira: Marcos Prado & Ivan Justen Santana

***

crowley´s home

cresce capim no meu carpet
as cortinas escorrem pela janela
os rodapés sobem pelas paredes
o sofá é tragado pelo piso movediço
outono dos lustres: caem lâmpadas

a estante me hipnotizou e está em posição de ataque
a banheira prepara o bote
a porta da cozinha me mastiga o estômago
a mesa engatinha pelo corredor
a cadeira saltou com os quatro pés no meu peito
sangue jorra pelas tomadas
os quadros fogem da realidade
saio voando pela varanda
saio voando pela varanda
saio voando pela varanda


Marcos Prado & Edson de Vulcanis

quinta-feira, novembro 25, 2004

A volta do eterno retorno II

__
Eu só tenho uma meia vida
Disse o homem radioativo
Antes de levar chumbo


Ivan Justen Santana, Edson de Vulcanis e Francisco Cardoso

terça-feira, novembro 23, 2004

_ _ _ _ _

o azar, depois de muito tempo perdido
entre fichas e baralhos de um cassino
resolveu casar e ganhar um filho
com a sorte, de quem hoje é legítimo marido

para a sorte foi um casamento magnífico
pois cansara de ser uma principiante
com ela, azar seria um homem muito rico
desde que não possuísse nenhuma amante

mas surgiu na história uma tal de probabilidade
e a sorte logo percebeu os jogos de azar
isso reacendeu a velha rivalidade
e, pela sua regra, ela teria que pagar

“azar, vamos colocar as cartas na mesa”
disse, com a garantia de que iria ganhar
“sorte, pela probabilidade, vou perder, com certeza,
mas é nela que eu vou apostar”


(Marcos Prado – o livro dos contrários – 1996)

segunda-feira, novembro 22, 2004

____

dito pelo
não dito,
assino embaixo
do que nunca
foi escrito


(poema de Francisco Cardoso)

esta transcrição foi um oferecimento de

ossurtado.blogspot.com

leia, comente, ame, mate e morra

domingo, novembro 21, 2004

A volta do que não foi lá mesmo

__
sambódromo
central do brasil
metrô do rio
copacabana
arpoador
pedra da gávea
ponte rio-niterói

fui, vi e visitei:
faltou bastante coisa,
principalmente um lugarzinho
onde eu mais queria entrar
e não entrei

***

epílogo:

uma volta triunfante: 13 horas de ônibus,
acotovelado ao lado dum passageiro gordo,
com uma parnanguara falante no assento de trás...

da próxima vez juro que vou de avião,
vestido de terrorista.

sábado, novembro 20, 2004

Certas canções

__

Copacabana me engana

eu sigo chamando, chamando, mas você não me abraça

eu não nasci pra ser o superbacana, mas

enquanto o lobo não vem vamos passear na praça?


sexta-feira, novembro 19, 2004

O tempo vai passando

e minha cabeça roda.

estive no MAC hoje, em Niterói.

Gostei de rodar nesse disco voador:
agora só falta o circo voador...

Amanhã é Copacabana, se o mundo não acabar.

De declínio em declínio
vejo o pó e o esterquilínio:

a arte da perda não é de difícil domínio.

Perdoem o hermetismo, mas não tenho tempo pra explicar:
o tempo aqui no cyber vai se esgotar.

quinta-feira, novembro 18, 2004

Minha alma canta

___
Desafinada, mas canta.

O Rio de Janeiro é psicodélico por natureza.

Vim num ônibus convencional lotado: quarenta e tantas pessoas compõem uma mostra significativa da humanidade inteira: crianças que choram de madrugada, o tradicional chato de galocha que não pára de falar com o passageiro ao lado e tenta vender alguma coisa, mães com filhos no colo, freiras, idosos, casais, enfim, a renca toda.

Chegando perto da rodoviária, passamos ao lado do Galeão: olhei desprevenido pela janela e um avião a menos de cem metros fazia a aterrissagem. Do outro lado, ao longe, o cristo redentor: seria ele mesmo ou uma antena como as outras, nos outros morros? Sei lá.

Ainda não fui pra praia. O clima está fechado. Volto no sábado. Comprei o jornal do brasil. Estou matando as saudades da minha filha, que fez quatro anos: os vizinhos organizaram uma festa bacana: dúzias de crianças, música em alto volume, dança e comilança. Meu mal jeito paranaense levou um drible carioca: já estou internalizando o sotaque: fala mole e dengosa: eu mesmo teria arrepios, se fosse há um tempo atrás.

Hoje São Gonçalo e Niterói. Amanhã, Copacabana, quem sabe. Depois de amanhã é o fim de semana. Sabe lá. O futuro é delírio.

terça-feira, novembro 16, 2004

A quem a poça interessar

***

Minha vida anda maravilhosa e horrível como sempre
Então hoje horrível vou embarcar para a cidade maravilhosa

A idéia é ver minha maravilhosa filha
Depois de sete horríveis meses de distância

Quem sabe eu veja também outra criatura que povoa meus sonhos
Quem sabe não

Será uma viagem maravilhosa
Nessa chuva horrível

E agora uma canção
Maravilhosamente horrível


*cante mentalmente enquanto estiver postando*

Escravos de blog
Blogavam sem parar
Edita
Posta
Deixa ficar

Blogueiros com blogueiras
Fazem
Zigue
Zigue
Zag


*repete refrão até perder a razão*

sexta-feira, novembro 12, 2004

Pai e Mãe

Na postagem de ontem não linkei meu pai e minha mãe:

http://palavradepantera.blogspot.com

Já que não honrei pai e mãe,
acho que um dia vou sem pai nem mãe pro inferno.

III. CÂNTICO DE SÃO JOÃO

(imaginar a cabeça de São João servida numa bandeja, cantando)

O sol que um sobressalto
Apruma para o alto
Em breve redescende
Incandescente

Por um momento a treva
Das vértebras se eleva
Em uníssono passo
Por todo o espaço

Para que esta cabeça
Solitária apareça
No vôo singular
Da foice no ar

Em completa ruptura
Mais repele ou fratura
A desavença antiga
Que ao corpo a liga

Bêbada de jejum
Que persegue nalgum
Salto louco a vogar
Seu puro olhar

Lá no alto onde os cumes
Eternos têm ciúmes
De que possais vencê-los
Todos ó gelos

Mas levada ao abismo
Pelo mesmo batismo
Que elegeu minha sina
Grata se inclina.


(1913)

(quem souber o autor ponha o dedo aqui)

Tradução de Augusto de Campos (1987)

quinta-feira, novembro 11, 2004

Eu sou o homem mosca

>>>

Muito bem: ninguém pediu, mas aqui vai uma postagem quilométrica sobre mim, pra vocês quem sabe entenderem porque esse web log tem o nome esdrúxulo que tem.

Vamos começar tentando relatar o sonho da noite passada, mas nada do estilo Jack Kerouac (Book of dreams), já que pra mim o melhor prosador da geração beat é o William Burroughs, assim como o melhor poeta é o Lawrence Ferlinghetti (o Ginsberg perde de longe).

Acabei de esquecer a primeira parte do sonho: só lembro que então eu estava numa janela e aí como de costume saí voando (é costume quando se trata dos meus sonhos eu esquecê-los instantaneamente, além de olhar por janelas e sair voando como se estivesse nadando no ar).

Logo encasquetei que era o super-homem e precisava apagar um incêndio nalgum lugar (uma tragédia faiscante causada por péssimas instalações elétricas que estavam fritando dúzias de pessoas a cada momento que passava), mas então sobrevoei uma quadra de colégio e lindas garotas estavam praticando handball: maliciosamente voei até a bunda duma delas e engolfei-a nos meus braços (ela parecia estranhamente uma garota carioca que ainda não conheço de vista): dali em diante resolvi esquecer o incêndio que tomava proporções dantescas e me concentrar inteiramente no vôo hipererótico com a belezura, que despi selvagem e aí me enfiei com ela numa espécie de escaninho de concreto bem apertado, onde estávamos, bem, como direi, brincando de bicho de quatro pernas, quando percebi que eu estava mesmo era todo encolhido e suado no sofá da sala do apartamento da minha mãe, onde tenho capotado por uns tempos. Um sonho realmente sensacional... Ah, lembrei da primeira parte:

Eu estava num local próximo ao que parecia ser a Pedreira Paulo Leminski (espaço enorme aqui em Curitiba onde acontecem shows) e escutava os Doors lá no palco da Pedreira tocando uma canção: a canção era do Walmor, o melhor guitarrista que eu já vi tocar na minha frente, e ele estava por ali sem saber direito por que os Doors executavam sua canção: todo mundo (inclusive eu) estava fumando maconha e rindo, e então entramos num carro que ficou lotado e depois subimos ao apartamento não sei de quem, onde olhei pela janela...


Não há motivo nenhum para eu fazer isso agora, mas vou revelar os blogs que leio bem regularmente:

http://intimaloucura.blogspot.com

http://www.monti.blogger.com.br (blog de um amigo meu que confessa que não lê blogs com freqüência: já eu tenho devorado aplicadamente a literatura virtual...)

http://copy-paste.blogspot.com (esse eu recomendo muito, pois é uma espécie de digesto de toda a blogsfera: colam por ali coisas interessantes de outros blogs, então é um bom lugar pra garimpar e vadiar através de textos diversos)

http://orabolas.blogspot.com

http://www.mordida.blogger.com.br (minha banda favorita)


Por último, mas talvez não o suficiente pra matar esse meu surto textual, aqui vai um trecho bacana que achei num livro, e que fala um pouco poética e loucamente sobre como surgem versos na cabeça de uma criatura humana, e fala também simpaticamente duma mosca (não contem pra ninguém, mas eu sou o homem-mosca, da canção da banda Criaturas, que um dia eu vou escrever sobre ela) e (repetindo) fala sobre versos, que são a tônica aqui nesse (na boa expressão de uma amiga minha) blogspício:

"Eis como nasceram os versos. Voltara para casa tarde da noite e, em vez de deitar-me, demorava-me no estúdio onde acendera a luz do gás. Uma mosca, atraída pela claridade, pôs-se a azucrinar-me. Consegui acertar-lhe um golpe, de leve para não sujar-me. Esqueci-a e só mais tarde percebi como, em cima da mesa, lentamente ela começava a reanimar-se. Estava parada, ereta, e parecia mais alta que a princípio, porque uma das patinhas se estropiara e não podia flexionar-se. Com as duas patas posteriores alisava aplicadamente as asas. Tentou mover-se, mas caiu de costas. Endireitou-se e voltou ao seu aplicado mister.

Foi então que escrevi os versos, espantado por haver descoberto que aquele pequeno organismo, penetrado por tamanha dor, fosse orientado em seu esforço ingente por duas convicções errôneas: em primeiro lugar, alisando com tanta obstinação as asas ilesas, o inseto revelava desconhecer de que órgão derivava a dor; além disso, a aplicação de seu esforço demonstrava que em sua mente minúscula existia a convicção fundamental de que a saúde é um dom comum a todos e que devemos fatalmente recuperá-la se a perdemos. Eram erros perfeitamente desculpáveis num inseto cuja vida dura apenas uma estação, e a quem não sobra tempo para adquirir experiência".

(Trecho de A consciência de Zeno, de Italo Svevo. Tradução: Ivo Barroso.)

quarta-feira, novembro 10, 2004

Joachim Du Bellay (*1525 - †1560)

---
(mais um soneto em três cores...)


Si nostre vie est moins qu'une journée...


Si nostre vie est moins qu'une journée
En l'eternel, si l'an qui faict le tour
Chasse nos jours sans espoir de retour,
Si périssable est toute chose née,

Que songes-tu, mon ame emprisonnée ?
Pourquoy te plaist l'obscur de nostre jour,
Si pour voler en un plus cler sejour,
Tu as au dos l'aele bien empanée ?

La, est le bien que tout esprit desire,
La, le repos où tout le monde aspire,
La, est l'amour, la, le plaisir encore.

La, ô mon ame au plus hault ciel guidée !
Tu y pouras recongnoistre l'Idée
De la beauté, qu'en ce monde j'adore.

(1550)

***

Se a nossa vida é menos do que uma jornada
No infinito, se o ano quando reinicia
Nos leva os dias só deixando nostalgia,
Se qualquer coisa ao nascer já está condenada,

Com o que tu sonhas, minha alma aprisionada?
Por que te agrada a escuridão do nosso dia,
Se a fim de voar a mais brilhante moradia
Tu tens no dorso essa asa tão bem empinada?

Lá está o bem que todo espírito deseja,
Lá está o repouso que todo mundo almeja,
Lá o amor, lá o prazer também tem o seu canto.

Lá, ó minha alma, guiada ao céu mais altivo,
Reconhecerás ali o Ideal mais vivo
Da beleza, que neste mundo eu amo tanto.


***

Se a nossa vida não passa duma noitada
Comparada ao eterno, se o ano zera os dias
Comendo o tempo sem deixar gosto de nada,
Se carnes hoje quentes logo acabam frias,

Que delírio é esse, hein, minha alma amarrada?
Por que tão alegrinha nas tardes vazias,
Se pra estar pronta pra folia imaginada
Você vai costurando tantas fantasias?

Festa (!) onde a presença de espírito é bem-vinda,
Festa onde há sossego e também o diabo a quatro,
Festa onde existe prazer e existe amor ainda,

Festa, ô minha alma, onde o seu fino trato
Pode reconhecer aquela Idéia linda

Que aqui mesmo no mundo cão eu idolatro.



Versões Brasileiras: Ivan Justen Santana

1997

quinta-feira, novembro 04, 2004

Luís Vaz de Camões (*1525? - †1580)

___

Pensamentos, que agora novamente
Cuidados vãos em mim ressucitais,
Dizei-me: ainda não vos contentais
De terdes quem vos tem tão descontente?

Que fantasia é esta, que presente
Cada hora ante meus olhos me mostrais?
Com sonhos e com sombras atentais
Quem nem por sonhos pode ser contente?

Vejo-vos, pensamentos, alterados;
E não quereis, de esquivos, declarar-me
Que é isto que vos traz tão enleados?

Não me negueis, se andais para negar-me;
Que, se contra mim estais alevantados,
Eu vos ajudarei mesmo a matar-me.


(publicado em 1595)


***

pensamento, meu caro pensamento, me convença
o que penso ser não é o que você pensa

lembro de não pensar tal como antigamente
contente de ter quem o tem tão descontente

no entanto, você vai e vem com este sorriso alegre
que por si só não basta e a mim não serve

nenhum me negue, se pensa em renegar-me
estarei a postos para ajudá-lo a despensar-me


livre adaptação:

Marcos Prado, Sérgio Viralobos e Antonio Thadeu Wojciechowski

(publicado em 1992)

quarta-feira, novembro 03, 2004

A EXIMENINA E A ENDIMENINA

...

Além de não ter cumprido o que escrevi na postagem anterior (amanhã tem mais), vou continuar postergando um soneto de Camões e sua tradução/ atualização, feita por uns amigos meus em 1996. E vou voltar a falar prosaicamente aqui (em prosa mesmo), mas como eu adoro poesia, é prosa sobre poesia.

Ultimamente eu vinha detestando sequer ouvir falar em Augusto dos Anjos, porque além de ser um dos três melhores poetas brasileiros, ele foi muito surrado, repetido, tresrepetido, principalmente aquele soneto que fala da ingratidão (esta pantera), e do beijo que é a véspera do escarro.

Aliás, é com poemas como esse que a gente aprende que poesia não é só aquela viadagem que fazem pra ganhar as mulheres em vez de agarrar logo duma vez, e que pode ser um negócio divertido e aterrorizante, feito música ou cinema.

Só que quem gosta mesmo não pára de achar novos poemas e acaba se enchendo e esgotando (ou achando que esgotou) autores tão bons e clássicos como Augusto, Gregório de Matos, Hilda Hilst, Joyce, Shakespeare, Dante, Cruz e Sousa et caterva ad infinitum.

Mas o Augusto é cabuloso mesmo, eu acabo sempre voltando a ele, ou ele mesmo é que grita das estantes para mim. Foi o que aconteceu esses dias aqui na casa da minha mãe. Eu estava zanzando pelo quarto e umas folhas de apostila do meu irmão na estante me chamaram a atenção: era uma série de sonetos do Augusto (inclusive o famigerado Versos Íntimos).

E o poema que gritou para mim eu ainda não conhecia. Assim, tomo a liberdade de postá-lo aqui (depois de toda essa lenga-lenga dispensável) para o gáudio dos pouquíssimos e santíssimas leitores e leitoras. Bom divertimento, e depois me contem se descobriram o que são a endimenina e a eximenina...


CONTRASTES

A antítese do novo obsoleto,
O Amor e a Paz, o Ódio e a Carnificina,
O que o homem ama e o que o homem abomina,
Tudo convém para o homem ser completo!

O ângulo obtuso, pois, e o ângulo reto,
Uma feição humana e outra divina
São como a eximenina e a endimenina
Que servem ambas para o mesmo feto!

Eu sei de tudo isto mais que Eclesiastes!
Por justaposição destes contrastes,
Junta-se um hemisfério a outro hemisfério,

Às alegrias juntam-se as tristezas,
E o carpinteiro que fabrica as mesas
Faz também os caixões do cemitério!...


Augusto dos Anjos

segunda-feira, novembro 01, 2004

Ressaca do Dia das Bruxas

...


Depois de postagens verdadeiramente sentimentais,
e antes de cumprir quaisquer promessas,
vou postar rapidinho uma quadrinha burra,
só pra matar saudade dos velhos tempos.

Amanhã tem mais.

***

A reta saiu pra dar uma volta
e voltou com medo do demo na cruz.
Nada vale mais que uma frase solta:
o último que sair apague a luz.

sábado, outubro 30, 2004

Inspirado pela loucura

___


Então uma hora a euforia se encharca de tristeza.

O prazer emudece e se veste de preto.

Do sorriso sobram só as cicatrizes no rosto.

Mesmo a poesia perde rimas e ritmos

e soa falsa prolixa ridícula.


Então a luz se curva

e some num buraco negro.


E aí vem a dor.


Mas no meio desse eclipse

uma voz rebate na memória

e as estrelas piscam na promessa

de explosões de cores flores amores.


***

ESTROPIANDO LEMINSKI

(A dor me faz lembrar um poema do polaco,
que dizia qualquer coisa assim:)


ver
é dor
ouvir
é dor
ter
é dor
perder
é dor

só doer
não é dor

delícia
de experimentador

sábado, outubro 23, 2004

Pra começar a ler hoje e só terminar dia 29

Lady Lázaro


Eu fiz outra vez.
Um ano a cada dez
Eu consigo ––––

Um tipo de milagre ambulante,
Minha pele brilhante: um abajur Nazista,
Meu pé direito

Um pesa-papéis,
Meu rosto um inexpressivo e fino
Linho judeu.

Descasque o guardanapo
Oh, meu inimigo.
Aterrorizo? ––––

O nariz, o buraco dos olhos, todos os dentes?
O bafo azedo
Desaparecerá num dia.

Logo, logo a carne
Comida pela caverna soturna estará
Em casa em mim

E eu, uma mulher sorridente.
Eu só tenho trinta.
E, feito os gatos, nove vezes pra morrer.

Esta é a Número Três.
Que sujeira
Aniquilar assim cada década.

Que milhões de filamentos.
A multidão comendo amendoim
Acotovela-se pra ver

Me desempacotarem toda––––
O grande strip-tease.
Senhoras e senhores

Estas são minhas mãos
Meus joelhos.
Eu posso ser pele e osso,

Não obstante, sou a mesma mulher, idêntica.
Da primeira vez eu tinha dez.
Foi um acidente.

Da segunda vez eu quis
Passar por isso e não voltar mesmo.
Me petrifiquei fechada

Feito uma concha.
Tiveram que chamar e chamar
E me pinçar os vermes como pérolas grudentas.

Morrer
É uma arte, como tudo mais.
Faço isso de um jeito excepcional.

Faço isso de uma maneira infernal.
Faço isso de modo real.
Você pode falar que é minha vocação.

É muito fácil fazer isso numa prisão.
É muito fácil fazer isso e ficar nisso.
É a volta teatral

Em pleno dia
Pro mesmo lugar, mesmo olhar, mesmo bruto,
Entusiasmado grito:

“Milagre!”
Que me põe no chão.
Tem uma taxa

Pra ver minhas cicatrizes, tem uma taxa
Pra ouvir meu coração–––––
Bate realmente.

E tem uma taxa, uma taxa bastante cara
Por uma palavra ou um toque
Ou uma gota de sangue

Ou pedaços do meu cabelo ou das minhas roupas.
Ora, ora, Senhor Doutor,
Ora, Senhor Inimigo.

Eu sou sua obra,
Eu sou sua preciosidade,
O bebê de ouro puro

Que se derreteu num guinchado.
Eu giro e queimo.
Não pense que subestimo suas rugas de preocupação.

Cinzas, cinzas––
Você vira e remexe.
Carne, osso, não tem nada ali–––

Um bolo de sabão,
Um anel de casamento,
Uma obturação de ouro.

Senhor Deus, Senhor Lúcifer
Cuidado
Cuidado.

Das cinzas eu me ergo
Com meu cabelo vermelho
E devoro os homens como vento.


Sylvia Plath

(23-29 October 1962)

Versão Brasileira: Ivan Justen Santana


quinta-feira, outubro 21, 2004

Priscila

Hoje todas as mulheres
Que eu vi eram
Você
Você ali
Você aqui
Você
E também
Além de tudo

Você

segunda-feira, outubro 18, 2004

Hoje eu só digitei duas canções pro meu amor


Pano pra manga

(Xico Chaves/ Jards Macalé)

Costura, meu amor, costura
Com linha pura meu amor com o teu
Pinta e borda que dá pano pra manga
O meu amor com o teu

A vida sempre por um triz
Seja de bicho, bandido ou atriz
Ninguém pode pedir um bis
Bom mesmo é sempre se viver feliz

Costura, meu amor, costura
Com linha pura meu amor com o teu
Pinta e borda que dá pano pra manga
O meu amor com o teu


Puntos Cardinales

(Jorge Mautner/ Jards Macalé/ Fidel Castro)

En las catacumbas del Frenesi
Yo cantaba una rumba
Yo cantaba assi

Una rumba con zabumba
Solamente para ti
Mi calunga, mi calunga
Do, re, mi, fa, sol, la, si

Tus besos apagan
Todos los males
Tus besos son
Los Puntos Cardinales

Dançando em cima dos planetas
E também de um meteoro
Sapateando em cima dos cometas
Eu te amo eu te adoro


sábado, outubro 16, 2004

TODOS OS ARCANOS DESTE BLOG REVELADOS NUMA POSTAGEM SÓ


Voltando às postagens mais prosaicas,
Acordei hoje resolvido a ler o meu destino
Aqui em voz alta,
Para quem quiser ouvir.

É um número sujo:
Só eu posso fazê-lo:
Prometo fazer com zelo.

Então tirem as crianças da sala
E ponham-nas na frente da tela.

Um dia
Este blog se chamava
Depois daquele surto.

Hoje, morte súbita.

E assim, o seguinte início de romance será formado:

Depois daquele surto, morte súbita, delírio, e uma noite repleta de pesadelos inquietantes, Ivan acordou certa manhã e viu-se transformado num gigantesco aracnídeo.

quarta-feira, outubro 13, 2004

VAMOS BRINCAR DE BAUDELAIRE?

*
ALMA PASSANTE


A rua matava surdo a buzinada.
Faróis e placas falavam ao mesmo tempo.
Meu pé: dependurado na calçada,
Mas o olhar já contornava o cruzamento.

Percebi que perseguia uma passante
No que ela viu também que me seguia.
Disfarcei e ela disfarçou no mesmo instante.
Fiz que fui e não fui, e ela ia mas nem ia.

Fiz cara de mais velho. Ela se deu ar de menina.
Saí pela esquerda, ela, pela direita.
Esbarramos logo na próxima esquina,
Cúmplices abaixo de qualquer suspeita.

*

terça-feira, outubro 12, 2004

Um presente de dia das crianças

Papai

Você não serve, você não serve
Mais, sapato preto
No qual vivi como um pé
Por trinta anos, pobre e branca,
Mal me atrevendo a respirar ou espirrar.

Papai, eu precisei muito matar você.
Você morreu antes que eu tivesse tempo de –
Peso mármore, um saco cheio de Deus,
Estátua cadavérica com um dedão cinzento
Grande feito uma foca de Frisco

E uma cabeça no Atlântico em surto
Onde chove verde feijão sobre azul
Nas águas da maravilhosa Nauset.
Eu rezava pra recuperar você.
Ah, você.

Na língua Alemã, na cidade Polonesa
Terra-planada pelo rolar
De guerras, guerras, guerras.
Mas o nome da cidade é comum.
Meu amigo polaco

Diz que há umas duas dúzias.
Então eu nunca pude saber onde você
Pôs o pé, suas raízes,
Nunca pude conversar com você.
A língua ficava grudada.

Grudava num laço de arame farpado.
Eu, eu, eu, eu,
Eu mal podia falar.
Eu pensava que todos os alemães eram você.
E a língua obscena

Uma máquina, uma máquina
Me vaporizando feito uma Judia.
Uma Judia em Dachau, Auschwitz, Belsen.
Comecei a falar feito uma Judia.
Acho que posso ser mesmo uma Judia.

As neves do Tirol, a cerveja clara de Viena
Não são mais puras ou verdadeiras.
Com minha ancestral cigana, minha sorte estranha
E minhas cartas de Tarocchi
Eu posso ser um pedaço Judia.

Sempre tive medo de você,
Com sua Luftwaffe, seu blábláblá.
E seu bigode bem feito
E seu olho Ariano, azul brilhante.
Homem-Panzer, homem-tanque –

Não Deus mas uma suástica
Tão preta que nenhum céu atravessaria.
Toda mulher adora um Fascista,
A bota na cara, o bruto brutal
Coração de um bruto feito você.

Você de pé ao quadro-negro, papai,
Na foto que tenho de você,
Uma fenda no queixo em vez de no pé
Mas não menos um diabo por isso, não, nem
Um pouco menos o homem preto que

Mordeu meu coração vermelhinho em dois pedaços.
Eu tinha uns dez anos quando enterraram você.
Aos vinte tentei morrer
E voltar, voltar, voltar pra você.
Achei que até os ossos seriam suficientes.

Mas me tiraram do saco,
E me colaram os pedaços.
E então eu soube o que fazer.
Fiz um modelo de você,
Um homem de preto, com aparência Meinkampf

E um amor por tumulto e loucura.
E eu disse sim, eu aceito.
Então, papai, finalmente acabei.
O telefone preto foi cortado pela raiz,
As vozes já não rastejam mais até aqui.

Se já matei um homem, mato dois –
O vampiro que disse que era você
E bebeu meu sangue por um ano,
Por sete anos, se você quer saber.
Papai, você pode se deitar agora.

Tem uma estaca no seu gordo coração preto
E os aldeões nunca gostaram de você.
Eles estão dançando e pisando em você.
Eles sempre souberam que foi você.
Papai, papai, seu bastardo, acabei.


Sylvia Plath (1932-1963)

Escrito no dia 12/10/1962

Traduzido por Ivan Justen Santana, no dia 12/10/2004.

domingo, outubro 10, 2004

Três fios de lã para a gataria brincar

A un gato
A um gato
Prum gato


Jorge Luis Borges

Tridimensão: Ivan Justen Santana

No son más silenciosos los espejos
Não são mais silenciosos os espelhos
Você não grita mais que um espelho.

ni más furtiva el alba aventurera;
nem mais furtiva a aurora aventureira;
Você surge mais súbito que a manhã.
eres, bajo la luna, esa pantera
assim és, sob a lua, esta pantera
Debaixo da lua, tudo é pantera irmã
que nos es dado divisar de lejos.
que só de longe divisar podemos.
na qual mal podemos meter o bedelho.


Por obra indescifrable de un decreto
Por obra indecifrável dum decreto
Por obra insolúvel feito um país

divino, te buscamos vanamente;
divino, te buscamos inutilmente;
terrestre, procuramos você sem achar.

más remoto que el Ganges y el poniente,
mais remoto que o Ganges e o poente,
Mais distante do que qualquer lugar,

tuya es la soledad, tuyo el secreto.
tua é a solidão, teu o segredo.
sua solidão e segredo são do seu nariz.


Tu lomo condesciende a la morosa
Teu lombo condescende à morosa
Sua pele agüenta a devagarzinha

caricia de mi mano. Has admitido,
carícia de minha mão. Aceitamento,
carícia da minha mão. Você admitiu,

desde esa eternidad que ya es olvido,
desde esse infinito e já esquecimento,
desde esse infinito que o partiu,

el amor de la mano recelosa.
do amor dessa mão receosa.
o amor dessa medrosa mãozinha.


En otro tiempo estás. Eres el dueño
Estás noutro tempo. És proprietário
Você não existe nesse mundo. Conduz

de un ámbito cerrado como un sueño.
de um âmbito fechado imaginário.
um ambiente fechado de sonho e luz.


El oro de los tigres, 1972

sexta-feira, outubro 08, 2004

SOBRE A COR DOS OLHARES

os olhos dizem mais que as palavras falam
os olhos fizem mais que as palavras calam
os olhos gizem mais que as palavras balam
os olhos lizem mais que as palavras salam
os olhos mizem mais que as palavras tralam
os olhos nizem mais que as palavras chalam
os olhos pisem mais que as palavras chtchalam
os olhos dizem mais que as palavras

quinta-feira, outubro 07, 2004

Por mais que o tempo passe

Por mais que a vida vaze
e se perca pela linha de fundo,

por mais talvez ou quase
ou mesmo que acabe o mundo;

seja na hora do tudo ou nada,
no meio da rua, no final da calçada,

quando a lua suma, o sol não se levante
e não haja mais a menor possibilidade,

vou te achar dentro do último instante,
vou te buscar com mil anos de idade.


terça-feira, outubro 05, 2004

um poema postagem telegráfica

Logo mais vou tentar equilibrar
minha insanidade pública
com uma íntima loucura.

E finalmente, com vocês, este perigoso número:

Os dois últimos pedaços do gato Asparagus

(não tentem fazer isso em casa),

grudados como gêmeos siameses.

Ah, pra criar suspense, sabem a dos gêmeos siameses?

Não? Pois é:

eles estão assim há meses.

*rufar de tambores*


(...)

Then, if someone will give him a toothful of gin,
He will tell how he once played a part in East Lynne.
At a Shakespeare performance he once walked on pat,
When some actor suggested the need for a cat.
He once played a Tiger – could do it again –
Which an Indian Colonel pursued down a drain.
And he thinks that he still can, much better than most,
Produce blood curdling noises to bring on the Ghost.
And he once crossed the stage on a telegraph wire,
To rescue a child when a house was on fire.
And he says: ‘Now, these kittens, they do not get trained
As we did in the days when Victoria reigned.
They never get drilled in a regular troupe,
And they think they are smart, just to jump through a hoop.’
And he’ll say, as he scratches himself with his claws,
‘Well, the Theatre’s certainly not what it was.
These modern productions are all very well,
But there’s nothing to equal, from what I hear tell,
That moment of mystery
When I made history
As Firefrorefiddle, the Fiend of the Fell.’

Se então mais outro gim, de graça, ele derruba,
Vai contar que cantou de dentro de uma tuba.
Numa peça do Bardo, empolgou-se no treino
Porque Ricardo quis trocá-lo por seu reino.
Já fez papel de Tigre (inda tem esse plano...)
Que foge de bengala, entrando por um cano.
Dava um grito de dor que emocionava a Casa
Na cena de tirar as castanhas da brasa.
Certa vez, sobre o palco, agarrado ao pendente
Da luz, salvou do incêndio uma fãzinha ardente.
E prossegue: “Hoje o Palco, o que tem de bichanos!
O inverso dos galãs que fomos tantos anos.
E as gatinhas a achar que cena é erguer a saia,
A posarem de atriz, mas só levando... vaia.”
E acaba por dizer, usando a garra em pente:
“O Teatro não é mais o que era antigamente.
As novas produções são boas, são, vá lá!
Mas nada se compara, um dia se verá,
Ao momento de glória
Em que fazia história
No “Fanhofarofino, a Fera do Mafuá!”

Thomas Stearns Eliot

Tradução: Ivo Barroso

(^.^)(,,,)(,,,)~

segunda-feira, outubro 04, 2004

Enquanto o resto do gato não vem

Peço paciência às minhas milhares de fã (calma, Pris), mas tenho que retalhar bem o gato.

Então enquanto isso aqui vai um soneto bem a propósito pras minhas futuras viagens aéreas...


INSTRUÇÕES PARA MORRER BEM NO AVIÃO

Suba a bordo. A comissária sorridente
Ajudará a achar seu lugar marcado.
É muito provável que ali logo ao lado
Já haverá um outro figurante inocente.

Decole para a morte tranqüilamente.
Medite no destino dançando um fado:
Diante disso, assistir assim assustado
É sofrer demasiado o fim justo em frente.

Sofra, ao inverso, com bastante alegria,
Só com pesar pela leveza de um dia
Na vida de aves que só têm mais um mês.

Agradeça ao piloto que enfim decide o
Seu triste fim, sem suicídio ou homicídio,
E pra variar pode pousar dessa vez.


sexta-feira, outubro 01, 2004

Esse é o recheio: logo mais o restinho do gato Gogó

(...)

“Representei”, diz ele, “o que houve de melhor,
E uns setenta papéis pude guardar de cor.
Fiz de tudo: Romiau, Gato-de Botas... Célebre
Ficou sendo a expressão com que passei por lebre.
Sabia erguer o rabo, olhava de soslaio;
Não podia falhar, com uma hora de ensaio.
Minha voz comovia o coração mais duro,
Fizesse eu o galã ou um lacaio obscuro.
Fiz peças infantis – é claro, baboseira
Em que contracenei com a Gata Borralheira.
E lembro, numa peça americana, o afinco
Que quase me levava a me torrar no zinco.
Mas meu melhor papel, como a História dirá,
Foi “Fanhofarofino, a Fera do Mafuá!”


(...)

‘I have played’, so he says, ‘every possible part,
And I used to know seventy speeches by heart.
I’d extemporize back-chat, I knew how to gag,
And I knew how to let the cat out of the bag.
I knew how to act with my back and my tail;
With an hour of rehearsal, I never could fail.
I’d a voice that would soften the hardest of hearts,
Whether I took the lead, or in character parts.
I have sat by the bedside of poor Little Nell;
When the Curfew was rung, then I swung on the bell.
In the Pantomime season I never fell flat,
And I once understudied Dick Whittington’s Cat.
But my grandest creation, as history will tell,
Was Firefrorefiddle, the Fiend of the Fell.’

quarta-feira, setembro 29, 2004

vale quanto pesa reza lesa... de nós dois

Não lembro se já postei aqui esta quadrinha,

mas vá lá:

tenho andado envenenado de paixão,

então tudo está valendo...


Entre náufragos da desgraça
uma moça em meu olhar veleja:
tomo três goles de cachaça
e viro um copo de cerveja...


A seguir cenas de mais uma fatia do gato...

sexta-feira, setembro 24, 2004

Outro retalho de gato...

Gogó: O Gato Ator

Gogó é o Gato-Ator-de-Porta-de-Teatro.
Seu nome verdadeiro era um diabo a quatro
De se dizer: AS-PÁ-RA-GO. Então, de dó,
Passamos a chamá-lo apenas de Gogó.
De casaco surrado, ares de pobre boêmio,
Já teve uma trombose e a pata ainda lhe treme;
E o certo é que se foi, em moço, um songamongas,
Hoje não pega mais nem mesmo as camundongas.
Sombra do que ele (diz que) foi tempos atrás,
Quando – nome famoso – andava no cartaz.
Agora, se acompanha amigos para uns tragos
(Antes que alguém lhe fale em gotas e lumbagos)
Costuma lhes brindar – outro pagando a história –
Com seus casos do tempo em que viveu na Glória.
Pois época já houve em que foi Astro e atuou
No colo de Ziembinski e aos pés da Marineau.
Adora relatar o sucesso de certa Noite em que
Foi pre-miado (assim!) em cena aberta...
Mas seu papel genial, que lhe rendeu crachá,
Foi “Fanhofarofino, a Fera do Mafuá!”

(...)

quinta-feira, setembro 23, 2004

meu primeiro manual de instruções

instruções para esquartejar um gato:

1. pegue o gato no colo e cante:

Eu vou cortar em sete partes o meu gatinho
Depois separar cada parte em sete partes
E pegar as 49 partes devagarinho
E montar novamente o meu gatinho

2. massageie o gatinho com o pescoço pra cima
(ele, não você)

3. gema e ronrone alegro moderato

4. toque com o gato uma canção de gato, tipo

me alimentaram
me acariciaram
me aliciaram

o meu mundo era o apartamento
detefon almofada e prato
todo dia filé mignon
ou mesmo um bom
filé
de
gato.

5. reveja os filmes dos gremlins com seu gato

6. ponha meias no seu gato (mas nunca na frente de crianças:
crianças começam a por meias no gato ao verem adultos o fazendo)

7. neutralize sua cólica de riso e peça desculpas ao gato

8. chame o seu gato de chuvisco e saia fritando

9. lembre-se: ele tem nove vidas,
e você só pode erguer suas sobrancelhas e especular...

este blog não se responsabiliza por nenhuma conseqüência

agh

Gus: The Theatre Cat

Gus is the Cat at the Theatre Door.
His name, as I ought to have told you before,
Is really Asparagus. That´s such a fuss
To pronounce, that we usually call him just Gus.
His coat´s very shabby, he´s thin as a rake,
And he suffers, from palsy that makes his paw shake.
Yet he was, in his youth, quite the smartest of Cats –
But no longer a terror to mice and to rats.
For he isn´t the Cat that he was in his prime;
Though his name was quite famous, he says, in its time.
And whenever he joins friends at their club
(Which takes place at the back of the neighbouring pub)
With anecdotes drawn from his palmiest days.
For he once was a Star of the highest degree –
He has acted with Irving, he´s acted with Tree.
And he likes to relate his success on the Halls,
Where the Gallery once gave him seven cat-calls.
But his grandest creation, as he loves to tell,
Was Firefrorefiddle, the Fiend of the Fell.

(...)

domingo, setembro 19, 2004

AR ACNE FOBIA

Meus cabelos estão fugindo da cabeça.
E quem é ninguém pra censurá-los?:
é a atitude que se toma quando
o barco está afundando.

Minha garganta espectora
um plasma mais sólido,
mais escuro agora,
que sai na tosse como um bólido,
sem controle.

Sem noção.
São assim agora todas as minhas faculdades,
ações e atitudes:
gasto o dinheiro que não tenho
com estupefacientes e estúpidos entes.

Estou doente do pé:
unha e encravada
e fungo preto.

Sentimento pra mim é “sem ti”,
redução que tenta expressar o que senti
e sinto por estar longe de quem eu amo,
ou devo amar, ou acho que amo, ou...

Não sei.
É revoltante pra quem me conhece
ver essa carcaça ambulante,
que um dia já chegou perto de ser elegante,
galante, interessante
(isso ninguém deixa de ser, mas...),
e agora este doente:
QI de 140, mestre em literatura,
ganhando salário de lixeiro,
tropeçando a pé pela cidade,
só botando banca nesse baile de máscaras chamado internet.

Ontem foi o dia da última pessoa que faltava
me dizer umas verdades
sobre mim.

Depois de rechaçar e desapontar minha família,
negligenciar os amigos e o emprego
e ficar espalhando autopiedade,
agora o serviço está completo:
todo mundo vê a merda que eu estou fazendo
comigo mesmo,
mas pouca gente perde seu tempo me alertando:
e quando alguém o faz
(geralmente é minha mãe ou minha avó)
eu finjo que não é comigo
e me desculpo pensando que elas não sabem
toda a verdade.
Como se eu soubesse.
E agora ela também já “chaiben”.

Opa, ato falho, desculpem a nossa fale-a

(já dizia uma pessoa: falhei em tudo).

E no entanto hão pessoas
(é tão bonito errar assim,
agora estou achando tão bonito ser feio...)
e eu ia dizendo:
hão pessoas que ainda enganadas
me admiram graças
às minhas trapaças.
E ora vejam só que ditas coincidências:
duas delas aniversariam no mesmo dia
(próxima terça)
quando vou levar meu circo de horrores poético
a público, aqui no memorial dessa cidade cu-
riosa.
Isso sim é poesia a toda prosa.

E por falar em prosa, basta.

Eu ia falar também da agrura principal:
a coisa mais horrível que está acontecendo comigo
é superficial:
acne.
Mas não vou entrar nos detalhes mais sórdidos:
fica pra próxima postagem antinarcisista.

No próximo bloco:
poesia felina,
de novo e sempre.

quinta-feira, setembro 16, 2004

o eterno retorno do discípulo mestre

estivemos fora do ar
por motivos de ordem técnica

voltamos agora
com nossa programação normal

eu queria voltar contudo
(contudo, notaram? assim como
mas, no entanto, embora, entretanto, porém)

contudo o mundo vai rodando,
muitos e muitas à minha volta
vão escrevendo cada vez melhor
e mais, e mais, e

minha cabeça roda

eu volto
nessa poesia espontânea
e nem tão improvisada quanto eu queria


quanto eu queria
e quanto nada há que eu quero

então vou voltar às regras estabelecidas
e transformar isso aqui no bom e velho
querido diário virtual

lá vai


Querido diário virtual:

hoje já é quinta-feira, e agora eu te começo:
tenho que te contar que ontem fui a um show punk
com os replicantes, acid eaters e beijo AA força:
puxa, poguei tanto com os camarada e as minhas amiguinhas punk...

foi coisa de mosher mesmo: o pessoal até se cumprimentava
e quando um bebum caía muitas mãos o levantavam

fiquei triste e injuriado quando minha amiguinha mais querida
me derrubou do palco, lá pela altura do quarto mosh
sendo que o sexto e último foi o mais animal
animalesco

definitivamente
eu não cresço, meu caro e já velho diário.

Nunca mais cresço nessa vida,
enquanto isso faço e vivo poesia
só pra disfarçar:
se tem gente que gosta
então não é meramente uma bosta

mera mente bosta

ei, meu velho diário
não fique chateado, eu sei, era pra ser prosa
eu estou contudo não estou prosa
estou mais pra grosa
rosa
e goza

desculpe de novo, diário, se eu te maltrato
se não te escrevo bem é porque
não escrevo pra você
meu prezado diário
mas sim pra todo mundo
que pode me ler

Ah, voltando ao show punk:
eu caí seco de costas do palco pro chão
graças às mãozinhas e às garras
da minha amiguinha taninha
que estava bebinha
e se fez de desentendida
sorrindo

hoje ela nem se lembra mais
e eu também estava bem jonson

pra que remoer isso?

Eu te perdôo, amiguinha,
você tomou medidas disciplinares
adequadas:
eu precisava daquela queda

até o segurança agiu bem
deixando a turma subir e pular
à vontade...

a noite foi virando dia numa caminhada escura
de volta para a casa de recuperação

todas as recuperações que eu não fiz na escola
estou fazendo agora
e penso que ainda tenho alguns serviços militares nas costas
pra prestar

só que deve dar pra notar,
meu amado diário,
que o que eu gosto de escrever (você)
ninguém consegue me pagar
sai de graça

então entrego de graça
minha alma e sentidos
e espero não machucar muitos ouvidos

“muitos são os silêncios
poucos serão ouvidos”

aí sim: eduquei meu ouvido
no silêncio eterno dos versos
que nunca vou traduzir

ou não

***

esta era pra ser uma postagem prosaica
mas como de praxe fugiu do controle
transformando-se numa série de versos
além de qualquer freio

continuamos passando por
dificuldades
de ordem técnica

aguarde
enquanto consertamos nosso reator
você poderá fazer as seguintes conexões
adestramento de sensibilidade com
a professora mídia

*buzinada de alerta*

ah, sim
desculpem a nossa falha
voltaremos com nossa programação normal

dentro

de

instantes

segunda-feira, agosto 30, 2004

PRA NÃO SEPARAR MUITO AS PARTES DELA

CAROLINE SAYS - 1

(LouReed)

Caroline says that I'm just a toy
She wants a man, not just a boy
Oh, Caroline says, oh, Caroline says

CAROLINA DIZ - I

(dublado nos estúdios da PQP)

Carolina diz que me faz de gato e sapato
E que quer um homem e não um rato
Carolina diz isso, Carolina diz aquilo

Caroline says she can't help but be mean
Or cruel or so it seems
Oh, Caroline says, oh, Caroline says

Carolina diz que só consegue ser malvada
Ou é cruel ou não dá a mínima pra nada
Carolina diz assim, Carolina diz assado

She says she doesn't want a man who leans
But to me she's still my germanic queen
Yeah, she's my queen

Ela me diz que desculpa de folgado não cola
Mas pra mim ainda assim é uma rainha espanhola
A minha rainha, ora bolas

The things she does, the things she says
People shouldn't treat others this way
But at first I thought I could take it all
Just like poison in a vial
Hey, she was often very vile
But, of course, I thought I could take it all

As coisas que ela faz, as coisas que ela diz
Não pode ver ninguém ser feliz
No início achei possível viver em paz
Mas como um frasco de veneno
Ela sempre teve um efeito mortalmente lento

Caroline says that I'm not a man
So she'll go get it and catch as catch can
Oh, Caroline says, oh, Caroline says


Carolina diz que ainda não sou um homem feito
E que um dia ela ainda pega algum de jeito
Carolina diz isso, Carolina diz aquilo

Caroline says moments in time
Can't continue to be only mine
Oh, Caroline says, oh, Caroline says

Carolina diz que antes que se arrependa
Não vai me deixar ocupar toda a sua agenda
Carolina diz assim, Carolina diz assado

She treats me like a fool
But to me she's still a german queen
Oh, she's my queen

Ela me manda pedir esmolas
Mas pra mim ainda é a rainha espanhola

A minha rainha, ora bolas

sábado, agosto 28, 2004

100 aviso

eu devia me contentar em morrer em paz
eu não poderia comemorar cem anos
então comemorei uma semana de infinita
solidão

enfim
esse é um blog narciso
eu só sei olhar pra mim

mas existe mais gente
e principalmente
existe o abismo
e quando você olha
para o abismo
o abismo olha
pra você

bem-vindos ao circo de horrores
que ressurge,
glorificando sua própria doença:

carolina diz: parte dois

em breve
a primeira parte...

muhuhahahahahahahahahahahahaha.......

dedicado a uma garota chamada

CAROLINE SAYS - 2

Lou Reed

Caroline says
As she gets up from the floor
"Why is it that you beat me?
It isn't any fun"

Caroline says
As she makes up her eyes
"You ought to learn more about yourself
Think more than just I"

But she's not afraid to die
All of her friends call her Alaska
When she takes speed
They laugh and ask her
What is in her mind

Caroline says
As she gets up from the floor
"You can hit me all you want
But I don't love you anymore"

Caroline says
While biting her lip
"Life is meant to be more than this
And this is a bum trip"

But she's not afraid to die
All of her friends call her Alaska
When she takes speed
They laugh and ask her
What is in her mind

She put her fist through the window pane
It was such a funny feeling
It's so cold in Alaska...

CAROLINA DIZ - II

Carolina diz isso se levantando do tapete
– Sempre que você me bate desmonta seu topete

Carolina diz aquilo colocando um cilho postiço
– Você não pensa no seu id nem sabe nada disso

A morte não a deixa amedrontada
Suas amigas cruéis a chamam de Alaska
Enquanto ela se droga elas dão risada
Perguntando pra que ela não esqueça
O que é que se passa com sua cabeça

Carolina diz assim quando se levanta do tapete
– Me bata quando quiser mas eu te odeio pra sempre

Carolina diz assado mordendo os lábios febris
– A vida não é só o que você leu nos gibis

E a morte não a deixa amedrontada
Suas amigas cruéis a chamam de Alaska
Enquanto ela se droga elas dão risada
Perguntando pra que ela não esqueça
O que é que se passa com sua cabeça

Os punhos dela atravessaram uma vidraça
Foi uma sensação estranha à beça
Faz muito frio no Alaska...

versão brasileira por Ivan Justen Santana

terça-feira, agosto 17, 2004

posfácio

40 postagens, 8 visitas por dia (contando comigo)...
daqui a uma semana leminski faz 60 anos:
provavelmente estarei internado antes disso:
isso não é poesia: é sério (como se poesia também não fosse)...

saldo final: segundo Luís Melodia, ninguém morreu:
quarenta é um número suficiente: forty quer dizer "trocentos",
john lennon nasceu em 40, foi morto em 80 com 40 anos;
uma partida de xadrez dura em média 40 lances;
40 semanas pra um(a) infeliz ser gerado(a) numa barriga humana;
40 dias de dilúvio para a arca de noé;
40 dias jejuava o artista da fome do kafka:
e no fim o que botaram na jaula dele depois que morreu?
uma pantera...

legítimo filhote da palavradepantera.blogspot.com,
parei mordido.

talvez eu volte... um dia eu volto... foi bom surtar com vocês...

adeus

segunda-feira, agosto 16, 2004

Só mente para seus olhos

______________


O MAIS CURTO POEMA COM O TÍTULO MAIS LONGO JAMAIS ESCRITO, NO QUAL IVAN JUSTEN SANTANA ABRE OS BRAÇOS, ENCOLHE OS OMBROS E CAPITULA DIANTE DO JOGO DA EXISTÊNCIA, AO SE FLAGRAR SEPARADO E PRIVADO DE DOIS ENTES QUERIDOS (DUAS “ENTAS”, EM VERDADE), EM ÚLTIMA INSTÂNCIA GRAÇAS A SEUS (DE IVAN) PRÓPRIOS MÉRITOS COMO INCAPAZ E INAPETENTE PARA O CONVÍVIO COM O MUNDO E CONSIGO MESMO (CONSIGO MESMO: SERÁ QUE OUVI BEM?)

abandono

domingo, agosto 15, 2004

Uma letra lindinha para um domingo feioso

TEMPO

O tempo abre as asas sobre nós
Falando asneiras com sua estranha voz
Eu e você estamos no script dos minutos
O tempo se contorce como um puto
Cai e se esparrama pela sala
Nós somos sua trapaça
O tempo está nas agulhas e goles
Exigindo David Bowies
E outros ídolos da juventude
Não se engane, o tempo ilude

Ele mira sua cabeça
Regurgita a sua sujeira
É incestuoso e frívolo
E possui muitos outros títulos
Eu vejo a hora: nove e vinte e cinco
Penso "meu deus, ainda estou vivo"
Todos os sonhos foram embora
Nós devíamos existir agora

Você não é uma vítima
Você só está chateado e grita
Mas o tempo você nunca evita
Diabos, você parece um carro usado
Vai congelar e pegar um resfriado
Não tratou bem da sua saúde
Não se engane, o tempo ilude

Subir na vida é duro
Mas é pior ficar no escuro
Tive muitos sonhos
Colapsos medonhos
Mas você foi minha fada madrinha
Que o amor deixou desolada e sozinha
Talvez você esteja sorrindo por trás da dor
Mas tudo que eu posso lhe dar
É a culpa de ser um sonhador
Todos os sonhos foram embora
Nós devíamos existir agora


Versão Brasileira: Ivan Justen Santana

sábado, agosto 14, 2004

Depois do gato, o caos

Les Chats
Os Gatos

Charles Baudelaire

Les amoureux fervents et les savants austères
Os amantes ferventes e os sábios austeros
Aiment également, dans leur mûre saison,

Amam igualmente, em sua madura estação,
Les chats puissants et doux, orgueil de la maison,

Os gatos possantes e doces, orgulho da mansão,
Qui comme eux sont frileux et comme eux sédentaires.

Que como eles são friorentos e como eles sedentários.

Amis de la science et de la volupté,
Amigos da ciência e da voluptuosidade,
Ils cherchent le silence et l'horreur des ténèbres;

Eles procuram o silêncio e o horror das trevas;
L'Érèbe les eût pris pour ses coursiers funèbres,

O Érebo os tomaria por seus corcéis fúnebres,
S'ils pouvaient au servage incliner leur fierté

Se eles pudessem à servidão inclinar sua arrogância.

Ils prennent en songeant les nobles attitudes
Eles adotam quando sonham as nobres atitudes
Des grands sphinx allongés au fond des solitudes,
Das grandes esfinges alongadas no fundo das solitudes,
Qui semblent s'endormir dans un rêve sans fin;
Que parecem adormecer num sonho sem fim;

Leurs reins féconds sont pleins d'étincelles magiques,
Seu lombo fecundo é cheio de fagulhas mágicas,
Et des parcelles d'or, ainsi qu'un sable fin,
E parcelas d´ouro, assim como uma areia fina,
Etoilent vaguement leurs prunelles mystiques.
Estrelam vagamente suas pupilas místicas.

Dicionário interlinear: Ivan Justen Santana


SEXTA-FEIRA, 13 DE AGOSTO 4EVER!

GATO PRETO

Rainer Maria Rilke


Um fantasma no mínimo é um lugar
Que bate na visão com o som dum toque;
Mas aqui nessa profundidade “noire”
Mesmo o mais forte olhar se dissolve.

Quando surtada, em total loucura,
A criatura se debate no escuro delírio
Súbito acha conforto na cela dura,
Pára, e, como a rima, se evapora.

As visões que jamais a tocaram,
Parece tê-las internalizado, ocultas,
Pra poder serena supervisioná-las
E dormir com as ditas cujas.

Mas presto desperta por instinto
E volta a face direto pra sua:
E você vê sua própria visão, inesperada,
No âmbar amarelo das duas
Pedras curvas dos olhos: guardada
Como um inseto extinto.

Versão Brasileira: Ivan Justen Santana

quinta-feira, agosto 12, 2004

um legítimo cachorro louco

o mês de agosto aí escancarado e ainda nem falei de leminski

quem dera minha poesia toda pudesse ser um mero ato falho

que lambesse os pés da poesia do polacolocopaca:

mas não: ela quer ser mais e menos que isso... agüentem.

contagem regressiva para o aniversário do bandido: faltam 12,

quase 11 dias. olha só a clonagem/ paródia/ plágio/ chupação:


um poema
que não se entende
é digno de nota

dignidade suprema
de um navio
perdendo a rota

p.leminski

____

um poema
que se entende
é como um cágado

mas um poeta embriagado
de poesia, virtude e vinho
é mais lua que solzinho

i.j.santana

terça-feira, agosto 10, 2004

Atendendo ao pedido

...

BARATA TONTA

A criança
está contente
esperando
pela janta
enquanto canta
no jardim.

Coleciona
sete patas
de baratas
semi-mortas
quando canta
no jardim.

Bem na hora
em que ela janta
vem contente
meio tonta
e mostra as patas
para mim.

segunda-feira, agosto 09, 2004

O que sobrou do pai que eu sou

(escrito há meses com grande saudade:
revisado agora com saudade ainda maior...)


LIRISMO PATERNAL

Um perfume dessas flores
que se colam no meu rosto,
feito pétalas de amores,
feito pôr-do-sol não posto;

passado ao ver o verão,
trinado de primavera;
tom de outono em floração,
fim do inverno à luz primeira;

poema que brusco busco,
verso que me escapa ao plectro;
reflexo no lusco-fusco,
cores que fogem do espectro;

paisagens ainda não vistas:
sons que se gravam no olhar;
passagens ainda imprevistas:
primeira impressão do mar;

penugens de passarinhos,
sensação que se mantinha,
maravilha em meus caminhos:
é a minha filha Rubinha.

sábado, agosto 07, 2004

Saturday morning: still stoned...

Saturday morning: still stoned
With several hours of live music,
I wrote an awkward piece of "witty" criticism
About the whole show: no, and…–
In fact, I wrote (again) about me: sick
Minded public relations of his m
ental illness.

dessa vez me senti o próprio cummings...

sexta-feira, agosto 06, 2004

Além do bem e do mal tem também o mal e o bem

...

O UNIVERSO SEGUNDO DANTE ALIGHIERI, EUCLIDES DA CUNHA E EU

Nesta Terra Inferno
Todo Homem Purgatório
Luta Paraíso

quinta-feira, agosto 05, 2004

Por Alighieris nunca Dantes lidos...

POR MIM SE VAI À CIDADE DOÍDA,
POR MIM SE VAI ATÉ A DOR INFINITA,
POR MIM SE VAI A UMA GENTE PERDIDA.

MEU CRIADOR ME FEZ PELA JUSTIÇA:
FUI FEITO POR DIVINO POTENTADO,
POR PRIMO AMOR E MOR SABEDORIA.

ANTES DE MIM NÃO FOI NADA CRIADO
QUE NÃO SEJA INFINITO, E SOU ETERNO.
LARGUE TODA A ESPERANÇA, CONVIDADO.

[assim é (pra mim) o portão do INFERNO]

terça-feira, agosto 03, 2004

PROSA PROSODICAMENTE PROSAPIESCA e FARSESCA

Ao meu amigo Tony Monti, que não lê este blog, então esqueçam que eu o mencionei.

Já que está patente que a poesia só é sempre boa e sempre pouca para as sempre poucas e sempre boas, investirei numa prosa bem factóide: aproveitem, hein, raramente eu deixo de mandar no texto assim e solto o discurso guardado em mim. Mas chega de poesia, rima e ritmo. Já estou Saramago disso. E não tentem fazer isso em casa:

– Hoje de manhã, eu, fulano de tal, estava vestindo minha jaqueta, pensando se estava assim tão frio, quando notei uma aranha subindo por trás da jaqueta, quase no meu pescoço: marrom (a aranha, não o pescoço): eu mesmo não ouvi o grunhido quando ato reflexo tirei a jaqueta e joguei-a no chão. Ergui a jaqueta, a aranha caiu no chão, vacilou e (soc!) matei-a. É verdade, eu juro: perguntem pra minha vizinha: ela é testemunha, já estava quase chamando ambulância a menina...

É, as coisas mais difíceis acontecem, e merecem atenção, assim como as aranhas tecem, assim como a poesia não larga do meu pé. Na realidade, ela fica pulando do direito pro esquerdo, e eu nunca consigo pegar.

segunda-feira, agosto 02, 2004

Mais um poema de segunda


TUDO QUE NÃO SEI DIZER AQUI FICA MAL DITO

(para a gata novamente, desastrado como sempre)

O sol violeta dos teus olhos
violentou meu pensamento:
quanto mais te quero e mostro
mais gasto o teu sentimento.

Se as batatinhas já se esparramaram
quando nasceu o teu primeiro não,
nem as duas caveiras que se amaram
corrigiriam versos pro meu coração.

Então na próxima quadrinha que termina
este exercício autoflagelatório,
vou resumir sozinho aquela "velha e triste sina"
do nosso caso tão perfunctório:

um confuso viu uma confusa,
surtou uma, surtou duas, surtou três:
aí que a porca se desparafusa:
suas duplas loucuras já ganharam a vez.

sábado, julho 31, 2004

Aos poucos gostos duvidosos que seguem me lendo

COPROFILIA ENIGMÁTICA

Sempre que me oriento pra dar a descarga
ideogramas me seduzem lá no fundo:
a diarréia que não tive quase desce,
mas o trôço confuso e convoluto
não me esquece, não me larga sem luto.

Luto por admitir a perfeição metafísica
que há naquelas fezes enroladas
e o rolo semi-vazio ao lado da privada
me instiga a lavar mãos de Pilatos,
pois me ponho irresponsável por meus atos.

Quinze vezes, quinze versos, quinze
bundas redondamente redondinhas
diminuiriam a sensação de desperdício,
o vício de roubar quarenta latrinas
e decifrar mil e uma bostas cristalinas.

quarta-feira, julho 28, 2004

O menor poema da minha existência

Hesitei entre esta postagem e outra mais carne crua,
que vai ficar pra próxima,
só para efeito de suspense...

Enquanto isso, em Gotham City, aqui está a miniatura:

CONCISÃO
 
eu com cisão

domingo, julho 25, 2004

A uma gata, com amor

Assim bem ridícula mesmo
minha homenagem
para a linda Taninha
que nem vai dar por isso...

Como sou péssimo poeta
copiei uns versos de canção
para você, meu bem:

 
BOLERO

Sinto o mais distante porque o mais distante é o melhor p´ra mim
Vejo belas nuvens tão belas nuvens me carregam enfim
A vez que penso é a vez que choro
Por alguém bem mais distante
Que não vejo entre meus lençóis
Estive quase quase por lembrar
De um passado quando eu te via
Entre minhas mãos estávamos tão sós
P´ra ser feliz melhor deitar e desaparecer
Dessa cidade-fantasma em que o mais difícil sempre é te esquecer
Viver é só uma questão de dias
Entre seus lábios e milhões de vícios
Sobre a cabeça um sonho tão lindo
Sobre as bandeiras de tantos países
Meu caminho algo mesmo assim
Quando sonho tremo só por acordar
Sou feliz se esqueço a grande alegria de estar com você
Sou alguém que foge antes que o mundo possa me entender
Estou entre o cowboy e o que perdia
Estou feliz por quem já não existe
Não sei não não estou aqui
Não sei não algo estava na minha cabeça


(reeditando a postagem
tento remendar essa "traquinagem"
informando que essa letra de canção
é dos meus idolatrados Picassos Falsos,
mais precisamente de Humberto Effe.
Ufa, os federais já estavam quase na minha cola.)

sábado, julho 24, 2004

grinfando a onda

*
Tigre (grinfado* de William Blake)
 

tigre! tigre! bêbado biltre
nos botecos de mau alvitre:
que imortal garrafa vai
revelar-te a arte de ser pai?

em quais longínquos cafundós
cantaste as tuas notas a sós?
com que asas tua alma ascendeu
do fogo que lambeu jezebel?

e qual belzebu e qual urubu
transtornaram-te em Sampa um sampaku?
e quando teu sul trilou em ré
quem desculpou? quem foi? quem é?

que neurônio? ou qual martelo?
martelaram teu cérebro belo?
qual é o joio? e quanto trigo
gasta este grotesco triste amigo?

quando o mar cansou das ondas
e veio molhar as muitas bundas
alguma sorriu de me ver aqui?
posso? ou a tigresa é só pra ti?

tigre! tigre! bêbado biltre
nas bodegas de mau alvitre:
que imortal dosagem vai
revelar-te a arte de ser pai?


 
* grinfo: trapaça, golpe, embuste (assim como essa palavra e definição).

quarta-feira, julho 21, 2004

Cutucando de longe como sempre

 
BRINCANDO PERTO DA JAULA
 
O silêncio da pantera é denso,
é feito o silêncio do suspense,
o efeito dos filmes de tensão:
feito Sob o Domínio do Medo,
de Sam Peckinpah.
 
O silêncio da pantera é suave,
sim, quem há de negar a verdade:
desejamos ver a pantera,
tocar sua negra beleza,
quem sabe mesmo levá-la pra casa. 

O silêncio da pantera seduz,
até que se rompe
num rosnado selvagem:
o pavor toma conta
e só nos resta desejar paz.

O silêncio da pantera é a paz.

 

terça-feira, julho 20, 2004

Mais um soneto fingindo que não é soneto

Muito bem,
como o poema sobre o Marcos teve repercussão,
postarei alguns frutos
dessa velha parceria (12 anos)
até os dias de hoje pouco conhecida:

Instruções para morrer bem no elevador

Quando abrir a porta tenha certeza
de que o elevador está ali mesmo.
Será precipitado um passo a esmo
e morrer bem requer mais sutileza.
 
Entre sabendo o plano de cabeça.
Chame qualquer andar além do décimo.
O cabo de aço deve estar em péssimo
estado, rangendo bem. Não esqueça
 
que você é feito de água, em carne e osso.
Em queda livre, ainda que sua massa erre o
peso máximo, cai igual a um trôço.
 
Não tenha medo de que o impacto ferre-o:
não há nenhum andar além do poço:
com a mola você volta alegre ao térreo.

 
Ivan Justen Santana
 
(com o auxílio, a aprovação, a parceria
e o vá-te-catar de Marcos Prado de Oliveira)

Triste a escutar pancada por pancada

Frio e chuva massacram o corpo por fora.
 
Angústia do irreversível e solitude
completam o serviço por dentro.
 
Eu queria falar de diálogo,
mas parece que só os mudos me ouvem.
 
Então (de novo) mais um poema
explícito, simples, falso como tudo mais.
 
Bom apetite:
 
A ARTE DA PERDA
 
(sugado de Elizabeth Bishop)

Perdi até o que eu já nem tinha: 
uma menininha que brinca sozinha. 

Perdi coisas que já nem são:
coisas que nem vem nem vão. 

No vão das perdas, o que se acha
é uma caixa dentro de outra caixa
dentro de outra caixa. 

Perco sempre, até de mim, sempre
perco como quem perde eternamente. 

A derrota na vida, minha querida,
sobra até para quem deixa a bebida,

o cigarro, o amor, a raiva e a culpa:
será que perder tem alguma desculpa? 

Eu já nem sei quanto mais perderei
nem se bem sei o que esqueci de rimar: 

perdido, tropeçando no tombadilho
do navio de loucos onde me soltaram,
tocando o céu e bebendo o mar,
só sei que nunca deixarei de amar.

domingo, julho 18, 2004

O ESCRITOR E O ESCREVINHADOR

 
No limbo claro-escuro da poesia
topo com o poeta Marcos Prado
que me estende a mão já fria
cujo aperto evito, desavisado.
 
– Você, pelo jeito, ainda com a mania
de botar em verso tudo que é besteira!
– Mas se foi você quem me pôs nessa fria
meu caro Marcos Prado de Oliveira!
 
– Naquele tempo a gente traduzia
feito riscar de novo pinturas rupestres.
– Mas decassílabos também produzia
nossa dupla de dois pretensos mestres.
 
A troca de farpas prosseguiria
não fosse a tosse santa e o sacro escarro:
sinais de fim de papo e mais poesia –
voltei à poeira e ele, ao barro.

sábado, julho 17, 2004

um, dois, três: surto!

surto site meter:
quem foi se meter no seu site?
 
daybyday&nightbynight..........
 
e ontem?:
 
ninguém.
 
então surtei.

Blogo você de coração

Quase postei sobre o batismo
do meu violão (surtado tem disso:
chama-se arco & flecha) ,
pensei até em voltar a tocar
mas melhor não:
resolvi por fim postar
para a minha cunhã Léia:
 
Leinha, você não está online,
então eu vou fazer um poema
em sua homenagem: vai se chamar
Homenagem do Ivan para a Léia
(Claudinéia Augusto(a)? Leite):
 
*pega o violão, toca e canta
debaixo da janela de Léia,
acordando a vizinhança*
 
Enquanto Léia me lia
havia algo de magia,
mas não diria uma palavra:
ela teria muitas reticências
pro meu pobre abracadabra.